«Quando cheguei ao SL Benfica o clube não estava organizado como está atualmente» – Entrevista BnR com Miguelito

    -O pendurar das chuteiras com a sensação de dever cumprido-

    «Estou bastante orgulhoso pelo meu percurso, por aquilo que fiz e conquistei»

    Bola na Rede: Em 2012, aventurou-se no estrangeiro, no Apollon Limassol, do Chipre. Como foi essa experiência, num país e num futebol tão diferentes?

    Miguelito: Foi uma boa experiência. Olhando para trás, só posso considerá-la positiva. Jogar fora de Portugal era algo que queria muito experimentar, e já tinha falado disso com o Carlos Gonçalves, mas nunca tinha tido essa oportunidade. Nesse defeso, até já tinha tudo acertado com o V. Setúbal “de boca” para lá ficar mais um ano. Durante esse período tentei passar o acordo para o papel, mas nunca consegui falar com os responsáveis do clube. Quando me apercebi que poderia ficar desempregado, apareceu esta oportunidade no Apollon Limassol. E posso dizer que foi uma boa experiência. Foi até pena ter sido apenas um ano. Eu já tinha este espírito aventureiro, de poder ir para qualquer sitio, desde que saí do Rio Ave – mesmo em Portugal, estive em regiões muito distintas, e não hesitei em ir para o Chipre. Queria jogar, mostrar o meu futebol também lá fora, e acabei por jogar com muita regularidade, ganhar uma Taça do Chipre nesse ano e, por essa via, conseguir o apuramento para a Liga Europa. Mas as coisas acabaram por durar apenas um ano e, no final da época, regressei a Portugal.

    Bola na Rede: E regressa a Portugal para o Moreirense, que estava na 2.ª divisão. É um projeto para subir à I Liga, ou não fosse a equipa treinada por Vítor Oliveira, com quem já tinha trabalhado no Rio Ave. O Moreirense sobe, mas o Vítor Oliveira até acabou por sair a sete jornadas do fim e quem acaba a época (e conquista a subida) é António Conceição. Essa troca causou, na altura, estranheza. Conseguiu perceber o que se passou?

    Miguelito: Sim, de facto, nesse ano, venho para o Moreirense que era, de longe, a melhor equipa da II Liga. As coisas correram muito bem, desde o início. A sete jornadas do fim já tínhamos praticamente a subida garantida e deparámo-nos com essa “bomba”. Ninguém conseguiu compreender. Estávamos em 1.º lugar, a alguma distância para o segundo e terceiro classificados, o que nos dava praticamente a garantia que iríamos ser campeões e subir de divisão. De um momento para o outro, ao final de um/dois jogos menos conseguidos – o que acontece a todas as equipas ao longo de uma época – e, se não me engano, depois de uma vitória em casa, em que nada o fazia prever, acabámos por nos deparar com a mudança de treinador. Ninguém nos deu qualquer tipo de explicação sobre essa situação, e acabou por vir o mister António Conceição, que acabou por dar sequência àquilo que estava praticamente garantido quase desde o início da época. Mas, lá está, éramos de longe a melhor equipa daquele campeonato.

    Bola na Rede: Depois, também na II Liga, ainda tenta subir com o Desportivo Chaves, mas, desta vez, não conseguiu… 

    Miguelito: Não subimos de divisão a 30 segundos do final do campeonato… O desfecho ficou decidido noutro jogo. Mas o futebol é assim mesmo. Num momento estás na I Liga e, segundos depois, já não. Era mais um feito que iria conseguir – seria a minha terceira subida de divisão e, possivelmente, sagrar-me-ia novamente campeão da II Liga, o que ainda é mais difícil. Infelizmente, acabou por não acontecer.

    Bola na Rede: Um ano mais tarde, com 35 anos, o Miguelito vai para o Tirsense, já no Campeonato de Portugal… E é aí que termina a sua carreira, em 2016. Tinha-me dito que, por esta altura, já tinha pensado em deixar de jogar. Para alguns jogadores este processo é mais complicado, para outros nem tanto… E como foi para si deixar os relvados?

    Miguelito: Vou para o Tirsense, mas sempre disse ao Carlos Gonçalves e aos meus familiares que só queria jogar até aos 35 anos. Era essa a minha meta. A partir daquela altura iria sempre tentar perceber como estava o meu corpo e, de facto, constatei, ao longo da época, que o melhor era mesmo terminar a carreira naquele momento. Terminei com a idade com que sempre tinha sonhado, com capacidade de jogar mais uns anos, talvez não ao nível da I Liga, mas penso que na II Liga ainda teria capacidade para jogar. Mas a verdade é que nesses últimos anos, desde que vim do Chipre, comecei a sentir alguma reticência dos clubes em contratarem-me devido à idade. Então, como já era uma coisa pensada poder desemprenhar as funções que estou hoje a desempenhar, decidi terminar a carreira. E como já estava interiorizado que, no final dessa época, no Tirsense, terminaria a carreira, foi menos doloroso do que seria, por exemplo, se nenhum clube me quisesse e isso tivesse precipitado essa decisão…

    Bola na Rede: O facto de ter outro objetivo, certamente, também ajudou. Normalmente é esse vazio que se segue à carreira que, por vezes, custa aos jogadores…

    Miguelito: Sim, também ajudou. É por isso que este problema – “o que vão fazer os jogadores no final das carreiras?” – se tem vindo a debater. A verdade é que, por vezes, os atletas só se começam a mentalizar que a carreira está a chegar ao fim a partir dos 30 anos. É importante começar a precaver esse final mais cedo, e eu, como tinha sempre isso em mente, como isto é algo que gosto de fazer, sabia que podia deixar de jogar de um dia para o outro, sabia que um dia estaria aqui, a trabalhar com o Carlos Gonçalves.

    Bola na Rede: E que balanço faz da sua carreira? Pela nossa conversa vejo o Miguelito orgulhoso e satisfeito pelo seu percurso. Mas ficou algo por conquistar?

    Miguelito: Estou bastante orgulhoso pelo meu percurso, por aquilo que fiz e conquistei. Estou muito feliz e agradecido pelas oportunidades que me foram sendo dadas ao longo da minha carreira, pelas direções, pelos treinadores… Ficaram algumas coisas por fazer, nomeadamente, chegar à equipa principal da seleção nacional ou jogar mais anos fora do país. Mas só tenho de ficar contente com a carreira que construí, orgulhoso também, porque, naquela altura, já era difícil ser jogador profissional, então fazer a carreira que fiz… Só tenho de estar orgulhoso e satisfeito.

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    João Amaral Santos
    João Amaral Santoshttp://www.bolanarede.pt
    O João já nasceu apaixonado por desporto. Depois, veio a escrita – onde encontra o seu lugar feliz. Embora apaixonado por futebol, a natureza tosca dos seus pés cedo o convenceu a jogar ao teclado. Ex-jogador de andebol, é jornalista desde 2002 (de jornal e rádio) e adora (tentar) contar uma boa história envolvendo os verdadeiros protagonistas. Adora viajar, literatura e cinema. E anseia pelo regresso da Académica à 1.ª divisão..                                                                                                                                                 O João não escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.