«Já acham que o Petro de Luanda é o FC Bayern de Munique de África» – Entrevista BnR com Alexandre Santos

    – Uma questão de organização –

    «O nível de agressividade é altíssimo. Há aqui muitos treinos que na Europa não acabariam de certeza»

    Bola na Rede: Antes de ir para o campeonato angolano teve que fazer estudo prévio ou já estava por dentro da realidade?

    Alexandre Santos: Vi alguns jogos da época passada. Foi tudo muito rápido. A meio de agosto recebi o convite, 12 dias depois cheguei a Angola. Quando cheguei, já a equipa estava a treinar. Fui analisando rapidamente. Meti as mãos na massa para preparar a equipa. Duas semanas depois estávamos a jogar as eliminatórias da Liga dos Campeões Africana.

    Bola na Rede: Como é o entendimento do jogo por parte dos atletas angolanos?

    Alexandre Santos: Muito positivo. Temos vários jogadores abaixo dos 24 anos. Senti que havia uma vontade muito grande de melhorarem para conseguirem finalmente ganhar. Os jogadores mais jovens têm muita disponibilidade física para treinarem e melhorarem. Os mais velhos têm-me ajudado muito a passar as mensagens do que quero. Mesmo os jogadores estrangeiros têm acrescentado qualidade. Ao princípio, há uma grande exigência para com os jogadores estrangeiros, porque vêm tirar lugar aos angolanos. No entanto, a equipa foi positiva com eles, porque percebeu que eles podiam ajudar. A génese do futebol do Petro e do futebol africano baseia-se no risco, na velocidade, na intensidade, na aceleração contínua do jogo e na disputa de bola constante no chão e no ar. As bolas paradas são muito mais importantes aqui do que no futebol europeu. Há muitos jogos que se decidem nas bolas paradas. Sem desvirtuar isso, tentámos dar mais organização ao jogo, principalmente nos momentos em que nos desequilibrávamos muito. A equipa gosta muito de atacar, mas perdia rapidamente a bola e sofria contra-ataques. Fomos evoluindo ao longo do tempo.

    Alexandre Santos
    Fonte: Petro de Luanda

    Bola na Rede: Quais foram as principais ideias de jogo que quis implementar no Petro de Luanda?

    Alexandre Santos: O nosso jogo é um jogo de domínio do adversário. Fazemos um jogo mais elaborado do que as outras equipas. Estamos a ter entre 70% e 80% de posse de bola. Mesmo nos jogos da Liga dos Campeões Africana, já conseguimos ter mais posse de bola do que as equipas da África do Norte. Os angolanos não gostavam de um jogo mais trabalhado, mais organizado. Gostam do futebol mais partido, rápido e intenso, com muitos duelos e muita agressividade. O nível de agressividade é altíssimo. Há aqui muitos treinos que na Europa não acabariam de certeza. Eles são mesmo muito agressivos uns com os outros, mas estão habituados, gostam e sentem necessidade disso. Na parte ofensiva, são muito rápidos, gostam muito do um contra um e do drible. Os adeptos valorizam mais um túnel do que o próprio golo. O público não valoriza nada estar em posse de bola, zero. Até lhes é difícil aguentar. Gostam é dos desequilíbrios e isso fui mantendo, porque não quis travar essa lógica. Fui tentando perceber se era possível implementar ideias de maior organização, principalmente, quando se perdia a bola. Ou seja, antes de perder, como é que a equipa estava posicionada, aquilo que designamos de posicionamento final. Trabalhámos muito a forma como a equipa se preparava para perder a bola e não deixava o adversário sair em contra-ataque. O processo defensivo começa ainda com a bola. Eles melhoraram muito nisso. Por exemplo, tínhamos os centrais muito longe dos adversários quando perdíamos a bola, muitas vezes, dentro do próprio meio-campo. Hoje em dia, temos muitas das vezes os centrais a ganharem a bola a meio do meio-campo ofensivo. Se é ali que estão os adversários, é para ali que temos que subir as linhas. Isto está tudo interligado. Podes atacar mais tempo, se ganhares mais cedo a bola e mais perto da baliza adversária.

    Bola na Rede: E o mister até gosta de projetar os dois laterais em simultâneo.

    Alexandre Santos: São muito fortes ofensivamente. No entanto, só projeto os dois laterais quando o médio-centro fecha junto dos centrais. Muitas vezes, embora os dois laterais estejam subidos, um deles não está na linha de fundo, mas sim na entrada da área para proteger a saída em contra-ataque do adversário ou para ganhar uma segunda bola. Com isto teve que haver uma organização defensiva também forte…

    Bola na Rede: Sustentada num 4-4-2.

    Alexandre Santos: O Petro tinha por lógica jogar em 4-3-3. Fui vendo que havia uma grande dificuldade das equipas adversárias defenderem dois pontas-de-lança. A questão era aguentar o meio-campo a dois médio-centros, porque, mantendo os extremos, jogamos em 4-2-4. Ao princípio pareceu-me difícil, mas quando começámos a juntar as linhas, a defender e a controlar melhor a posse da bola, sem a perdermos de qualquer forma e rápido, começámos a jogar mais próximos uns dos outros, logo começámos a defender mais facilmente com menos jogadores. Ofensivamente, a equipa tem uma grande fluidez. Conseguimos encontrar soluções de várias formas. Já tivemos equipas que nos pressionaram alto. Já houve equipas que desceram o bloco todo. Os adversários têm encontrado soluções para nos travar e nós temos conseguido sempre soluções para os batermos. Os jogadores da frente têm uma grande qualidade de desdobramento e de capacidade de permuta com os extremos, porque temos extremos que também sabem jogar por dentro.

    Bola na Rede: Principalmente o Tiago Azulão faz muitos movimentos centro/direita.

    Alexandre Santos: Ora aí está. O Tiago Azulão e o Yano, ambos sabem fazer muito bem desmarcações para os corredores laterais, então temos aqui uma mobilidade na frente que deu muitos frutos.

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    Francisco Grácio Martins
    Francisco Grácio Martinshttp://www.bolanarede.pt
    Em criança, recreava-se com a bola nos pés. Hoje, escreve sobre quem realmente faz magia com ela. Detém um incessante gosto por ouvir os protagonistas e uma grande curiosidade pelas histórias que contam. É licenciado em Jornalismo e Comunicação pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e frequenta o Mestrado em Jornalismo da Escola Superior de Comunicação Social.