Força da Tática: O Sevilha FC de Julen Lopetegui

    Depois de passagens pelo FC Porto, Real Madrid CF e até pela própria Seleção de Espanha, que não espelharam a qualidade do treinador espanhol, eis que no Sevilha FC, Lopetegui apresenta, finalmente, a melhor versão de toda a sua carreira. Com um modelo de jogo com características diferentes daquilo que tinha sido visto em Portugal, o Sevilha é uma equipa mais objetiva, que assume menos riscos e tem uma preparação e reação à perda mais eficazes do que aquilo que nos lembramos do técnico espanhol.

    Atualmente, no terceiro lugar da competitiva Liga Espanhola, apenas atrás dos colossos europeus, Real Madrid CF e FC Barcelona, e depois de um início de campeonato difícil, a equipa sevilhana embalou e apresenta agora aspetos no seu jogar interessantes e individualidades de qualidade que fazem prever um futuro risonho a curto médio prazo.

    O Sevilha atua num 1-4-3-3, que altera de acordo com o momento do jogo e dinâmicas do adversário. Este sistema permite uma variabilidade e adaptabilidade dos jogadores ao longo da partida. Isto proporciona ao Sevilha ser uma equipa com uma imprevisibilidade, tal que dificulta, e muito, a vida ao adversário. Por exemplo, em organização defensiva, poderão assumir um 1-4-4-2 em bloco alto ou um 1-4-1-4-1 em bloco médio baixo. Já em organização ofensiva têm uma multiplicidade de opções, desde um 1-3-4-3 na primeira fase de construção até a um 1-2-1-4-3 em zonas de criação ou até de finalização.

    Apesar de ser uma equipa com um futebol ofensivo e que pretende controlar o jogo, esse controlo já não se exprime obrigatoriamente em posse de bola. Aliás, a equipa, por vezes, sente dificuldades no ataque posicional em zonas adiantadas. A abordagem mais natural deste Sevilha reflete-se na objetividade e na criação de condições para que consiga alcançar essa objetividade no seu jogo.

    Como foi referido, o Sevilha é uma equipa de menor risco e de um jogo mais direto do que estávamos habituados a ver com Lopetegui. Apesar disso, na primeira fase de construção, a equipa tem um comportamento paciente, tentando atrair o adversário para depois conseguir ganhar espaço nas suas costas. Dependendo da pressão do adversário, o Sevilha pode colocar os dois centrais isolados a construir com os três médios atrás da primeira linha de pressão adversária e os laterais abertos nos corredores, ou colocar os dois centrais e o médio defensivo a descer entre os mesmos ou, então, um dos médios a descer no espaço entre o central e lateral e a permitir que este último progrida pelo corredor.

    Em fase de construção ofensiva, o Sevilha começa logo a tentar ganhar superioridade numérica em determinadas zonas do campo (nomeadamente junto às faixas laterais). É aqui que se começa a desenhar todo o jogo ofensivo dos comandados de Lopetegui. Quando o adversário realiza uma pressão intensa, o Sevilha tenta atraí-lo o mais possível e depois, ao ver que não consegue sair curto, tenta com passe longo combinar ou com a referência no jogo aéreo, o seu ponta de lança De Jong, ou então, apostar na velocidade dos extremos abertos nos corredores e prontos para realizar diagonais em profundidade.

    Diego Carlos, central brasileiro disputado por equipas de top mundial, pela sua grande capacidade de passe a longas distâncias, destaca-se de todos os outros.

    O meio-campo apresenta, salvo raras exceções, um padrão fixo com um sistema de 1+2 bastante claro. O homem mais atrasado é Fernando Reges (nome bem conhecido dos portugueses), à sua frente estão dois homens (normalmente, dois dos três nomes seguintes: Joan Jórdan, Banega ou Óliver Torres). Estes dois médios interiores têm um raio de ação e rotatividade posicional grande. Podem realizar trocas posicionais entre eles mesmos, com o médio defensivo e com os avançados (nomeadamente, dois extremos).

    Além disso, pelas trocas posicionais com avançados, desenvolvem várias vezes movimentações de penetração da linha defensiva. Ao contrário do que se poderia perspetivar, os médios interiores estão na maioria das vezes próximos. Se um está de um lado, o outro também vai para esse lado para tentar criar superioridade numérica e libertar os extremos e laterais para desequilibrar no espaço. Banega continua a ser o principal destaque em zonas de criação pela qualidade na definição de cada ação.

    Também Óliver Torres, hoje com um perfil mais rotativo e intenso, tem sido um dos grandes maestros do meio-campo da equipa. Jórdan é um médio mais vertical, menos rigoroso na definição, mas com um ataque ao espaço de qualidade e com uma capacidade e comprometimento defensivo maior do que os nomes anteriores.

    O menor risco de jogo referido acima está em parte relacionado com a aposta no ataque pelos flancos. Seja numa primeira fase em que a equipa consiga ganhar superioridade numérica num flanco e consiga progredir, seja numa segunda fase em que o adversário é atraído de um lado e se explore o lado contrário, o Sevilha consegue atacar pelos flancos com habitual eficácia.

    Com os laterais constantemente projetados a oferecer largura, com os extremos dentro ou fora e com os médios interiores, o Sevilha forma microestruturas que lhe permitem ganhar superioridade numérica e atacar de forma rápida. Os extremos, com principal destaque para Ocampos, têm um papel fundamental na dinâmica ofensiva da equipa, não só pela capacidade de desequilíbrio em espaços curtos, mas também, e principalmente, pelo ataque fortíssimo à profundidade.

    Numa primeira fase de construção, os extremos são responsáveis por oferecer largura e profundidade à equipa. Quando a equipa consegue subir, estes passam para espaços interiores, oferecendo espaço aos laterais nos corredores.

    Pelas características dos laterais, habitualmente Navas e Reguilón (ambos fortes tecnicamente, com uma propensão ofensiva natural, com um bom cruzamento e boa capacidade de um contra um), pelo desenvolvimento das tais estruturas ofensivas e também pela capacidade de desequilíbrio dos extremos, o Sevilha consegue ter uma fluidez natural e atacar de forma bastante direta através de cruzamentos para a área ou de diagonais no espaço interior ou profundo com ou sem bola dos extremos.

    A rotatividade posicional com médios interiores e avançados a trocarem constantemente de posições, a criação de indefinição com lateral a dar largura e extremo por dentro, a procura constante da profundidade pelos extremos, a penetração dos médios interiores na linha defensiva adversária para receber nas suas costas, o apoio para combinação do avançado centro, o passe longo para o flanco oposto a explorar profundidade e largura de lateral ou extremo…, são algumas dinâmicas em zonas de criação que o Sevilha utiliza para desequilibrar o adversário.

    Em zonas de finalização, o Sevilha coloca três a quatro homens prontos para colocar a bola no fundo das redes. O ponta de lança, o extremo do lado contrário, um dos médios à entrada da área e até mesmo o lateral do lado contrário aparecem por várias vezes na área. De Jong e Ocampos destacam-se dos restantes com seis e 11 golos, respetivamente, marcados na liga espanhola até ao momento.

    Quando o Sevilha perde a bola, tem uma reação imediata com o intuito principal de recuperar a posse e, quando não tem oportunidade de o fazer, tenta retardar o contra-ataque do adversário e reorganizar-se defensivamente. Em ataque posicional, habitualmente colocam os dois centrais, o médio defensivo e os dois médios interiores prontos para reagir à perda. Pela compactação ofensiva da equipa, de imediato conseguem exercer uma pressão intensa de forma conjunta, com os jogadores mais perto da bola a pressionarem o portador da bola e os restantes a marcarem individualmente possíveis linhas de passe.

    Visto que colocam os laterais quase sempre bastante projetados, médios e extremos têm um papel fundamental na pressão para retardar o contra-ataque e a exploração do espaço livre por parte do adversário. Os médios, por estarem sempre muito próximos, conseguem pressionar e, por várias vezes, forçar o erro à equipa adversária.

    Além disso, é uma equipa que consegue perceber indicadores de pressão de forma inteligente, desde passes atrasados, bolas longas ou jogador a receber de costas. Reagem à perda de tal forma intensa, que chegam a desposicionar, em alguns momentos, os seus centrais, que poderão, por exemplo, sair na marcação individual a um dos avançados.

    Aos 32 anos, Fernando Reges, senhor de uma cultura tática elevada, é uma peça fulcral neste momento do jogo pela simples razão de decidir quase sempre bem. Um verdadeiro ponto de equilíbrio dos comandados de Lopetegui! Também os dois centrais Koundé e Diego Carlos pela velocidade, controlo do espaço e eficácia nos duelos assumem papel de destaque.

    Podem ver no vídeo seguinte todas estas dinâmicas do Sevilha em momentos de organização ofensiva e transição defensiva:

    Artigo revisto por Inês Vieira Brandão
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    Diogo Coelho
    Diogo Coelhohttp://www.bolanarede.pt
    Natural de Rio Maior. Adepto do bom futebol desde que se lembra. Gosta de dedicar o seu tempo à análise de jogo e dos seus intervenientes. Admirador do estilo de jogo de Guardiola e partilha da ideia que no futebol destacam-se aqueles que mostram mais inteligência.                                                                                                                                                 O Diogo escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.