AFC Ajax: A melhor fase de um ciclo vicioso

    Anteriormente, escrevi um texto sobre o Ajax. Nesse artigo, disse: “Longe vão os tempos de Marco Van Basten, Frank Rijkaard e dos irmãos De Boer. Ainda mais longe está a era de Johan Cruyff e do «futebol total». Mas será que os adeptos do principal clube de Amesterdão ainda podem sonhar com um regresso à ribalta do futebol europeu? O panorama atual sugere que não”. Hoje, cinco dias depois de os holandeses carimbarem a sua passagem às meias finais da Liga Dos Campeões, o “panorama” de que falava parece estar ultrapassado. Ainda assim, há problemas – presentes e futuros – que se mantêm.

    Primeiro que tudo, há que dar os parabéns ao AFC Ajax. Porque o sucesso de que desfrutam agora é fruto de um trabalho muito difícil. Um trabalho que vem por ciclos. Continuando com os paralelismos com o artigo de 2018, nele também escrevi: “o Ajax descobre, desenvolve e vende”. Este modelo, utilizado nas últimas duas décadas pelo emblema de Amesterdão, já deu muitos desgostos aos adeptos, nomeadamente nas fases transitórias, como foi o caso da época passada. A venda de jogadores como Davinson Sànchez e Davy Klaasen deixara o Ajax numa posição complicada, com jovens como Mathijs De Ligt e Frenkie de Jong, ainda no pico da adolescência, a verem-se obrigados a assumir as rédeas do plantel. A campanha europeia foi longe de memorável, e no campeonato viram o rival PSV Eindhoven a conquistar facilmente o título.

    Mas, no meio da desilusão, os previamente referidos De Jong e De Ligt deram os seus primeiros passos no plantel principal. O mesmo sucedeu com Andre Onana e Donny Van De Beek. O clube percebeu que a época 2017/2018 teria, inevitavelmente, de ser sacrificada, para poder construir a fundação do que se vê hoje. David Neres, extremo brasileiro que brilhou na segunda mão dos oitavos de final contra o Real Madrid CF, foi contratado no verão de 2017 e foi outro jogador que, apesar de uma boa primeira campanha, só se ambientou verdadeiramente aos ares holandeses em 2018. As contratações de Daley Blind e Dusan Tadic, dois jogadores que passavam despercebidos na Premier League, revelaram-se golpes de génio. Por menos de 30 milhões, o Ajax ganhou experiência numa defesa ainda muito verde e magia num ataque que acabara de perder a pérola Justin Kluivert para a AS Roma.

    Segundo o Transfermarkt, esta foi apenas a segunda época nas últimas dez em que a balança comercial do emblema holandês foi negativa. Mas o clube soube quando e como gastar. A direção foi inteligente, soube reforçar-se e, mais importante que tudo, nunca abdicou dos seus princípios de jogo, que já vêm desde os tempos em que um tal de Johann Cruyff, que agora dá o nome ao estádio do Ajax, chegou ao clube. Erik Ten Hag, atual treinador, não mete apenas os seus jogadores a ganhar: mete-os a jogar bem. Contra Juventus FC e Real Madrid, não vimos uns miúdos acanhados, a tentar encontrar um contra ataque sortudo. Vimos homens a encarar o adversário de igual para igual, a arriscar em situações de um para um, a saber gerir a posse de bola e a procurar o golo sem reservas. De Ligt, que acabou o liceu há menos de um ano, não teve medo de subir à área e cabecear no meio de uma defesa com Giorgio Chiellini e Leonardo Bonnuci.

    Mas há que olhar para o fim do artigo escrito em fevereiro do ano passado para conhecer um lado mais negro deste ciclo de descobrir, desenvolver e vender. Em alusão à final da Liga Europa de 2017, que o AFC Ajax perdeu contra o Manchester United FC de José Mourinho, escrevi: “se a excelente campanha na edição passada da Liga Europa devolveu alguma esperança aos adeptos, ver alguns dos seus melhores jogadores dessa época serem caçados pelos tubarões deu aos fãs do clube um deprimente reality-check”.

    Este cenário, que corresponde à pior fase do ciclo, pode muito bem repetir-se na próxima época. Frenkie De Jong já tem acordo para rumar ao FC Barcelona neste verão e De Ligt é constantemente assediado pelos gigantes da Europa do futebol. O mesmo sucede com Van De Beek e mais três ou quatro elementos do Ajax. Assim, quem sabe o que estaremos a escrever sobre este clube no ano que vem.

    Ao que tudo indica, o ciclo irá repetir-se, mas um investimento cuidado na formação e na contratação de jogadores verdadeiramente importantes para o plantel pode salvar o emblema de Amesterdão. Mesmo que a Europa agradeça os talentos que a academia De Toekomst (“O Futuro”) produz, será certamente desapontante para os adeptos ver jogadores da casa a sair constantemente do seu clube, para brilhar lá fora.

    Foto de capa: Bola na Rede

    Artigo revisto por: Jorge Neves

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    Gonçalo Taborda
    Gonçalo Tabordahttp://www.bolanarede.pt
    O Gonçalo vem de Sacavém e está a tirar o curso de Jornalismo na Escola Superior de Comunicação Social. Afirma que tem duas paixões na vida: futebol e escrita. Mas só conseguia fazer uma delas como deve ser, por isso decidiu juntar-se ao Bola na Rede.                                                                                                                                                 O O Gonçalo escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.