«Conquistar a Taça do Rei do Bahrain foi a cereja no topo do bolo» – Entrevista BnR com Nandinho

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    Nandinho fala ao Bola na Rede, logo depois da sua primeira conquista como treinador. O técnico português garantiu a conquista da Taça do Bahrain, após 21 anos sem que o Al Ahli vencesse o troféu. Em entrevista fala sobre a experiência no Médio-Oriente, do passado e presente como treinador e das ambições futuras na carreira.

    «É uma felicidade enorme conquistar a Taça do Bahrain, é isto que qualquer treinador e jogador quer».

    Bola na Rede: Nandinho, obrigado pela disponibilidade. Que tal está a ser esta experiência no Bahrain?

    Nandinho: Sim, sim, está a ser uma experiência muito positivo. Apesar de ser um país de Médio-Oriente e que, normalmente, as pessoas pensam que há muitas restrições… Este é um país de Médio-Oriente mais ocidental, se assim pudermos dizer. Há muito maior abertura em termos de tudo. Claro que com a cultura própria deles, mas é um país pequeno com um milhão e 500 mil habitantes, sendo que metade são estrangeiros. Por aí, dá para perceber que é um país muito mais aberto e ocidentalizado. Têm as suas crenças, mas é um país seguro e onde se vive bem e com qualidade de vida. Foi uma agradável surpresa para mim.

    Bola na Rede: Com o Al Ahli conquistaste recentemente a Taça do Bahrain, depois de o clube ter estado 21 anos sem ter vencido o troféu. Como foi o sentimento?

    Nandinho: É uma felicidade enorme, é uma alegria. É isto que qualquer treinador e jogador quer. É ganhar troféus e é isso que fica no nosso currículo e memória. São momentos em que se conquistam títulos. Teve um sabor especial porque foi o meu primeiro título enquanto treinador e depois porque é um clube com muitos adeptos. É histórico para o Al Ahli e já não ganhava o troféu há muitos anos. Há muita sede e fome de vitórias. São muitas tentativas de conquistas por parte do clube. O último troféu tinha sido o da Segunda Liga, em 2016, mas em termos de Primeira Liga tinha sido apenas em 2010, creio eu. São muitos anos e, ainda por cima, esta é a competição que eles mais valorizam, mais do que o campeonato. Em termos de prémio monetário, é superior ao campeonato. Isso diz bem… É a Taça do Rei e o Rei é a figura ímpar deste país. Foi uma alegria enorme, ainda por cima num jogo que coincidiu com as duas equipas histórias do Bahrain que têm mais adeptos. Foi uma final fantástico, o estádio esteve quase cheio. Não encheu por completo, mas foi uma festa muito bonita. E, claro, culminou com uma vitória que foi a cereja no topo do bolo.

    Nandinho Taça Bahrain
    Fonte: Al Ahli

    Bola na Rede: Suponho que o ambiente tenha sido apoteótico. Em termos de campeonato, o Al Ahli está em quarto lugar. Acreditas que a equipa ainda pode lutar pelo título de campeão e juntar à Taça do Bahrain?

    Nandinho: Acreditar, acredito. Porque nós batemo-nos com qualquer equipa. Já vencemos o primeiro classificado e o que está em terceiro foi o que nós batemos para a Taça, agora nos penáltis. Já demonstrámos que temos capacidade para competir com qualquer equipa. O campeonato é muito equilibrado, mesmo as equipas que estão a lutar para não descer. Repare: estamos a seis pontos do primeiro lugar e com seis pontos de vantagem para as equipas do playoff de descida. É muito equilibrado, não há muitos jogos [22 encontros, faltam nove] e ainda vamos defrontar os três clubes que estão acima de nós. Vai depender muito destes próximos dois jogos. Se conseguirmos bons resultados e mantivermos uma distância curta, creio que podemos almejar isso. Mas é jogo a jogo. A melhor classificação nos últimos anos foi a época passada, em que ficámos em sexto. Já estivemos em primeiro, já estivemos em quarto… Acho que se criou um ambiente positivo e uma crença nos jogadores. Eles acreditam que é possível e que temos de trazer uma mentalidade ganhadora para o clube. Só desta forma é que poderemos estar nas competições e lutar por elas.

    Bola na Rede: Tem existido algum investido no Médio-Oriente, principalmente na Arábia Saudita. Sentes que o futebol no Bahrain está em desenvolvimento, nesta altura?

    Nandinho: Em desenvolvimento, está. Mas ainda estão muito atrasados em relações aos campeonatos aqui à volta. Em termos financeiros e de organização. A realidade é que o Bahrain é um país muito pequeno e que depende do investimento saudita aqui. Não há capacidade em termos logísticos e financeiros para conseguirem ombrear com países como o Catar, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita. Mas há margem de crescimento, sobretudo a nível da qualidade futebolística. Mas ainda há desorganização aqui. Não valorizam tanto o futebol como outras modalidades, tal como o Basquetebol, Voleibol ou Andebol, que têm outro poder devido aos resultados que têm tido ao nível de seleções. É fundamental que abram horizontes e trazerem treinadores de fora para melhorarem o nível qualitativo. É importante para dar organização ao futebol, mas o fundamental disto é começar pela base. A nível de formação não existem condições logísticas e falta capacidade desportiva. Não há cultura futebolística, tal como existe na Europa. Nós somos apaixonados pelo Futebol e aqui não. Para começar a ser, é preciso começar pela base. Leva tempo, mas é possível.

    «Liga do Bahrain não está ao nível da Arábia Saudita e do Catar, mas tem qualidade».

    Bola na Rede: Acreditas que o Bahrain pode ser um bom mercado para jogadores e técnicos oriundos de Portugal?

    Nandinho: Sim, depende daquilo que procurem. Eu vim para aqui um bocadinho para tentar abrir portas noutros mercados onde o futebol tem um nível superior. Pode ser um bom mercado, sim. Eles aqui não apostam em jogadores jovens, há muitos brasileiros aqui, que chegam de divisões inferiores. Mas pode ser também uma rampa de lançamento para eles, que querem evoluir nestes mercados. Para crescer, acredito que não seja o contexto melhor para um jovem jogador que tenha a ambição de jogar na Europa e em clubes grupos. Será mais difícil, a não ser que demonstre muito valor neste campeonato. Mas é uma liga que a mim me surpreendeu porque existe qualidade. Não está ao nível da Arábia Saudita e do Catar, mas tem qualidade. Há muitos jogadores que não são profissionais, tenho vários na minha equipa que também trabalham. É preciso evoluírem para o nível mais profissional para darem um salto em termos qualitativos.

    Bola na Rede: Tens encontrado muitos portugueses por aí, não só no Futebol…

    Nandinho: Sim, há uma comunidade portuguesa aqui. Existe aqui uma padaria nas ilhas artificiais e nós, à sexta-feira à noite ou ao sábado de manhã, costumamos ir lá. São distribuidores de pão e de pastéis de nata. Os portugueses aí costumam encontrar-se. Existe aqui uma comunidade razoável de portugueses e nós, normalmente, estamos com eles. É importante para falar a nossa língua. Estou sempre a falar inglês e, por vezes, é importante.

    Bola na Rede: Por falar em Portugal, olhamos um bocadinho para a Primeira Liga. Continuas a acompanhar o futebol português?

    Nandinho: Sim, tenho acompanhado. Está um campeonato competitivo, com o Sporting a estar uns furinhos acima do Benfica e do FC Porto. Não só em termos de resultados, mas também em termos exibicionais. O Braga está um bocadinho aquém das expectativas porque contava que ainda poderiam estar ali na luta por outros objetivos. Porque têm uma boa equipa e boa estrutura. Mas nem sempre quem tem um grande plantel vai lutar pelo título. Os três grandes vão estar até aos últimos jogos a lutar pelo título. Espero que assim seja e que exista competitividade. Neste momento, o Sporting está um bocadinho mais forte do que os outros dois.

    Bola na Rede: Já agora, puxando um bocadinho pelo Gil Vicente, um clube que lhe diz muito. O que tens achado da equipa de Barcelos nesta temporada?

    Nandinho: Está também um bocadinho aquém das expectativas, mas tem bons jogadores e uma boa equipa técnica. Tem uma estrutura sólida. Mas é difícil. Quando cais nos lugares próximos de descida, a pressão é grande e os jogadores não conseguem apresentar todas as capacidades devido à pressão do resultado. Agora tem conseguido pontuar e afastar-se dos resultados de descida. Acredito que consiga melhores resultados. O Gil Vicente foi à Liga Europa, mas a experiência diz-me que no ano seguinte, que equipas que não estão habituadas a ir às provas europeias, sofrem um bocadinho a seguir. Sofrem um bocadinho por isso, por essa exigência. E, muitas vezes, o plantel não é, em termos de número de jogadores, não é tão consistente para que uma equipa esteja em várias frentes ao mesmo tempo. Normalmente têm um onze-base, mais cinco ou seis jogadores, e normalmente, quando precisam de trocar, ressentem-se. Está a fazer uma época dentro da normalidade de uma equipa como é o Gil Vicente, que luta para se manter.

    «Sinto que o meu trabalho não é valorizado em Portugal e é preciso sairmos do nosso país para que seja reconhecido».

    Bola na Rede: A tua última experiência em Portugal foi na B SAD. Achas que foi o projeto indicado para ti, naquela altura?

    Nandinho: Não era o projeto indicado. Claro que queria estar numa equipa que pudesse lutar por outros objetivos, mas estava há um ano em Portugal sem ter propostas de trabalho. Foi a que surgiu na altura. Era importante voltar ao mercado de trabalho, na Segunda Liga, onde tinha estado sempre. Era tentar fazer um bom trabalho para poder, na época seguinte, se calhar, entrar num projeto mais ambicioso. As coisas não surgiram dessa forma, era um projeto muito difícil. Foi muito difícil, não só em termos desportivos. Em termos desportivos até acho que estávamos a fazer, para o que era o plantel da B SAD, estávamos a lutar pelo playoff. E sem reforços. O dia em que saí foi quando chegaram todos os reforços. Quando saí é que chegaram os reforços. Era uma equipa desequilibrada com os sub-23 da época anterior. Ainda assim, estávamos na luta e com possibilidade de garantir a manutenção. Infelizmente, o presidente achou por bem que queria trocar, e que era melhor, e acabei por sair. Já quis sair antes e aí por problemas de relacionamento com o presidente. Quis sair um mês antes do meu real abandono. Não foi possível porque ele não me deixou sair, mas eu sabia que era uma questão de tempo. Era difícil conseguir trabalhar da forma como aquilo estava a ser gerido. Mas isso são outras questões, não quero entrar muito por aí… Saí prematuramente, não por minha vontade. Por mim, tinha ido até ao fim com a B SAD e acreditava que era possível a manutenção na Segunda Liga. O presidente entendeu o contrário e pronto. Infelizmente não se conseguiram manter e acabaram por descer.

    Nandinho
    Fonte: Al Ahli

    Bola na Rede: Estás aberto a propostas de Portugal? Ou sentes que vais ficar no estrangeiro mais algum tempo?

    Nandinho: Não sei, depende dos projetos que aparecerem. Tenho de pensar no que é melhor para mim e para a minha família. Estar longe da família nunca é bom. Quero voltar a Portugal e estou aberto a projetos. Mas tenho de escolher bem e não dar um passo em falso. Sempre que tive aí, os últimos projetos foram de equipas de Segunda Liga que lutavam para não descer. Só no Gil Vicente é que consegui começar um projeto de início e as coisas correram muito bem, de início. Mas isso não foi valorizado. Sinto que o meu trabalho em Portugal não é valorizado e, às vezes, é preciso sairmos do nosso país para que o nosso trabalho seja reconhecido. Felizmente é o que tem acontecido. Já quando estive em Espanha foi assim. Agora, na segunda experiência fora, está a ser assim. Os projetos têm corrido bem e têm-me dado alguma visibilidade e reconhecimento. É importante sentirmos que o nosso trabalho seja valorizado e reconhecido. Infelizmente, só sinto isso quando estou fora do nosso país.

    Bola na Rede: Nandinho, obrigado pelo tempo e boa sorte para o que resta da temporada.

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