«Luís Filipe Vieira preferiu Mantorras a Jardel» – Entrevista BnR com Drulović

– EsPentacular –

“Mourinho? Eu e o Zahovic fomos várias vezes falar com Pinto da Costa para contratá-lo”

BnR: És supersticioso?

D: Todos nós somos… todos os jogadores e treinadores têm algumas coisas que fazem antes ou depois dos jogos e é normal.

BnR: Ao ponto de estar disposto a pagar 100 mil contos ao André pela camisola 11?

D: Isso foi uma brincadeira! Como sou muito ligado a esse número – nasci dia 11, às 11 horas –, praticamente joguei sempre com ele na camisola. Antigamente os números utilizados pelos titulares iam do número um ao número onze e o André já usava o 11 há muito tempo. Ao fim dos meus primeiros dois jogos, em que utilizei a camisola nove, fui ter com o André e disse-lhe “Amigo, por favor, eu não consigo jogar sem o número 11, mas respeito se não mo quiseres dar”. Ele foi impecável e a brincar disse-me “Estou aqui há 11 anos; tens de me pagar 100 mil contos”. Ele não fazia questão de ficar com ele e disse-me que só usava aquele número porque quando chegou ao FC Porto ninguém o queria. Depois ele foi falar com o Inácio, que era treinador-adjunto, e com o Paulinho Santos; o Paulinho ficou com o nove, o André com o seis e eu com o 11.

Fonte: Facebook de Drulovic

BnR: A par de Aloísio, foste um dos apenas dois jogadores estrangeiros presentes nas cinco épocas do penta. Como é que aquele grupo de trabalho viveu esse período?

D: Deixa-me dizer-te que o Aloísio é um dos melhores amigos que fiz no futebol e um grande senhor dentro e fora de campo. Quando cheguei ao FC Porto, já lá estavam vários jogadores que tinham sido campeões europeus em ’87 e eram um grande exemplo para os mais novos. Aquela geração era qualquer coisa de extraordinário! A maneira como trabalhavam… os outros jogadores não podiam dizer nada, tinham de trabalhar e esta era a mística do FC Porto. Quando vi o meu amigo Vítor Baía pela primeira vez a defender pensei “Fogo, do que vi até agora, este é o melhor guarda-redes do mundo”. Tive a sorte de trabalhar com muitos jogadores de grande qualidade, e a maioria eram jogadores de seleção portuguesa, algo que não acontece atualmente. Ganhámos o Penta e estivemos perto de ganhar o sexto campeonato, mas aconteceram jogos muito esquisitos, como aquele em Campo Maior, mas é futebol e temos de dar mérito a quem vence.

BnR: Falaste no célebre Campomaiorense 1-0 FC Porto, jogo que ficou marcado por algumas decisões de Bruno Paixão. No entanto, à época, os adversários apontaram várias vezes a arbitragem como fator de desequilíbrio a favor do FC Porto. Alguma vez te sentiste beneficiado?

D: É normal que possam existir erros; às vezes somos prejudicados, outras beneficiados. Normalmente, no fim, ganha a equipa que joga melhor durante a época. O campeonato português é muito competitivo e muitas vezes decide-se na última jornada, o que é bom. Os jogadores são muito agressivos e tecnicamente evoluídos, não é fácil de jogar nem de arbitrar. Por exemplo, quando o Zahovic saiu do FC Porto, jogou um ano na Grécia, depois em Espanha, e disse-me que é muito mais fácil jogar lá fora que em Portugal, porque tinha muito mais espaço e liberdade. Em Portugal, as marcações eram cerradas e não era fácil, principalmente para os avançados, que têm de ser muito criativos e bons tecnicamente, porque os defesas são muito bons.

BnR: Prejudicado talvez, mas num avião.

D: Essa é uma história engraçada! Naquela altura estava em grande forma, era um dos melhores jogadores do FC Porto. Vinha de dois jogos a marcar e, depois do treino, estávamos todos à espera para assinar a convocatória para um encontro da Taça das Taças frente à Sampdoria, uma das melhores equipas italianas naquela época, orientada pelo Eriksson e com Mancini e outros jogadores jugoslavos que jogavam comigo na seleção. Quando olho para a convocatória e não vejo lá o meu nome disse “É impossível”. Olhei uma segunda vez e não estava mesmo o meu nome; fiquei muito surpreendido. Passado uns minutos o Inácio chamou-me e disse-me que o mister queria falar comigo. Quando chego ao pé do falecido Bobby Robson – com quem sempre tive uma excelente relação e que, mesmo quando não me punha a jogar, não conseguia ficar chateado com ele -, ele diz-me com aquele sotaque “Drulo, eu mucho zangado com Presidente!”. “Porquê, mister?”, perguntei-lhe. “Não há lugar no avião”. [risos] Então o mister queria optar pelo Latapy e arranjou a desculpa do avião. O jogo foi numa quinta-feira [vitória por 1-0 em Itália] e domingo tínhamos o derby contra o Benfica; o Bobby Robson tinha como lema “equipa que ganha não se mexe” e comecei no banco. Um jogo importantíssimo – ia decidir o campeão no primeiro ano do Penta – com as Antas cheias. O Secretário foi expulso e a vinte minutos do final entrei para o lugar do Yuran e marquei o golo da vitória. Foram os melhores vinte minutos da minha carreira. No final do jogo, o mister entra no balneário e diz-me “Impossible! Impossible!” e eu disse-lhe “Não há problema, mister. É normal ter de tomar decisões”. Na semana seguinte voltei ao onze, marquei um golo e fiz duas assistências.

BnR: É sob o comando de Bobby Robson que te cruzas com José Mourinho.

D: Sempre tivemos uma excelente relação. O que ele conseguiu é extraordinário! Todos os treinadores portugueses devem-lhe muito; ele abriu-lhes as portas da Europa. Fazer o que ele fez no FC Porto vai ser muito difícil repetir. Sempre admirei Mourinho desde que trabalhámos pela primeira vez, quando diziam que não era treinador, que era tradutor… mas o que achei mais impressionante, e foi quando percebi que ia dar certo, foi no Benfica. Sinceramente, nunca vi uma equipa mudar do 8 para o 80 em tão pouco tempo. O jogo contra o Sporting [3-0] (…) como jogador do Porto estava a ver aquilo e não era a mesma equipa. Foi uma mudança brutal. Já no Leiria, eu e o Zahovic fomos várias vezes falar com Pinto da Costa para contratá-lo.

Fonte: Facebook de Drulovic

BnR: Jogaste com inúmeros craques, mas deixa-me perguntar-te por três.
Já se viam em Sérgio Conceição qualidades para vir a ser treinador?

D: Nunca se pode dizer nunca. O Sérgio tinha uma mentalidade ganhadora e isso é o mais importante. Nem naquela altura gostava de perder, ficava com uma azia impressionante. Ainda hoje é muito impulsivo – parece-me menos, agora. Quando começou, tinha várias reações que não eram normais para treinador. Todos sabemos o que aconteceu quando era treinador do Braga, tinha vários problemas com os presidentes. Está mais tranquilo agora, a experiência conta. Com naturalidade voltou a um clube que conhece muito bem e tem feito um excelente trabalho.

BnR: Na época 98/99, chega ao clube um menino chamado Deco. Perceberam-lhe logo o génio?

D: Já o conhecíamos do Salgueiros. Toda a gente sabia que ele tinha um grande talento, só faltava confirmar se tinha caráter e mentalidade para jogar no FC Porto, porque é muito mais difícil jogar numa equipa grande por causa da pressão e da concorrência dentro do plantel. Ganhámos ainda mais criatividade no último terço com a aquisição de um jogador que toda a gente sabia que ia ser um craque de nível mundial.

BnR: Como explicas o fenómeno que foi Mário Jardel?

D: Quando o Mário foi para o FC Porto estávamos na Escócia a fazer a pré-época. Eu e o Fernando Mendes eramos companheiros de quarto e lembro-me que depois de um treino, em que o Mário queria dominar uma bola e ela saiu pela linha, o Fernando dizer-me “Drulo, como é possível o FC Porto ter gasto tanto dinheiro num jogador que nem uma bola sabe dominar?” [risos] Passados dois ou três dias, tivemos um jogo em que ganhámos 3-1 ou 3-0 e o Jardel marcou dois golos; a partir daí nunca mais parou. Para mim é dos melhores, se não o melhor, goleador que apareceu em Portugal. Nunca vi alguém jogar tão bem de cabeça; chegávamos a ficar depois dos treinos a vê-lo treinar finalização. Tive pena de quando fui para o Benfica ele não me ter acompanhado.Nessa altura, fui falar com a direção do clube a dizer que o Jardel me tinha ligado e queria sair da Turquia e voltar a Portugal, mas o Luís Filipe Vieira tinha contratado o Mantorras… e também havia o episódio com Vilarinho.

BnR: Do que é que ainda falas com Fernando Santos?

D: De muita coisa, sobretudo de futebol. Quando olho pela primeira vez para uma pessoa, quero perceber o Homem que é, isso para mim é mais importante; um treinador pode ser mais ou menos bom, mas é o Homem que me interessa. O Fernando é um grande treinador e uma grande pessoa. A sua carreira e o seu palmarés não são por acaso. Sempre que preciso falo com ele. Quando Portugal jogou na Sérvia pela última vez, as minhas filhas queriam uma fotografia com o Cristiano e ele permitiu que elas fossem ter com os jogadores. É um grande amigo.

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Miguel Ferreira de Araújo
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