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O poder da tomada de decisão | Belenenses 1-1 Académica

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O sol desvanecia à medida que o início do jogo se aproximava. A escuridão e o frio apareciam. Adeptos de Belenenses e Académica não tinham outro remédio senão cantar para aquecer um pouco mais o ambiente e as próprias vozes, e dois gigantes do nosso futebol, outrora mais acordados, prometiam brilho a um Estádio do Restelo que, por si só, já é espetacular. Vivia-se ambiente de clássico no jogo grande da jornada 13 da Liga 3. O empate a uma bola garantiu à Académica subir à terceira posição, aproveitando a derrota do Caldas frente ao 1.º Dezembro, ainda que ficando com apenas mais um ponto do que o Amora, que está, para já, fora de zona de qualificação para o grupo de promoção. O Belenenses sabia que se iria manter no primeiro lugar, praticamente qualificado para a disputa por uma vaga na Segunda Liga, embora tenha visto a vantagem para o Mafra ser reduzida a três pontos.

Uma vez mais, tal como já referi em várias crónicas de jogos da Liga 3, a partida foi decidida nos detalhes. Este é um campeonato recheado de emoção e, quando os intervenientes são dois clubes com um passado tão glorioso no futebol português, podemos esperar que tudo aconteça. Como referido pelo mister António Barbosa, este pode até não ter sido um dos jogos mais empolgantes para o adepto-comum. De facto, não o foi. Mas, num futebol cada vez mais evoluído, apoiado por tantas ferramentas de observação, é complicado equipas com qualidade individual tão idênticas sobressaírem. Surge aí a necessidade da criatividade do jogador, cuja tomada de decisão é tão fundamental para desbloquear e fazer mexer as estruturas adversárias e, consequentemente, o marcador.

Os golos surgiram de raros rasgos individuais, impulsionados pela estratégia de jogo dos seus líderes, que conseguiram, de certa forma, contornar os planos de uma e outra equipa. À entrada para a meia-hora de jogo, Afonso Afonso recuou para perto dos centrais para ajudar a construir e, aproveitando uma pressão passiva de Leandro Silva, bem como o espaço entre setor intermédio e defensivo, encontrou Miguel Bandarra por dentro – através de um posicionamento previamente planeado e movimentos coordenados com o extremo-, combinou com Evandro Barros, que com muita qualidade técnica, tirou Beni da frente com tremenda facilidade e, através de um cruzamento milimétrico, encontrou a cabeça de Wilson Eduardo, que colocou a bola no fundo das redes.

Fonte: Pedro Barrelas/Bola na Rede

Este foi um lance muitíssimo bem trabalhado, onde o dedo de treinador teve claro impacto, mas, uma vez mais, foram precisos executantes inspirados para pôr em prática os planos do técnico. O golo da Académica, que surgiu também após cruzamento, teve em Edson Farias o grande combustível. O extremo-direito adaptado a lateral aproveitou a pressão bem encaixada orquestrada pela equipa técnica para recuperar a bola e, dando aso à sua força, conduziu-a de fora para dentro, resistindo à pressão adversária, onde encontrou Beni. O jogador emprestado pelo Benfica esperou muito bem a sobreposição interior do lateral Kaká, que, não sendo bem acompanhado por Evandro Barros, tirou um ótimo cruzamento e encontrou, após grande salto do avançado colombiano, um Camilo Triana determinado em marcar à antiga equipa e a restabelecer o empate no marcador.

Fonte: Pedro Barrelas/Bola na Rede

O trabalho dos treinadores é, grande parte das vezes, inglório. Para além de uma série de variáveis às quais estão sujeitos, ainda que muitas delas possam ser previamente estudadas e preparadas, haverá sempre, tal como o mister António Barbosa afirmou, a dependência de fatores ligados à competição, que o tornam imprevisível e, não raras vezes, deitam abaixo qualquer plano de jogo. O poder da tomada de decisão é justamente esse: pôr em prática e aproveitar as vantagens previamente identificadas e conseguidas por parte dos treinadores ou, até mesmo, criar, a partir do talento individual e da inteligência em campo, vantagens que se sobrepõem qualquer tipo de treino ou estudo, contemplando apenas a intuição do jogador. Neste tipo de jogos, é essencial, por vezes, que seja o atleta a decidir e a identificar possíveis lacunas na estrutura adversária.

É notório que, cada vez mais, estamos a caminhar para um futebol padronizado, com quase maior protagonismo para quem está no banco do que para quem corre dentro de campo. Contudo, a análise mais micro, aquela que é feita num espaço reduzido em situação de, no máximo, três para três, continua a ser feita pelo jogador, e não creio que alguma vez vá mudar. O papel do treinador aí é perceber qual o atleta mais indicado para ajudar a criar vantagem nesse “micro-jogo”.  Mas, tal como nos lances de golo que escrutinei, é indispensável a decisão e execução do jogador, de forma a dar sentido às vantagens criadas pelo treinador. A grande diferença do xadrez para o futebol está aqui: o futebol não é linear, pelo que nem sempre o melhor treinador, aquele que pensou melhor o jogo, vai levar a melhor. Por vezes, quando um determinado jogador chega um milésimo de segundo atrasado a saltar à pressão ou dá um toque a mais, que permite ao defesa recuperar posição, pode deitar tudo a perder.

Fonte: Pedro Barrelas/Bola na Rede

A Liga 3 pode não ter jogadores com nível de Primeira Liga. Pode nem sequer proporcionar lances tão geniais. Contudo, muitas vezes, dada a competitividade do campeonato, acaba por ter muito mais conteúdo e por ter muito mais debate porque qualquer detalhe menor pode condicionar tudo o que foi previamente treinado e planeado ou, pelo contrário, salvar uma análise mal feita. A Liga 3 não é futebol puro apenas por mover menos capital. É futebol puro porque exige cuidados redobrados por parte de todos os agentes, necessita de articulação exímia entre todos e contém a espetacularidade da indefinição no resultado até ao último instante da partida.

Por fim, de modo a comprovar tudo o que foi escrito até aqui, e, desde logo, demonstrando a exigência deste campeonato, deixo as declarações do mister Tiago Zorro e do mister António Barbosa, que enriquecem ainda mais o futebol português, o campeonato e as respetivas equipas.

António Barbosa
Fonte: Pedro Barrelas/Bola na Rede

Eis as declarações de António Barbosa, treinador da Académica:

Bola na Rede: Falando do primeiro tempo, houve uma mobilidade muito grande no meio-campo, grande variabilidade na construção, mas chegando à zona de progressão e de aproximação ao último terço, pareciam faltar soluções. Muitas vezes a Académica acabava por tentar procurar o Triana, seja para ele receber e servir de apoio, seja para explorar o ataque ao espaço. O que é que o mister acha que faltou na chegada ao último terço?

António Barbosa: Se um jogo de futebol se resumisse a jogar, faltava o passe na diagonal. Mas, para mim, o jogo de futebol resume-se em competir. O jogo é muito mais do que aquilo que são as intenções e a preparação. Chegamos ao jogo, é o confronto, é a agressividade, é o posicionamento dos médios, é a intensidade na cobertura dos centrais. Penso que a equipa inteligentemente percebeu que, na primeira parte, realmente não encontrávamos esse espaço – a que nós chamamos zona de aceleração, que é a frente da linha defensiva – e não conseguimos fazer o que pretendíamos. Nós não conseguimos descobrir o que queríamos, mas a equipa conseguiu descobrir outras situações. E outro aspeto é que nós queríamos realmente entrar em determinadas zonas, mas o jogo foi tão competitivo que em muitos momentos a equipa tinha de assegurar que a etapa de construção fosse apoiada, que não perdêssemos bolas e, se perdêssemos, que fosse nas costas da linha defensiva, de forma a evitar contra-ataques e transições. Também sentíamos que esse era o espaço que podíamos explorar. Não sendo um jogo muito agradável de se ver – como já fizemos muitos -, foi um jogo altamente competitivo e valorizo muito esta atitude que os nossos jogadores tiveram. Para o espectador, se calhar, não foi agradável de ver o jogo de parte a parte, porque o adversário também não conseguiu fazer muito, mas do ponto de vista da competição, da organização, do compromisso, da atitude competitiva, que valorizo muito mais, de realçar esta capacidade para correr. Muitas vezes a bola longa entrava, nós estávamos distantes, e foi preciso correr muito para trás e muito rápido. Mais uma vez, mais um golo marcado, parece que é fácil. Os nossos jogadores conseguem marcar por causa da qualidade deles e pela entrega, mas, fundamentalmente, pela visão que têm de baliza, contra um adversário muito, muito forte, num estádio muito difícil, e, acima de tudo, num jogo muito competitivo.

Bola na Rede: Quer deixar alguma palavra de apreço aos adeptos que se mobilizaram em massa?

António Barbosa: Os adeptos da Académica são realmente particulares. Nós temos a sorte e a oportunidade de trabalhar num grande clube, em que os adeptos se deslocam e apoiam, e, principalmente nestas deslocações mais a sul, estamos muito gratos por isso. Mas é de realçar que, para além disso, apoiam mesmo. Do primeiro ao último minuto, incentivam os nossos jogadores, apoiam. Óbvio que há muito momentos em que sentem um pouco mais o jogo, como todos nós, mas querem apoiar, querem incentivar, querem elogiar e querem valorizar. Ou seja, é uma equipa com adeptos que têm orgulho naquilo que se faz dentro de campo. Eu quero agradecer essa deslocação, mas dizer que há muitos jogos em que nos têm de apoiar ainda, há muitos jogos importantes e gostávamos de continuar a contar com eles. Nós dentro de campo vamos continuar a dar tudo para ganhar os jogos, sendo que nem sempre é possível pontuar, e continuar a chegar onde nós queremos. O nosso objetivo é lutar pelos quatro primeiros lugares, como sempre foi, continuarmos consistentes e, acima de tudo, que percebam que este é um conjunto de guerreiros que vai até ao fim por eles e pela Académica, obviamente.

Tiago Zorro no jogo entre o Belenenses e o Atlético
Fonte: Pedro Barrelas/Bola na Rede

Por fim, estas foram as palavras de Tiago Zorro, timoneiro dos azuis do Restelo:

Bola na Rede: O Miguel Bandarra no lance do golo teve um papel importantíssimo ao receber entrelinhas e depois em articular-se com o Evandro. No segundo tempo, o Evandro foi ocupando, muitas vezes, a posição entre o central e o lateral, foi conduzindo muitas vezes também para terrenos interiores. Gostava de lhe perguntar como é que o mister avalia a relação entre o Bandarra e o Evandro neste jogo ao coabitarem no mesmo corredor?

Tiago Zorro: De forma normal dentro daquela que é a nossa ideia. Em alguns momentos, nós colocamos o lateral por dentro e o extremo fica por fora, e foi isso que aconteceu no lance do primeiro golo. Conseguimos descobrir dentro e depois a bola entrou fora. Em alguns outros momentos, sabemos que o Evandro tem uma velocidade capaz de o fazer ganhar a frente e poder espreitar ali o espaço entre lateral e central para haver rotura na possibilidade de uma bola descoberta, e assim o lateral ficar por fora. Portanto, não há aqui um padrão, a ideia é esta. Por vezes, ficava um por dentro e um por fora, e vice-versa. Desta forma, estivemos à procura de alguns desequilíbrios.

Bola na Rede: O corredor esquerdo foi poucas vezes ativado durante o jogo. Foi com o objetivo de o ativar que o David Rebelo entrou para a saída do Diogo Leitão?

Tiago Zorro: Não, não era esse o objetivo. Pareceu-nos mais fácil entrar pelo lado esquerdo da equipa da Académica, com o Beni em alguns momentos nem sempre bem do ponto de vista defensivo. Do outro lado, os jogadores são mais experientes, mais corretos naquilo que eram os posicionamentos e aí tivemos mais dificuldade. A ideia não passa por jogar só por um lado ou mais vezes só por um lado, a ideia passaria por podermos ter os dois corredores laterais a funcionar, mas, estando mais fácil entrar por um dos lados, acho que os jogadores decidiram muitas vezes ir por ali, até porque, em alguns momentos, o Afonso Afonso também conseguiu chegar ao corredor e criávamos ali uma superioridade numérica.

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