Sempre que se chega ao mês de dezembro, sobretudo aos últimos dias do mês, já se sabe o que aí vem: futebol espetáculo em Inglaterra e…queixas dos treinadores das equipas inglesas. Já é tão recorrente, que merece uma reflexão objetiva e pragmática.
Se o “Boxing Day” e o dia 1 de janeiro com futebol inglês são eventos deliciosos na perspetiva dos fãs da Premier League, para os intervenientes diretos já é uma situação menos confortável, mas, curiosamente, quem demonstra mais frustração com o calendário apertado (entre 26 de dezembro e 1 de janeiro, houve uma outra jornada inteira) são sempre os treinadores.
Os técnicos são quem mais se queixam, nem tanto os atletas, o que levanta a questão: serão justificáveis as lamúrias dos treinadores?
O que me parece, é que o futebol inglês tem um ADN próprio e segue um propósito que todos dizem seguir, mas que só a federação inglesa segue realmente. Esse propósito é, precisamente, servir o espetador, o fã. Olham para o futebol como entretenimento e, portanto, as datas seguintes a festas familiares, como o natal ou a passagem de ano, são datas obrigatórias para haver futebol.
Esta época até se mudou um pouco discurso, mas só mudaram as palavras, porque a mensagem era a mesma: “são jogos a mais”. Esta época o alvo foi a jornada entre as datas festivas. Se realmente essa jornada até poderia ser evitada, mantendo as partidas de dia 26 de dezembro e de dia 1 de janeiro, por outro lado, também se percebe o porquê de permanecer no calendário, apesar de toda a pressão existente. O “Boxing Day” e a jornada de dia 1 de janeiro são um extra, uma altura do ano onde é para haver mais futebol e não para retirar absolutamente nada, nem a jornada habitual ao fim de semana.
Ou seja, retirar a jornada do fim de semana, para proteger os atletas seria, aos olhos da federação inglesa, ir contra os seus próprios ideais. Outra questão é se os treinadores estão realmente preocupados com a resposta física ou ameaça de lesão dos seus jogadores ou se estão receosos de terem de mexer no seus onze-base, arriscando uma eventual perda de pontos.
É uma questão legítima. Os plantéis são compostos por mais de vinte e dois jogadores, o que dá para formar duas equipas titulares e ainda deixar alguns de fora. Se existe um risco tão grande de lesão devido ao cansaço, porque não rodar mais as equipas? A verdade é que isso raramente acontece.
Basta olhar para o super líder desta temporada, o Liverpool FC. Klopp, um dos mais queixosos, até porque é campeão da Europa e, portanto, disputou o Mundial de Clubes este mês, acabou por utilizar van Dijk, Salah, Mané e Firmino, os quatro ativos mais importantes e valiosos, nos três jogos que tiveram entre dia 26 de dezembro e 2 de janeiro. Ou seja, esta equipa não tem suplentes? E mesmo que não tivesse, não terá também a equipa sub23, que, por exemplo, “alimentou” a equipa principal com um super-craque como Alexander Arnold? Quantos mais estarão à espera da sua oportunidade para explodirem?
Esta reflexão faz-me chegar a uma conclusão muito simples: existe muito hipocrisia quando existem estas “queixinhas” à volta do calendário da Premier League. Se a preocupação fosse verdadeira, os atletas não jogariam de certeza. A única coisa que preocupa os treinadores, é uma quebra de forma e um cansaço natural que obrigue a mudar as peças do xadrez, numa altura em que se discutem nove pontos em poucos dias.
A verdade é que o futebol inglês tem uma magia natural e quem se adapta melhor a ela, será o grande vencedor.
Foto de Capa: Liverpool FC