O incrível caminho do Luton Town FC até à Premier League

    Luton Town Football Club garantiu no passado dia 27 de maio a subida ao mais alto patamar do futebol inglês. Foi no mítico Wembley, perante os seus 37 mil adeptos, que o clube do sul de Inglaterra venceu o Coventry City nas grandes penalidades, juntando-se assim a Burnley e a Sheffield United. Mas esta autêntica epopeia vivida pelos Hatters começa antes, muito antes.

    Em janeiro de 1885, numa reunião secreta, o “Luton Wanderers” passa a chamar-se “Luton Town”. E embora houvesse a necessidade de existir um clube de Luton que tivesse “Town” no nome, às gentes daquela terra não lhes caía bem o facto dessa decisão ter sido tomada com tanto secretismo. Organizou-se, portanto, uma reunião na câmara municipal de Luton, em abril de 1885, para que se oficializasse o nome do clube. Assim nascia o Luton Town FC, aquele que se diz ser o clube mais antigo do sul de Inglaterra.

    Em 1890 os Hatters passavam a ser o primeiro clube profissional do sul de Inglaterra, começando por pagar a apenas três jogadores. No ano seguinte já todo o plantel recebia. Em 1894 tornavam-se membros fundadores da Southern League, e em 1897 juntavam-se à Football League Division

    Para o Luton, os anos entre 1900 e 1946, assim como para muitas outras equipas inglesas, caracterizaram-se por duas coisas: a subida e descida de divisões, onde passaram pela Division Three da Football League (antiga Southern League) e pela Division Two; e pelas grandes guerras mundiais (a segunda começou quando estavam prestes a subir para a Division One, atual Premier League). As guerras mundiais destruíram a estrutura organizacional e financeira de vários clubes (além das consequências muito mais graves causadas e que nada têm a ver com futebol ou desporto).

    Seguiram-se anos de muita instabilidade e onde o clube funcionou um pouco como um “elevador”, subindo e descendo divisões sempre à procura de se afirmar no topo do futebol inglês. Pelo meio destaca-se a subida à Division One em 1954/55 (estadia que não durou muito tempo) e a chegada à final da histórica FA Cup, onde os Hatters defrontaram o todo-poderoso Nottingham Forest. Vitória dos Tricky Trees por 2-1.

    Os anos de instabilidade continuaram e só em 1973/74 o clube do sul de Inglaterra conquista a subida à Division One… para descer logo na temporada seguinte. Até que em 1981/82 voltam novamente ao topo do futebol inglês e de 1985 a 1990 vivem a melhor fase da história do clube. Alcançam em 1988 o 7.º lugar da Division One (melhor registo de sempre do clube) e vencem nesse mesmo ano a Littlewoods Cup (atual Carabao Cup), em Wembley, frente ao gigante Arsenal, por 3-2, depois de terem estado a perder por 2-1, para delírio dos 35 mil Hatters presentes no estádio. No ano seguinte voltam à final, mas são derrotados, mais uma vez, pelo Nottingham Forest.

    Descem de divisão em 1992, mesmo antes da Division One se tornar a Premier League que hoje conhecemos, e em 1994/95 voltam a descer para a League One (antiga Division Three). Do céu ao inferno em três anos, um bocadinho aquilo que tem caracterizado o clube ao longo da sua história. De 1995 a 2007 as coisas não estavam muito famosas para o clube de Luton, mas nada fazia antever aquilo que se iria passar em 2008. O clube esteve perto da falência várias vezes, e a falta de condições para pagar o salário dos jogadores, assim como algumas irregularidades financeiras fizeram com que o clube começasse a temporada de 2008/09 na League Two (equivalente à 4.ª divisão)… com menos 30 pontos. Para que se perceba, uma semana antes da jornada inaugural, a equipa do sul de Inglaterra só tinha 6 jogadores inscritos. Os Hatters não resistiram e voltaram assim às ligas não profissionais, 89 anos depois. 

    Nos três anos que se seguiram o Luton conseguiu sempre alcançar os play-offs de subida, mas sempre sem sucesso. Duas vezes eliminado pelo York City, e outra pelo AFC Wimbledon. Em 2012/13, e apesar de terem feito história ao se tornarem na primeira equipa de um escalão não profissional a derrotar uma equipa da Premier League (1-0 frente ao Norwich na FA Cup), os maus resultados no campeonato ditaram o despedimento de Paul Buckle, e consequente contratação de John Still. Em 2013/14 dominaram a National League sagrando-se campeões, e começaram assim aquela que viria a ser uma das histórias mais bonitas do futebol inglês e mundial. Alcançaram o 8.º e 11.º lugares em 2014/15 e 2015/16, respetivamente, e em 2016/17, já com Nathan Jones ao comando da equipa chegaram aos play-offs. Derrota dura frente ao Blackpool, mas que serviu como rampa de lançamento para que em 2017/18 alcançassem a promoção para a League One. Competição que venceriam logo nesse ano (2018/19) garantindo a subida ao Championship. Em 5 anos, e depois de baterem bem lá no fundo do futebol inglês, os históricos do sul de Inglaterra voltavam a poder sonhar com a chegada à Premier League

    Em 2019/20 o Luton consegue a manutenção mesmo no limite, com Nathan Jones a voltar para salvar o clube na reta final da época (ele que tinha saído para o Stoke City). Em 2020/21 e já com os adeptos de volta ao estádio, a equipa mostra progressos e alcança um seguro 12.º lugar. Mas a manutenção não chegava para a população de Luton e para a estrutura do clube, o objetivo era apenas um: Subir à Premier League. Os comandados de Nathan Jones ficaram no 6.º lugar do campeonato, alcançando assim os play-offs. Seguia-se um duelo frente ao Huddersfield Town AFC. Depois de um empate a uma bola no mítico Kenilworth Road, os Hatters deslocavam-se a Huddersfield com a certeza de que apenas a vitória lhes interessava. O plano saiu ao lado e 1-0 para os homens da casa, ainda não era desta.

    Até que chegamos a 2022/23. Nathan Jones começa o campeonato de forma incrível e é convidado pelo Southampton em novembro para integrar o projeto dos Saints. O treinador galês aceita a oferta do clube da Premier League (casamento que não correu muito bem pois Jones foi despedido dois meses depois), e Rob Edwards assume então o comando técnico do Luton, alcançando o 3.º lugar no campeonato e consequente acesso aos play-offs. Calhou na rifa o Sunderland, histórico do futebol inglês que também está à procura de voltar aos seus dias de glória. Uma derrota em casa dos Black Cats (2-1) obrigava os Hatters a fazer um jogo perfeito em casa. E assim foi, num Kenilworth à pinha, os laranjas venceram 2-0, marcando assim lugar na final dos play-offs frente ao Coventry City. E tal como comecei este artigo, no passado dia 27 de maio, Coventry City e Luton Town encontraram-se em Wembley à procura do último bilhete que permitiria a subida de divisão. 1-1 nos 120 minutos de jogo corrido, seguiam-se as grandes penalidades. Os primeiros 5 batedores de cada equipa fizeram o que lhes competia: fazer as redes abanar. Seguia-se Dan Potts para os Hatters… golo! Respirava-se de alívio em Wembley. Todos os olhos postos em Dabo para o Coventry, o árbitro apita… bola para fora (!) e 37 mil Hatters eufóricos a gritarem pelo seu clube! Gritos de alívio, de felicidade, gritos de gente que viu o seu clube bater no fundo do poço, e que o vê agora a “tocar no céu”. O Luton Town de volta ao topo do futebol inglês 31 anos depois! Das ligas não profissionais à Premier League em 9 anos, nunca visto antes, uma história incrível.

    Depois de feito o resumo daquele que foi o trajeto do Luton desde a sua data de fundação até aos dias de hoje, e antes de passar a uma breve análise da equipa e dos jogadores que mais me despertam interesse, há que dar destaque a uma outra história, a de Pelly-Ruddock Mpanzu. O médio congolês de 29 anos é o primeiro jogador na história do futebol inglês a subir com a mesma equipa desde as ligas não profissionais até à Premier League. De uma forma resumida: Mpanzu chegou a Luton vindo de empréstimo do West Ham em 2013/14, conquistando desde logo o seu espaço, até que John Still, treinador na altura, fez dele uma prioridade e exigiu contar com o médio em definitivo, e assim foi. Hoje é o jogador com mais jogos realizados pelo clube e um dos maiores ídolos dos Hatters. Quando achamos que o futebol não nos pode surpreender mais…

    Luton Town de Rob Edwards é uma equipa que não apresenta muitos argumentos dentro de campo, mas que executa de forma brilhante os poucos que tem. A equipa apresenta-se por norma em 3-5-2, no papel. A atacar, os homens de Edwards, gostam de chegar à baliza adversária em poucos toques, usando muitas vezes a procura pela profundidade e as segundas bolas. Neste momento de jogo (ataque) o Luton apresenta-se praticamente num 3-2-5, com os “laterais” a darem o máximo de largura possível, um dos médios chega-se à frente fazendo um trio com os dois avançados, aumentando a probabilidade de vencer as segundas bolas, e os dois médios mais recuados chegam perto da linha de três centrais com o objetivo de libertar um deles para que possa esticar na frente, com propósito e intenção. Isto porque na frente estão Carlton Morris e Elijah Adebayo. O primeiro foi o 3.º melhor marcador do Championship com 20 golos (e 7 assistências, em 51 jogos), tem instinto de matador dentro da área, é muito forte no jogo aéreo, tem uma facilidade enorme em envolver-se com os colegas (marca e assiste) e dá muito trabalho aos defesas. O segundo, o meu predileto pessoalmente, é um portento físico (para que se perceba: tem 1,93m e pesa 89kg, dados: zerozero), mas o mais impressionante é a qualidade técnica e a relação com bola que possui, características que não são comuns a jogadores com a envergadura de Adebayo. É rápido, dominador no jogo aéreo, muito forte no um para um, e dificílimo de parar quando recebe a bola de costas para o defesa e depois consegue rodar sobre o mesmo, e tanto pode jogar como referência na frente como encostado à linha. A assistência que faz para o golo de Jordan Clark neste jogo decisivo frente ao Coventry é a melhor maneira de resumir o inglês. Um dos nomes a ter em conta na próxima época, certamente.

    Além dos dois avançados, há outros jogadores bastante interessantes. Do lado direito joga Cody Drameh, emprestado pelo Leeds (veremos se continua no plantel), muito rápido e seguro a defender, e do lado esquerdo Alfie Doughty, muito forte no momento ofensivo, mas com algumas dificuldades a defender, especialmente quando tem que fechar dentro. Além destes, destaco ainda Jordan Clark, médio experiente com muita chegada ao último terço e com facilidade em fazer golo e a assistir os colegas (4 golos e 4 assistências), e ainda Tom Lockyer, provavelmente o jogador mais experiente do plantel, 29 anos, capitão de equipa, internacional galês (esteve no campeonato do mundo). A defender: os Hatters variam entre o 5-3-2, com os laterias a baixar, ou o 4-4-2, com Drameh a baixar do lado direito, e com Alfie Doughty (mais dificuldades em fechar por dentro) a juntar-se aos três médios fazendo uma linha de 4. Ansioso para perceber com que postura o Luton se vai apresentar em 2023/24 e se vai conseguir fazer face à diferença orçamental que existe para as outras equipas do principal campeonato do mundo.

    Um clube que nasceu por teimosia da população na câmara municipal da sua cidade; que tem “Chapeleiros” como alcunha devido à ligação forte com essa indústria; em que a entrada visitante do seu estádio é feita quase literalmente pelo meio de casas e jardins alheios; que em 2008 estava a começar um campeonato com menos 30 pontos; e que nos últimos nove anos subiu das ligas não profissionais até ao topo do futebol inglês, trazendo consigo um jogador que percorreu todo este caminho ao lado do clube. Eu diria que é impossível não ficar fã deste clube e desta história. Obrigado, futebol, por nunca deixares de me surpreender.

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    Renato Alexandre Soares
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    O Renato é natural de Aveiro mas atualmente reside em Lisboa. Está, neste momento, a tirar uma licenciatura em Ciências da Comunicação no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. Tem no futebol a sua maior paixão, mas é um aficionado pelo mundo do desporto. Desde futebol até à Fórmula 1, passando pelo basquetebol e andebol, se for um desporto, tem lugar garantido na vida do aveirense.

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