O suicídio tático português | Espanha 5-0 Portugal

Seria injusto e irrealista até, pedir-se que Portugal vencesse, ou sequer disputasse o resultado, frente a uma Espanha que, se não é a melhor seleção do mundo, anda lá muito perto. No entanto, a exigência já é superior face à que existia há alguns anos atrás, devido ao crescimento do futebol feminino português.

Ainda assim, a estratégia protagonizada por Francisco Neto foi absolutamente kamikaze, tendo criado um enorme desconforto no momento defensivo, ou seja, durante grande parte do jogo, tendo a seleção vizinha terminado a partida com uma percentagem de posse de bola a rondar os 80% e um 5-0 no marcador.

Francisco Neto
Fonte: Luís Batista Ferreira / Bola na Rede

Antes de passar à explicação prática, vale a pena apresentar os onzes de ambas as equipas, que tiveram as suas principais estrelas, Aitana Bonmatí de um lado e Kika Nazareth do outro, no banco de suplentes, a recuperar de problemas físicos.

Montse Tomé montou um 4-3-3 moderno, com ambas as laterais, Olga Carmona e Ona Batlle, colocadas nos halfpsaces, enquanto que as extremas Mariona e Clàudia Pina, partiriam da largura, à procura movimentos de fora para dentro. No meio-campo, Patri Guijarro ficou colocada num pivô a solo, permitindo a Vicky e Putellas terem liberdade ofensiva, protagonizando desdobramentos.

Do lado português, a ideia, embora criativa, não trouxe grandes frutos. Francisco Neto montou um 5-3-1-1, com Diana Silva como vértice mais ofensivo do losango do meio-campo, nas costas de Jéssica Silva.

O esquema de pressão em 5-3-1-1/5-3-2 por si só, já é limitado. No entanto, aplicando-o frente a um adversário altamente superior, que apresenta qualidade técnica em todos os setores e que usufrui dos halfspaces para fazer subir as laterais, torna tudo ainda mais ilógico. Como é visível na fotografia abaixo, a primeira linha adversária não era alvo de pressão e a missão de Diana Silva – foi quase sempre assim ao longo da partida – era vigiar e impedir que a Patri Guijarro recebesse bola. No entanto, o problema estava nas missões de Andreia Norton e Andreia Jacinto que, para além de terem que vigiar Vicky e Putellas – sempre muito dinâmicas nos movimentos entrelinhas -, ainda tinham que cair na pressão sobre as laterais, já que a última linha de defesa de Portugal era realizada sempre com cinco elementos.

Portugal x Espanha Feminino
Fonte: UEFA

Se a estratégia de Portugal passava por conseguir entrar na partida com solidez defensiva e estancar os ataques espanhóis, rapidez esse pensamento se esvaiu, com a Espanha a marcar ao segundo minuto. Olga Carmona, a lateral esquerda, com uma qualidade ofensiva ímpar, sobe pelo espaço vazio no centro-esquerda, vê o movimento de Esther González – sempre muito sagaz nas ruturas – e serve-a com um belíssimo passe. Neste golo, há que destacar negativamente ainda a abordagem mole e confusa de Fátima Pinto, que faz uma primeira parte de baixo nível.

Embora se tenha denotado, desde início, alguma falta de atitude competitiva e motivação, também propiciada pelo histórico recente da Liga das Nações, onde perdeu frente ao mesmo adversário, os golos sofridos cedo também ajudaram a cessar os sorrisos.

Cinco minutos se passariam até que a La Roja voltasse a faturar, desta vez por Vicky, a mais jovem, que foi uma das melhores em campo e até tinha treinado condicionada antes da partida, mostrando alto dinamismo, constantes vaivéns e uma abrangência de movimentos enorme, tendo marcado num movimento de rutura entre centrais, em resposta a cruzamento de Mariona.

O plano de Francisco Neto passou por manter um bloco notoriamente baixo e apostar no contra-ataque e no ataque ao espaço, como é, desde logo, comum. No entanto, a linha de cinco defensoras mostrou imensos buracos, seja entre central e lateral, entre a central do meio e cental externa, como se viu em diversas jogadas, também devido ao posicionamento sempre na largura máxima de Clàudia Pina e Mariona, embora esta última pisasse mais vezes o corredor central.

Após isso, durante 34 minutos, Portugal conseguiu manter a sua baliza sem sofrer mais golos, embora os problemas e o domínio espanhol continuasse bem presente, com Mariona imensamente móvel e com a ligação no flanco entre Olga Carmona e Clàudia Pina a crescer, com a primeira a avançar e servir passes de rutura para a segunda se movimentar de fora para dentro, nas costas de Beatriz Fonseca, extrema de origem, que jogou como ala direita.

Mais uma vez, bastou um passe longo para destruir toda a “organização defensiva” de Portugal. Mariona a baixar na meia direita e a servir um movimento de rutura de Alexia Putellas, que nem teve uma primeira parte de grande influência, mas que demonstrou, neste lance, porque é que tem duas Bolas de Ouro (2021 e 2022) no currículo.

Poucas foram as vezes em que Portugal teve oportunidade para sair a jogar um futebol curto, mas, numa delas, ofereceu um golo ao oponente. Tatiana Pinto com um passe horizontal pouco tenso, ofereceu o contra-ataque às espanholas e a inevitável Vicky queimou metros em condução para iniciá-lo. Não há dúvidas que há alguma sorte à mistura no cruzamento-remate de Clàudia Pina, mas a premissa de Portugal, após perda de bola, é quase sempre a mesma, afundar o bloco e nunca contra-pressionar, estando isso bem visível no movimento de Andreia Jacinto.

Diz-se que os piores momentos para sofrer são na abertura e no fecho das partes, e foi precisamente em cada um destes que Portugal sofreu dois.

Estrategicamente, Francisco Neto, para além de adiantar um bocadinho as médias externas na pressão, não mudou nada.

No entanto, conseguiu fazer a equipa estabilizar, também pela redução do ritmo do adversário, com a troca de algumas peças. Saíram Beatriz Fonseca e Andreia Jacinto, ambas do lado direito, para ingressarem Ana Borges e Ana Seiça. Ana Borges trocou diretamente com Beatriz na ala direita, enquanto que Ana Seiça entrou para ser defesa central externa pela esquerda, permitindo que Fátima Pinto subisse para média defensiva e, consequentemente, que Tatiana Pinto subisse para ser média externa direita.

Fátima Pinto faz uma segunda parte de um nível muito diferente ao da primeira, conseguindo bloquear ataques e acrescentando dimensão física ao meio campo das Navegadores, enquanto que Ana Seiça, com e sem bola, deu outra sobriedade ao setor mais recuado.

Por outro lado, Monste Tomé não esteve bem na única alteração que efetuou ao intervalo. Athenea não entra propriamente bem no jogo, surgindo no flanco direito, vindo para o esquerdo Mariona, tendo reduzindo o rendimento desse flanco e o impacto de Olga Carmona.

O melhor momento de Portugal surge já no último quadrante temporal, após a subtração de Jéssica Silva e a entrada de Ana Capeta, avançada menos móvel, mais forte e com maior capacidade de receber e oferecer pausa aos ataques.

Ainda assim, a Espanha, sem criar nada de extraordinário, continuaria por cima do jogo, lançando, ao minuto 66, Salma Paraluello para a frente de ataque, aumentando a mobilidade, mas sem grande taxa de acerto, e Jana Fernandez por Batlle, na lateral direita.

Durou pouco mais de dez minutos para a selecionadora espanhola perceber que esta junção de perfis ofensivos pouco traria ao seu ataque, voltando a apostar numa ponta de lança mais natural, lançando Martín-Prieto, avançada do Benfica. Uns minutos depois, ainda haveria tempo para Aitana Bonmatí somar uns minutos.

Espanha Jogadoras Feminino
Fonte: Federação Espanhola de Futebol

Do lado luso, Kika Nazareth não teria minutos, tendo Francisco Neto lançado Dolores Silva e Andreia Faria, em momentos diferentes, por Andreia Norton e Diana Silva.

Ainda haveria tempo para se firmar com sucesso a presença forte na área de Martín-Prieto, respondendo a um belo cruzamento de Salma Paraluello, que já estava a jogar a partir do flanco esquerdo, onde se sente mais confortável.

Como se podia esperar, os três pontos seguiram para Espanha e, na próxima jornada, Portugal defrontará a Itália, que bateu por 1-0 a Bélgica.

Rodrigo Silva
Rodrigo Silva
O Rodrigo ama aventuras, é scout no Guarda FC e no FC Porto e crê que o talento futebolístico existe em qualquer lado. Para além disso, adora jogadores completos e bolas paradas.

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