«Quis regressar ao FC Porto, mas não estavam dispostos a isso» – Entrevista BnR com Derlei

    -Da saída conturbada do FC Porto ao regresso a Portugal ao serviço dos rivais da Segunda Circular-

    “Quando eu pedi para regressar a Portugal, a minha intenção era regressar ao FC Porto”

    BnR: Pelo FC Porto ainda vences a Taça Intercontinental antes de rumares ao Dínamo de Moscovo. Hoje em dia, ainda guardas alguma mágoa com Victor Fernandez por teres saído do FC Porto daquela forma?

    D: Eu nunca guardei mágoa de ninguém na minha vida. É como eu falei: você toma as decisões e as consequências vêm no futuro. Tenho muito respeito pelo SL Benfica que foi campeão nacional naquela temporada, mas se algumas abordagens ao nível do balneário do FC Porto tivessem sido diferentes, com certeza que o FC Porto teria sido campeão nacional. Se não me engano, nesse ano o FC Porto trocou três vezes de treinador. Perdeu-se o título porque, na minha modesta opinião, as coisas estavam mal geridas dentro da equipa. Se o treinador, tivesse consertado esses erros logo no princípio, com certeza a equipa teria sido campeã nacional.

    BnR: Gostavas de ter tido mais apoio do Presidente?

    D: Na verdade o Presidente não pôde fazer nada. O Presidente sempre me apoiou desde o primeiro dia que cheguei até ao último dia que saí. A própria direção do FC Porto nunca foi contra o Derlei, pelo contrário, sempre me apoiaram. Mas pela forma como eles dirigem o clube e sabem que em primeiro lugar está a instituição, eles respeitaram a decisão do treinador, porque ele também tem essa autoridade. Eu converse e falei: “Desculpe, mas com esse treinador eu não vou trabalhar mais. Eu não tenho futuro no clube enquanto ele estiver aqui”. A decisão de sair partiu da minha pessoa porque eu sabia que se eu ficasse ali, eu ia causar um mal-estar dentro do plantel. A partir do momento em que ele me afasta, me acusando de uma coisa que eu não fiz, em que eu tive que acatar isso e depois de quatro/cinco dias me envia um recado a dizer que eu podia treinar novamente e que eu poderia ser útil no fim de semana, talvez até ele tenha percebido que tinha sido injusto, mas eu já tinha tomado a decisão de que não trabalharia mais daquela forma porque eu não sou desleal com ninguém.

    BnR: Terias terminado a carreira no FC Porto?

    D: Com certeza. Na verdade, eu quis sair do Dínamo no segundo ano porque eu percebi que na metade da segunda época as coisas tinham ficado difíceis para a equipa se fortalecer, pelo contrário, a equipa estava enfraquecendo. Também já existiam alguns problemas na parte da direção porque o Fedorychev, que era o dono maioritário do clube, já estava pensando em vender o clube novamente. Quando eu pedi para regressar a Portugal, a minha intenção era regressar ao FC Porto. A primeira opção era voltar para o FC Porto, mas naquela altura o FC Porto tinha um ataque muito forte com o Lisandro Lopez e em vez de contratar avançados o FC Porto estava vendendo. Quis regressar ao FC Porto, mas não estavam dispostos a isso, em contratar um jogador como eu, até pelas questões salariais e pelo que eu poderia produzir dentro um plantel que já estava formado e bem preenchido. Já com o SL Benfica na altura, o Fernando Santos precisava de reforçar com avançados porque o Miccoli vinha sofrendo com muitas lesões e eu fui para lá. Infelizmente as coisas não correram totalmente do jeito que eu imaginava.

    BnR: Apesar de na altura da tua saída do FC Porto já estares perto dos 30 anos, nunca tiveste uma proposta de um grande clube europeu depois de teres vencido a Taça UEFA e a Liga dos Campeões?

    D: Se eu quisesse sair do FC Porto, principalmente no início da época, tinha propostas de outros clubes de dimensões maiores. Porém, o que aconteceu naquele momento é que ninguém colocava em questão o Derlei sair do FC Porto. O que aconteceu foi que o treinador criou uma situação dentro do clube onde eu me senti lesado e falei para o Jorge Mendes e para o Presidente que não queria mais ficar. Na altura surgiu o Corinthians, mas a minha esposa disse que não era o momento de voltar para o Brasil. Depois o Jorge falou que o Fedorychev estava criando uma super-equipa na Rússia na altura em que estava abrindo a janela do mercado. Tanto que, quando o Jorge falou com o Presidente que eu queria sair, o Presidente falou: “Não, ele não vai sair. Nesta altura o clube não quer vender ninguém, só no final da temporada”. Mas eu falei “Presidente, eu quero sair. Não posso ficar, nem treinar com esse treinador”. O treinador me acusou de uma situação que eu não causei e que eu não fiz. Não é por causa de um treinador que se troca de jogador, é mais fácil que um jogador saia e então foram abertas as portas para que eu pudesse sair e pela situação eu queria sair o mais rápido possível, para não alimentar especulações dentro do clube.

    BnR: Reencontras o Nuno Espírito Santo em Moscovo. Porque é que ele foi o “tipo mais inteligente” com quem te cruzaste no futebol?

    D: O Nuno, intelectualmente falando, era muito evoluído. Gosta de ler muito, presta muita atenção nas coisas. Ele sempre foi um atleta muito diferente. Ele trabalhava e treinava muito para aqueles momentos em que o Vítor Baía não ia jogar, tanto que ele passou muito tempo na reserva do Baía. Ele sabia muitas vezes que não ia jogar e aproveitava esse tempo para estudar e desenvolver alguma coisa. Antes de ele terminar a carreira como atleta, o Nuno já pensava no que ia fazer no futuro. Via-se que ele podia se transformar, tanto num grande dirigente, como num grande agente, algo ligado ao futebol, tal como tem sido agora um grande treinador.

    BnR: Estavas a ter um bom desempenho na Rússia com 24 golos em duas épocas. Na segunda época és o segundo melhor marcador do campeonato e por isso foi uma surpresa quando regressas a Portugal para o…Benfica. Porquê voltar a Portugal e porquê o Benfica?

    D: Tive dois anos maravilhosos na Rússia a nível individual. Quando fui de férias sabia que, num futuro próximo, o Dínamo já não seria como era a nível de administração. Conversei com o meu empresário e falei: “Jorge quero voltar a jogar a Champions League e campeonatos europeus”. O Fedorychev entendeu e até me fez uma proposta para jogar na Suíça, que ele tinha lá investimentos. Mas eu gostava era de ir para Portugal e o Jorge falou com o Presidente do SL Benfica, que falou com o Fernando Santos e ele disse que me queria. O problema foi o timing, porque se fosse logo depois que eu saí da Rússia, eu vinha treinar para Portugal até ser inscrito. Então eu fiquei três meses sem jogar e a situação com o Benfica foi fechada na segunda metade do mês de janeiro. Basicamente eu iniciei a competição fazendo uma pré-temporada enquanto todos estavam a 200% e isso prejudicou bastante o meu desempenho e fiquei triste por não poder colaborar mais com a equipa, mas feliz por os companheiros que encontrei lá e pela forma como o clube me recebeu. Até hoje, tenho um respeito muito grande pelo Presidente e pelas pessoas.

    BnR: Na época seguinte segue-se o Sporting CP. Foi para ti uma questão de orgulho ferido regressar uma vez mais a Portugal para de alguma forma corrigir a prestação mais apagada que tiveste no SL Benfica?

    D: Não, até porque eu nem imaginava que o Sporting CP estaria interessado pelo meu desempenho nos últimos meses no SL Benfica, que realmente não foi uma prestação ao nível do Derlei. Quando surgiu o interesse do Sporting CP eu fiquei contente porque eu também não iria ter de mudar de cidade e eu já estava em Lisboa com a minha família. Nós até já estávamos com o pensamento de que iriamos sair novamente de Portugal e possivelmente, não com 100% de certeza, o destino era Espanha ou Itália. Fui para o Sporting CP e aí já iniciei desde o princípio e fiz uma boa pré-temporada. Infelizmente veio outra lesão grave e eu dei pouco nessa temporada. Mas foram dois anos importantes em que pude ajudar na conquista de duas supertaças e uma taça.

    BnR: Na tua segunda época até ficam muito perto do título, apenas a quatro pontos do FC Porto.

    D: Infelizmente o Sporting CP, financeiramente, não tinha capacidade para brigar com o FC Porto e o SL Benfica para que pudesse reforçar um pouco mais o plantel em momentos decisivos, sobretudo jogadores mais experientes, porque a equipa era formada por miúdos. Por exemplo, no segundo ano, na temporada 2008/09, houve um período que fomos de férias de Natal e quando parou o campeonato nós estávamos a um ou dois pontos do FC Porto. Quando voltamos das férias de Natal, se vencêssemos um jogo na Madeira, nós passaríamos para a frente do campeonato e na altura eu conversei com o plantel: “Se nós vencermos os cinco próximos jogos que temos neste reinício, com certeza que vamos embalar e vamos ser campeões nesta época”, mas infelizmente a equipa vacilou e o FC Porto continuou na liderança.

    (Bis de Derlei pelo Sporting CP frente ao FC Porto: Golos 8:50 e 10:45) 

    BnR: Na altura falou-se que os adeptos do Sporting criaram uma petição para que ficasses pelo menos mais uma época. Porque é que quiseste regressar ao Brasil?

    D: Nessa altura a minha decisão era encerrar a carreira, não era de voltar ao Brasil para jogar futebol. Pelo que via no Sporting CP, dificilmente iriam montar uma equipa mais forte do que a que tinha para poder brigar por títulos. Já tinha falado com o Paulo Bento em relação a isso também e eles vinham-me tentando convencer. Mas eu já estava preparado para deixar de jogar futebol e já tinha falado com a minha família para voltarmos ao Brasil, principalmente pelos familiares que estavam aqui. Quanto à petição, eu não tinha forma de agradecer aos adeptos todo o carinho e a força que me deram durante a recuperação.

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    Nélson Mota
    Nélson Motahttp://www.bolanarede.pt
    O Nélson é estudante de Ciências da Comunicação. Jogou futebol de formação e chegou até a ter uma breve passagem pelos quadros do Futebol Clube do Porto. Foi através das longas palestras do seu pai sobre como posicionar-se dentro de campo que se interessou pela parte técnica e tática do desporto rei. Numa fase da sua vida, sonhou ser treinador de futebol e, apesar de ainda ter esse bichinho presente, a verdade é que não arriscou e preferiu focar-se no seu curso. Partilhando o gosto pelo futebol com o da escrita, tem agora a oportunidade de conciliar ambas as paixões e tentar alcançar o seu sonho de trabalhar profissionalmente como Jornalista Desportivo.