Escolha-se o amor

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    Nenhum mortal conhecerá o sentido da vida, e se o conhecer das duas uma: ou tê-lo-á bem escondido ou o divulgou para um número restrito de pessoas que não passaram a mensagem ao resto do mundo. Por medo, posso especular. É que, caso o descobríssemos, provavelmente não nos entregaríamos à luta diária de nos vermos (ainda) mais felizes e de construírmos um futuro (ainda mais) risonho, talvez não nos afectassem imagens de pessoas menos afortunadas que nós, nem nos motivariam as notícias que falam do sucesso de gente que partira do mesmo patamar que o nosso. Se fôssemos “spoilados” relativamente ao sentido da vida, talvez não estivéssemos tão gratos pela vida que levamos, e talvez não lutássemos tanto para ter algo que ainda não temos por achar que não valia a pena.

    A garra, o afinco e a determinação dos outros deixaria de ser uma inspiração. E talvez não estivéssemos esperançosos em converter o “impossível” num acontecimento improvável. Livros, filmes, músicas e outras demonstrações da vida real deixariam de criar a ilusão de que podemos chegar onde quisermos caso tenhamos a persistência de acreditar nos sonhos que fomos criando ao longo da nossa vida.

    Provavelmente deixaria de haver amor. Não só o maior combustível do ânimo, da persistência, da luta por atingir o inatingível como também “o” factor imprescindível nos feitos heróicos que foram conseguidos ao longo da história, desde a Batalha de Aljubarrota à Revolução dos Cravos. O amor à pátria prevaleceu, e histórias destas nunca serão contadas nem realçadas em demasia. Histórias de adversidades vencidas e impossibilidades desfeitas que nos inspiram a confiar no amor.

    Elas continuam a existir. Seja qual for o ramo em que estejamos. O desporto, sem excepção. Esta semana foi rica em histórias destas. Do amor (com toda a garra, determinação e querer que lhe estão adjacentes) à camisola e à glória a sobrepôr-se e a ridicularizar aquilo que é tido como impossível.

    Só assim se explica que uma equipa como o Schalke 04 (5ª classificada na Liga Alemã e com poucos recursos comparativamente ao seu adversário), perdida a primeira mão da eliminatória da Liga dos Campeões, em casa, por 2-0, para o Real Madrid, possa ter ido ao reduto do campeão europeu vencer por 4-3. Huntelaar, Meyer, Fuchs e companhia não desanimaram e enfrentaram as “improbabilidades”, os grandes nomes que contra eles jogavam, e fizeram sofrer os merengues. Não se apuraram para os quartos-de-final, é certo, mas noutras circunstâncias, provavelmente, nem se atreveriam a discutir o jogo. Quando o fizeram, venceram-no

    O amor à camisola e à glória também é a única explicação que vejo como plausível para a exibição do PSG em Londres. Os franceses chegaram à Velha Albion depois de uma igualdade a uma bola em Paris. Entraram à procura de um golo que desfizesse a desvantagem provocada pelo golo que o adversário apontara fora, mas foram sendo travados por um conjunto de adversidades: aos 30 minutos de jogo tinham o seu melhor jogador expulso, aos 83 estavam a perder por 1-0. A esperança parecia cair, as probabilidades de sucesso eram ínfimas, mas os jogadores agarraram-se a elas e conseguiram empatar e levar o jogo para prolongamento. Durante esta fase, a lógica ditaria que o cansaço de jogar contra mais um “consumisse” os franceses. As coisas começaram por correr mal, com um penalty consentido aos 96 minutos. As probabilidades voltavam a estar nas dízimas percentuais.

    As lágrimas de alegria de Thiago Silva como ilustração da vitória da emoção sobre a razão Fonte: Facebook do PSG
    As lágrimas de alegria de Thiago Silva como ilustração da vitória da emoção sobre a razão
    Fonte: Facebook do PSG

    Faltavam 14 minutos para acabar a eliminatória e os jogadores acusavam, no corpo, o desgaste da intensidade do jogo. Na mente, porém, em nome do amor à profissão e à glória, não lhes passava pela cabeça outra coisa que não ir à procura do golo que colocasse a equipa em vantagem e a apurasse para os quartos-de-final da Liga dos Campeões, esquecendo quaisquer adversidades pelas quais passassem… e assim conseguiram. 116 minutos. Thiago Silva cabeceia para o ar, a bola percorre parte da àrea e vai “morrer” nas redes de Thibaut Courtois. 2-2, o Paris Saint Germain estava pela primeira vez, quando menos se esperava, na frente da eliminatória. E assim ficou.

    A paixão, a garra, a luta, a determinação prevaleceu sobre a lógica que muitas vezes nos desanima. Um feito heróico a demonstrar que vale a pena sonhar alto. E outro a mostrar que o que, como dizia um certo prémio nobel português, “o que importa é a viagem” e não o seu destino (ou a vida e o sentido dela).

    Que vale a pena escolher-se o amor sobre a razão.

    Foto de Capa: Facebook do PSG

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