Investidores no futebol brasileiro: um risco em nome da evolução

Em 2018, o Botafogo FR propôs um novo modelo administrativo para os clubes brasileiros. Uma sociedade anónima, que permitisse “melhorar a gestão financeira e aumentasse o grau de transparência”. Três anos depois, em junho de 2021, as SAF (Sociedade Anónima do Futebol) foram aprovadas por lei no Brasil e, esta temporada, já são muitos os clubes que começam a aproveitar esse modelo.

Traduzido por miúdos, as SAF são muito idênticas às SAD, que existem em Portugal. Por cá, começaram a ser implementadas no virar do século e têm tido tanto de útil como de polémico.

Há casos de sucesso, mas de um modo geral esse modelo financeiro é olhado com desconfiança no nosso país. Mais que um veículo para trazer mais e melhor investimento aos clubes, tem ganhado fama pelas ligações a empresários e fontes de financiamento pouco credíveis, bem como a negócios mais obscuros.

No Brasil, há uma grande expetativa para a evolução que o sistema pode trazer às equipas. Clubes como Botafogo ou CR Vasco da Gama já formaram as suas SAF, mas há outros interessados.

A consequência mais imediata e vistosa deste modelo é a entrada de capital. No Botafogo, por exemplo, o empresário norte-americano, John Textor, planeia investir cerca de 70 milhões de euros nos próximos três anos. Um valor considerável para a realidade do futebol “canarinho”.

Não é de todo anormal que um novo investidor entre com somas avultadas e projeções ambiciosas para o dinheiro que vai ‘injetar’. São propostas muito aliciantes para os clubes que atravessem dificuldades financeiras ou cuja gestão não esteja estruturada de acordo com a exigência do desporto moderno.

Não é preciso ser um ávido conhecedor do futebol brasileiro para saber que esse é um caso comum nas várias divisões. Também o é em Portugal e, fazendo a ponte atlântica entre os dois países, constatamos algo que pode preocupar os adeptos.

É que o modelo das SAD, hoje já muito comum no país, tem dado provas de ser adequado para os maiores clubes, mas perigoso para os mais pequenos. As instituições com mais dificuldades financeiras recorrem ao modelo das SAD para obter investimento rápido, mas acabam reféns dos próprios investidores ou de empresários.

Isto porque, como é sabido e tantas vezes discutido, essas entidades ficam com mais de 50% da sociedade. Simplesmente porque o clube não tem capacidade para negociar uma participação maior. Na prática, passam a ser os clubes que pertencem à SAD e não as SAD aos clubes.

Nos últimos anos, o Beira-Mar SC, o CD Aves ou o histórico CF Os Belenenses sofreram com este modelo e acabaram por descer aos escalões distritais, sem hipótese para contornar um futuro sombrio… criado pelas próprias SAD.

A fiscalização é fundamental e, preferencialmente, deveria ser aplicada a regra alemã dos 49+1, que determina que os investidores não podem ter mais do que 49,9% das participações dentro do clube.

O Brasil aparece no meio destas duas realidades. Por um lado, as equipas têm uma dimensão bem mais considerável, em comparação à realidade portuguesa. O país tem mais população e os clubes mais adeptos. Por outro lado, os problemas com a corrupção são ainda maiores e a capacidade para fiscalizar a ação destes novos investidores mais limitada.

Algumas instituições mais estruturadas, como o CR Flamengo, o SC Corinthians ou o SE Palmeiras, não se mostraram muito interessadas neste novo modelo. Para já, parecem ser os mais “medianos” a apostar em busca de crescimento e aproximação ao topo do futebol brasileiro e, quem sabe, sul-americano.

Só o tempo dirá se este modelo vai trazer evolução ao “Brasileirão” e se equipas como o Botafogo ou o Vasco vão conseguir chegar, ou voltar, aos tempos mais áureos, à boleia do investimento de terceiros. Há vantagens, mas também há perigos.

Vasco Borges
Vasco Borgeshttp://www.bolanarede.pt
Frequentador de estádios e consumidor de bifanas desde os 5, aprendeu cedo que é melhor a ver do que a jogar futebol. Aos 22, estuda Jornalismo e vai escrevendo sobre os jogos que valem o preço do bilhete e as estórias que só se ouvem no bar, ao intervalo.                                                                                                                                                 O Vasco escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

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