
O Benfica apresentou-se aos sócios e adeptos na Eusébio Cup. A homenagem ao maior jogador da história das águias foi também a primeira demonstração para o público de uma equipa renovada em nomes, não tanto em ideias.
A base apresentada por Bruno Lage em campo não está muito distante daquela que marcou a tendência da última temporada. Mudaram, essencialmente, os perfis e, como consequência, várias dimensões do jogo do Benfica.
A saída de Álvaro Carreras deu espaço a Samuel Dahl, um lateral mais profundo, para jogar pela esquerda. À direita, Amar Dedic fez a estreia com a camisola das águias e foi uma mais-valia para o Benfica. Não tem um perfil tão atlético e físico como Alexander Bah, mas marca a diferença pela forma como conduz a bola, como varia as incursões (por dentro e por fora) e pela capacidade técnica que alia a esta dimensão. Volta a oferecer maior variabilidade à equipa de Bruno Lage.
No meio-campo, houve revolução total. A gestão de Florentino Luís, a contas com uma mialgia, permitiu a Enzo Barrenechea assumir a titularidade. Não foi, porventura, o contexto mais certo para avaliar o que pode, de facto, o argentino oferecer ao Benfica, mas já demonstrou a capacidade que tem no passe longo e na distribuição. Colocou-se frequentemente entre os centrais para organizar a saída de bola e ditar ritmos, algo tão simples – aparentemente – e tão perdido nos perfis mais brutos ou aceleradores dos médios encarnados na última época.

Mais vistosa foi também a estreia de Richard Ríos, principalmente na primeira parte onde pôde jogar como segundo médio. É um jogador total e muito dinâmico. Na comparação direta com o seu antecessor, Orkun Kokçu, perde no passe, mas ganha na forma como se oferece ao jogo em todas as suas dimensões. Lateraliza posições para ver o jogo de frente, avança para as costas dos médios adversários, projeta-se por dentro ou por fora, chega à frente para rematar, vence duelos no corpo, tem técnica para ultrapassar situações delicadas em espaços curtos e a agressividade no seu jogo contagia as bancadas. Algo pode correr mal, mas Richard Ríos vem para encher o meio-campo.
As maiores indefinições surgem nas alas. Kerem Akturkoglu tem um perfil único no plantel como acelerador a partir do corredor esquerdo. Marcou um golo através de uma rutura no espaço na qual procurou, como sempre, a baliza. Esta unicidade no plantel vale pontos, mas a precisão técnica levanta dúvidas quanto a um encaixe a longo prazo. Como foi evidente em 2024/25, se o turco não oferecer o produto final, pouco oferecerá ao Benfica.

À direita, Fredrik Aursnes só pode passar por solução de recurso ou plano estratégico em duelos mais fechados. No contexto do campeonato português, com o Benfica protagonista da maioria dos jogos, há pouco espaço para um médio de equilíbrio a fechar à direita e a jogar entrelinhas. A saída de Ángel Di María abriu um espaço que resta por preencher e que o mercado ainda não solucionou.
Paralelamente, há uma terceira vaga no meio-campo em aberto e que pode ser do norueguês. O volte-face na situação de João Félix, a caminho do Al Nassr depois de estar próximo do Benfica, abre novas possibilidades a Bruno Lage que pode reforçar o miolo para acrescentar desequilíbrio individual por fora. Na Eusébio Cup foi João Veloso a aposta surpreendente de Bruno Lage.
O jovem médio tem um perfil técnico interessante, mas destacou-se pelas mais-valias sem bola. Permitiu ao Benfica pressionar alto e recuperar várias bolas no meio-campo adversário. Foi inteligente nos saltos de pressão, leu os timings do jogo e mostrou que não é preciso ter dois metros, anos de ginásio e um físico de laboratório para ser inteligente.
Na segunda parte foi Gianluca Prestianni, cada vez mais um 10 e menos um extremo, quem se mostrou neste lugar, numa maior aproximação ao “se” que traria João Félix para o Benfica. Há mais qualidade individual para Bruno Lage explorar e, acima de tudo, a sensação de que é possível trocar jogadores, mudar funções e manter o nível exibicional.

Vangelis Pavlidis foi, como habitual, um destaque silencioso no jogo. O trabalho no primeiro golo, pelo adorno ao lance, pela capacidade de esconder a ação e pela clareza e qualidade no passe é uma obra de arte ao alcance de poucos. Não terá tantas exigências como criador, o que lhe poderá permitir ser mais influente no ataque às zonas de finalização e no trabalho dentro de área.
Enquanto Franjo Ivanovic, um avançado mais potente, com chegada à área e capacidade para romper no espaço, não chega, mostrou-se Henrique Araújo. Não passará de uma terceira opção no plantel, mas mostrou alguns traços que já havia exibido no seu arranque na equipa principal. Há um certo contrassenso na maneira como o madeirense se apresenta. É quando aparenta ter menos tempo e espaço para se mostrar que o faz em melhor nível, contrariando a regra que diz – e bem – que é complicado exigir muito dos jogadores quando a estes só são dados minutos dispersos. Tem um sentido de baliza muito forte e é essa, quiçá, a característica que lhe pode permitir ter impacto na temporada.

Há ainda muita estrada a andar e o contexto de pré-época relativiza qualquer conclusão definitiva e precipitada. Coletivamente o Benfica não mudou muito, mas individualmente conseguiu ser mais dinâmico com bola e pressionar mais alto sem bola. A pressão encostou o Fenerbahçe durante toda a primeira parte à sua baliza e pode ser uma das armas encarnadas. O problema esteve nos lances em que esta foi superada e uma clareira de espaço vazio se abriu. A passividade no primeiro golo turco também deixa espaço a reflexão. Ainda assim, o primeiro desenho do Benfica deixa espaço para entusiasmo que Bruno Lage quer garantir que ainda resiste daqui a menos de uma semana.