«A nossa bandeira é a qualidade dos textos» – Entrevista BnR com Mário Cagica Oliveira

    -Solidificação e crescimento do projeto-

    «Se é do Bola na Rede vai ser bom»

    Bola na Rede: Três anos depois do arranque, o projeto estende-se às plataformas digitais. Como se deu a criação do site?

    Mário Cagica: Dentro da ESCS, sempre consegui ter uma boa relação com colegas fora do curso de jornalismo e isso permitiu-nos ter outras áreas de abrangência. Quero com isto dizer que estava a passar férias com dois amigos – um de Publicidade e Marketing e outro de Audiovisual e Multimédia – e perguntámo-nos “E se criássemos um site para o Bola na Rede só com pessoas da ESCS?”. Foi tão fácil que nem imaginas… toda a gente se mostrou interessada, porque havia esta lacuna – e falo da ESCS como poderia falar de todas as outras escolas de comunicação e universidades de jornalismo, pois não havia nada ligado ao desporto. Juntámos um grupo muito grande, de forma a abranger todas as áreas do site, e num verão, antes de voltarmos à faculdade, criámos tudo. A ideia inicial era ter apenas alunos da ESCS, mas mal criámos o site, começámos a receber muitas candidaturas de pessoas de fora. Posso até dizer-te que a primeira pessoa que aceitámos fora da ESCS foi um senhor muito mais velho, o José Luis Montero, que já não trabalhava e que pediu para colaborar connosco porque gostava muito de escrever sobre jogadores antigos.

    Fonte: Arquivo Pessoal

    Bola na Rede: Antes disto já havia reconhecimento do projeto junto da comunidade académica?

    Mário Cagica: Já éramos reconhecidos, sim. Já se percebia que era um projeto que estava a ultrapassar as paredes da faculdade. Ainda falámos com a ESCS a propósito do Bola na Rede até ser um núcleo extracurricular da faculdade, mas não nos fez sentido por irmos perder um pouco daquela que é a nossa linha editorial.

    Bola na Rede: Por falar em linha editorial, apresentam-se como um site de opinião. Se por um lado esta autodefinição deixa claro que cada um é responsável pelo que escreve, por outro não colide com a ideia de jornalismo isento e imparcial?

    Mário Cagica: Essa questão foi por nós muito debatida no início e sempre tivemos uma ideia muito igual. Eu acredito num jornalismo isento, mas não acredito naquela noção clara de imparcialidade que tantas pessoas falam, porque acho impossível relatares algo sem colocares um pouco do teu cunho na forma como transmites a informação. No Bola na Rede informar não é o nosso primeiro objetivo, mas interpretar e dar opinião e sempre foi por aqui que tentámos trilhar o nosso percurso, até porque não tínhamos capacidade para ter uma redação de informação. Para além disto, já há órgãos de comunicação social cujo propósito é informar e nunca poderíamos competir com eles. Assim, entendemos que a melhor arma para fazer a diferença é a opinião, sempre sustentada e nunca faltando ao respeito a alguém.

    Bola na Rede: Terá sido por esta altura que alguns colaboradores do projeto começaram a entrar no mercado de trabalho. Tiveste feedback sobre a mais-valia de ter começado pelo Bola na Rede?

    Mário Cagica: Imenso. Basta ir ao nosso site, porque fazemos questão de ter lá os testemunhos dos jornalistas em atividade que pertenceram ao projeto.

    https://bolanarede.pt/bnr-alumni/

    Bola na Rede: A título pessoal, de que forma a tua experiência no BnR te serviu no teu percurso profissional?

    Mário Cagica: Foi determinante. Faltava-me uma cadeira para terminar o curso e pensava “O que é que eu faço agora? Vou começar a enviar currículos…”, mas sem grandes expetativas e conhecimentos. Mas não demorou muito até receber logo uma resposta do Record para fazer lá um estágio curricular e na entrevista a primeira coisa falada foi o Bola na Rede. Faço novamente um estágio curricular, desta feita em mestrado e no Correio da Manhã e, passado uns tempos, já me vinham pedir referências de outros jovens a entrar no mercado de trabalho e que estavam ou tinham estado no Bola na Rede. A minha editora chegou a dizer “Se é do Bola na Rede vai ser bom” e quando ouvi isso fiquei mesmo contente.

    Bola na Rede: Foi quando percebeste que, mais do que uma brincadeira de amigos, podias estar na presença de uma escola de jornalistas?

    Mário Cagica: Vou partilhar algo que nunca o fiz, mas já passou tanto tempo…. Na altura custou-me bastante, mas hoje sinto que foi o que me fez ver que o trabalhar por um projeto acaba por trazer coisas boas.

    Quando terminei o meu primeiro estágio, falaram comigo sobre a possibilidade de estender o estágio por mais uns meses. Como sabes, quando estamos em estágio curricular não recebemos e eu quase que pagava para trabalhar – neste aspeto a área do jornalismo não é fácil -, então disse que, pelo menos, deviam cobrir-me os transportes. Senti aquele desconforto de que eles achassem que ainda estava ali a fazer exigências, ainda para mais sendo um miúdo sem qualquer experiência. “Ok, então segunda-feira falas com a pessoa responsável pelos estágios”, disseram-me. Assim foi e, quando lá cheguei, dizem a um miúdo de 20 anos que, por ter exigido condições de trabalho, “não era jornalista, nem pouco mais ou menos”, dando o dito por não dito – porque afinal de contas eles queriam ficar comigo, mas de borla. O que é que um jovem pensa ao ouvir isto? Se calhar não é a minha área, se calhar não é o que eu quero… por isso é que acho que é muito importante haver preparação mental para o mercado de trabalho. Por saber o que já tinha trabalhado para chegar ali, levei aquilo como um incentivo, ainda que soubesse que não era isso que aquela pessoa que falou comigo queria. Por isto o Bola na Rede foi tão importante para mim, porque já sabia o que tinha feito e agarrei-me ao projeto. O Bola na Rede, como qualquer coisa que apareça numa fase inicial e nós nos consigamos agarrar, dá-nos aquela base inicial para perceber “Ok, vou começar a saber lidar com as críticas para saber se tenho capacidade para seguir este rumo”. Cada vez mais, acho que o que é importante numa fase inicial, mais do que o talento para escrever ou saber falar, é muito importante ter confiança e saber estar pronto para lidar com todo o tipo de críticas.

    Bola na Rede: Em ano de Mundial no Brasil, o BnR dá um passo de gigante na sua consolidação e consegue autorização para coberturas ao vivo. Como foi este processo?

    Mário Cagica: Foi através da boa relação que íamos construindo com os clubes. Começámos a aproximar-nos ligeiramente, a cobrir certo tipo de rescaldos, ganhando algum nome e, devagarinho, a ganhar a confiança de assessores. Foi algo conseguido naturalmente, muito também pela proximidade que tínhamos com ex-colaboradores que foram para clubes como o Sporting, em que nos foram dando oportunidades de entrar no seu mundo.

    Fonte: Arquivo Pessoal

    Bola na Rede: Até aos diretos, acredito que esta era a maior provação pela qual os colaboradores passavam enquanto parte integrante do projeto. Quais as principais dificuldades que sentias junto dos colaboradores quando iam aos estádios?

    Mário Cagica: Tínhamos dois pontos fulcrais nessas situações: que o redator se sentisse seguro no processo, ou seja, tivesse capacidade para fazer o texto no estádio e enviá-lo a horas, bem como posicionar-se no sítio certo e outras manhas da profissão; e, depois, marcar sempre presença nas conferências de imprensa e dizer o nome Bola na Rede.

    Bola na Rede: O preconceito latente em relação a um projeto de raízes académicas ainda se faz sentir?

    Mário Cagica: Sim, infelizmente. Não digo que seja generalizado, mas sim.

    Bola na Rede: Dá-me exemplos.

    Mário Cagica: Quando falamos de acreditações e de coberturas. São um caso que a meu ver até é grave, porque é censurarem-nos; nós sendo um órgão de comunicação social e tendo jornalistas com carteira temos exatamente os mesmos direitos que outros, pese embora o mediatismo seja diferente. É uma situação que a CCPJ devia estar mais atenta. Pior ainda são clubes que reclamam por igualdade e que nos aceitam em jogos contra equipas menos sonantes e quando é contra os três grandes dizem-nos que não têm espaço.

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    Um conjunto de felizes acasos, qual John Cusack, proporcionaram-lhe conciliar a Comunicação e o Jornalismo. Junte-se-lhes o Desporto e estão reunidas as condições para este licenciado em Estudos Portugueses e mestre em Ciências da Comunicação ser um profissional realizado.                                                                                                                                                 O Miguel escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.