«Se outros treinadores cometessem os erros que Jorge Jesus já cometeu, já estariam na rua» – Entrevista BnR com Carlos Azenha

Bola na Rede: Já referiste que és um treinador de projetos, que não colocas de parte a hipótese de voltares a ser treinador adjunto. Mas quando se dá o passo para treinador principal torna-se depois mais difícil dar esse passo atrás ou não? Nesse ano no Vitória Setúbal, o Carlos Azenha ainda não estava preparado para assumir o cargo de treinador principal ou era o Vitória de Setúbal que não estava preparado para o Carlos Azenha?

Carlos Azenha: Acho que o Carlos Azenha cometeu dois erros graves. O primeiro foi não ter saído antes do campeonato começar e o segundo foi não ter saído depois de termos feito um bom jogo contra o Vitória de Guimarães, em casa, no primeiro jogo desse campeonato. Empatámos [0-0]. Devia ter saído logo, mas os adjuntos chatearam-me a cabeça, disseram-me que depois de tudo o que tínhamos feito agora só podíamos melhorar e crescer. Mas depois tens uma direção contra, um diretor desportivo [Paulo Grencho] que boicotava. Quer dizer, o clube não tinha dinheiro nem para o gelo, quanto mais para as outras coisas. O massagista saiu antes do campeonato começar. É um grande erro meu. Apanho um clube de rastos. A seguir a mim foram vários treinadores. Foi o Quim, que não conseguiu, o Manuel Fernandes, que também não conseguiu. Mas facilmente se “bateu” no elo mais fraco, que era eu. No ano a seguir, vou para o Portimonense, com toda a gente contra a minha entrada. Devo ter sido o único treinador da história do futebol que chega a um clube, o jogo ainda não tinha começado e já está a ver lenços brancos na bancada. 

Bola na Rede: Porque é que achas que esse ambiente se instalou em relação a ti?

Carlos Azenha: Porque o Vitória de Setúbal fez questão de passar um conjunto de imagens. Quando se perde por 8-1 passa-se a imagem do flop. Mas, lá está, foi uma aprendizagem. A minha base de dados, até essa altura, só visava determinado tipo de jogadores que o Vitória de Setúbal não tinha capacidade de contratar. E pensava que ia encontrar um clube bem organizado e estruturado. Para meu espanto, nada, zero. E depois o clube sem dinheiro, os empresários a quererem pôr lá jogadores, com o diretor desportivo vinha tudo e mais alguma coisa… E aqueles que eu queria (pausa). E mesmo assim ainda fui buscar alguns que depois vieram a dar jogadores e que ninguém conhecia: o Rui Fonte fui buscá-lo. O Hélder Barbosa foi lá que o lançámos. O guarda-redes, o [Mário] Felgueiras também. O [Ruben] Lima, lateral esquerdo, que joga no Belenenses, também ninguém o conhecia e fui buscá-lo para lá. Fui buscar uma equipa de meninos. Voltava a fazê-lo? Não, não voltava. Isso custou-me muito. Nesse ano, levo essa “porrada” e vou para Portimão e vivo esta experiência, que me fortaleceu bastante.

Bola na Rede: Mas em Portimão as coisas acabaram também por não correr bem…

Carlos Azenha: Eu quando chego a Portimão, é uma aposta do presidente do Portimonense, Fernando Rocha, que acredita em mim e quer que eu vá para lá. E chego a Portimão com toda a gente contra: o diretor desportivo, o departamento médico, o diretor técnico, a rouparia, toda a gente contra. E os adeptos, claro. A “campanha” tinha sido feita. Temos os primeiros três ou quatro jogos com azares. Primeiro jogo, curiosamente, contra o Vitória de Setúbal. Na véspera do jogo, o meu central titular fratura o pé. Entra um miúdo, que acaba por fazer dois penáltis. Depois, o Ventura, que era um grande-redes excecional, sofre um golo do meio-campo, escorregou… Epá, esses azares que acontecem. Sofro quatro derrotas, toda a gente contra. Estava a jogar no Estádio do Algarve e regressamos ao estádio em Portimão. Começo a embalar, ganho, ganho, ganho… E pouca gente diz isto: se contassem só os meus jogos em Portimão tínhamos ficado em quinto lugar, Ok? E aconteceu uma coisa que, para mim, valeu por todos os lugares esse ano. Descemos de divisão, na penúltima jornada, em casa, mas com o estádio de pé a bater palmas ao Carlos Azenha. Os mesmos adeptos que me diziam “não” estavam lá a bater palmas. E mesmo as pessoas que não me queriam lá, hoje são aquelas que mais defendem o meu nome como profissional. Desde o diretor desportivo [Amílcar] Delgado, desde o José Manuel massagista, desde o José Rebelo chefe do departamento de futebol, desde o [António] Silveira vice-presidente para o futebol. Portanto, significa que chegaste lá. E os jogadores? Eu costumo dizer: quem sabe avaliar a competência dos treinadores são os jogadores. Porque são esses que têm termos de comparação. São eles que trabalham com vários níveis de treinadores. Eu disse-o sempre: dos jogadores com quem trabalhei ao longo da minha carreira, se houver 5% que digam que sou incompetente, devolvo o meu ordenado. Gostava de saber se há muitas pessoas nas suas profissões que podem dizer o mesmo.

Bola na Rede: Apesar da despromoção, fazes um balanço positivo da passagem por Portimão. Essa também foi, talvez, a primeira oportunidade “a sério” que tiveste para mostrar o teu valor como treinador principal.

Carlos Azenha: Claro. Não posso é entrar em projetos que têm, à partida, não sei quantos pontos negativos. Só não chegamos ao último jogo do campeonato com oportunidade de ficarmos na 1.ª divisão – e garanto que tínhamos conseguido ficar – porque o Sporting perde estranhamente em casa frente ao Vitória de Setúbal.

Bola na Rede: Esse “estranhamente” soou-me algo sarcástico…

Carlos Azenha: É “estranhamente”. Para mim, é “estranhamente” mesmo.

Bola na Rede: Depois dessa experiência sais de Portugal…

Carlos Azenha: Tive várias hipóteses de continuar em Portugal, mas tive a oportunidade de ir para os Emirados Árabes Unidos. O projeto era bom, financeiramente era bom, e era uma coisa que queria fazer, que era treinar fora. E fui para o Al Sharjah.

Bola na Rede: Mas saíste logo?

Carlos Azenha: Não correu lá muito bem. Nem sequer cheguei a fazer o primeiro jogo, que era contra a equipa treinada pelo Diego Maradona. Gostava muito de o ter feito, mas, infelizmente, um familiar próximo contraiu uma doença grave e que me obrigou a regressar a Portugal.

Bola na Rede: E ainda regressas a Portimão…

Carlos Azenha: Regresso a Portimão, num projeto já diferente. Mas depois até fui eu que pedi para sair, porque há alguns princípios dos quais não abdico e que tem a ver com as equipas que lidero. E ali havia a obrigatoriedade por parte do investidor principal [Theodoro Fonseca] de o filho [Theo Ryuki] ser convocado e de jogar… Nessa altura achei por bem que mais valia sair do que ficar. E saí a bem com as pessoas, sem qualquer problema. Mas é um clube maravilhoso. Às vezes, os presidentes se estiveram mal assessorados cometem erros graves que não deviam cometer. Mas depende sempre dos assessores que têm, da forma como a informação lhes chega e dos canais pelas quais ela chega. E, depois, quando temos alguma independência e liberdade para pensar e dizer… Repara, mesmo quando comentei na televisão sempre disse o que pensava e achava. Inclusive, telefonam-me para comentar, não há uma televisão que possa dizer que fui eu que fiz telefonemas para lá ir. Felizmente, fui sempre convidado e sou muitas vezes convidado, mas nem quero ir.

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João Amaral Santos
João Amaral Santoshttp://www.bolanarede.pt
O João já nasceu apaixonado por desporto. Depois, veio a escrita – onde encontra o seu lugar feliz. Embora apaixonado por futebol, a natureza tosca dos seus pés cedo o convenceu a jogar ao teclado. Ex-jogador de andebol, é jornalista desde 2002 (de jornal e rádio) e adora (tentar) contar uma boa história envolvendo os verdadeiros protagonistas. Adora viajar, literatura e cinema. E anseia pelo regresso da Académica à 1.ª divisão..                                                                                                                                                 O João não escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

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