Os 5 jogos do Mundial de Andebol que devem ser revistos

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    CABO VERDE VS URUGUAI: O JOGO DO APURAMENTO HISTÓRICO

    Cabo Verde e Uruguai entravam no grupo D da ronda preliminar do Mundial com um apuramento inédito para a “Main Round” à vista. Ambas as seleções estiveram no Egito, mas a campanha dos cabo-verdianos foi encurtada devido a um surto de COVID-19 na equipa. O Uruguai por sua vez não conseguiu qualquer vitória e chegou ao Mundial com intenções de alterar essa situação.

    A primeira partida era logo decisiva para as duas formações. Num grupo com Brasil e Suécia era mais do que previsível que fosse o jogo entre as duas seleções a fazer diferença no que à luta pelo 3º lugar diz respeito.

    Até foi o Uruguai que começou melhor, alcançando rapidamente uma vantagem de 1-3, muito por causa dos contra-ataques rápidos e eficácia da equipa “Celeste” em explorar a passividade na zona central do Cabo Verde. Os cabo-verdianos ainda foram tendo problemas para bater Filipe Gonzalez, guarda-redes uruguaio, apostando na criatividade de Elledy Semedo, do Benfica, e na colocação de Nélson Pina, dos Belenenses, que jogava na ponta direita.

    Cabo Verde aposta numa defesa assente no modelo 6-0 moderno, com o Uruguai por sua vez a seguir o modelo 5-1, mostrando do lado sul americano uma vontade de assumir o jogo. O conservadorismo de Cabo Verde veio a ser compensado com transações rápidas em contra-ataque com boas combinações entre Nélson Pina e Gualther Furtado. Nenhuma das seleções mostrava criatividade no que à construção do ataque dizia respeito mas a aposta nas transições e o talento individual dos jogadores cabo-verdianos traduziu-se numa superioridade africana.

    É um jogo que vale a pena rever por marcar o regresso de Cabo Verde ao Mundial e um dia histórico para o andebol do país, com os “Tubarões Azuis” treinados por Ljubomir Obradovic a garantir, praticamente, o apuramento inédito para a “Main Round” do Campeonato do Mundo. Furtado seria o homem do jogo com 6 golos apontados.

    DINAMARCA VS FRANÇA:  A GRANDE FINAL

    Não há muitos palcos maiores do que a final de um Campeonato do Mundo, seja em que modalidade for. A final da 28ª edição do Mundial de andebol colocou frente a frente duas equipas invictas, numa reedição da final olímpica de 2021: a França, campeã em Tóquio, e a Dinamarca, bicampeã do Mundo à procura de um inédito terceiro título consecutivo.

    O jogo disputou-se em Estocolmo e os dinamarqueses não tardaram a distanciar-se no jogo. A França precisou de cinco minutos para marcar o seu primeiro golo. Já a Dinamarca levava três remates certeiros. Um ataque muito fluído e criativo, com a formação nórdica a atacar tanto na marca dos 7 como dos 9 metros, usando apenas um pivô. A França defendia em 6-0, o que dificultou a adaptação da equipa gaulesa ao ataque da Dinamarca.

    Os dinamarqueses defendiam em 3-3, com apenas uma ligeira fraqueza na ponta esquerda, que a França teve dificuldades em aproveitar. Quando a defesa falhava, Niklas Landin tratava do assunto.  A dicotomia com o guarda-redes da França, Vincent Gérard acentuou a diferença entre as duas formações. Mesmo o suplente, Rémi Desbonnet não trouxe uma segurança tão grande à França como Landin à Dinamarca.

    Ainda assim, a França mostrou-se capaz de aproveitar um período ofensivamente menos prolífero por parte da Dinamarca para chegar ao intervalo apenas a perder por um golo, igualando a partida logo no início da segunda parte. A França tinha mudado para um estilo de jogo mais agressivo, a começar pela pressão defensiva com o recurso à formação 3-2-1.

    Contudo, os dinamarqueses foram capazes de estabilizar a defesa, mantendo-a fluída e aproveitaram o regresso dos gauleses à formação defensiva em 6-0 para tornar a aumentar a vantagem que foi sendo recorrentemente ameaçada pela França. A Dinamarca acabou por ganhar por 35-29, sendo superior a uma França que entrou pouco preparada para o estilo de jogo dinamarquês.

     Uma boa segunda parte de Nédim Rémili, Nicolas Tournat e Dika Mem não foi o suficiente para impedir a vitória dos dinamarqueses, que beneficiaram de uma performance igualmente estratosférica de Niklas Landin, Simon Pytlick e Rasmus Laugen (melhor marcador da final). A Dinamarca ganhou o Campeonato do Mundo e é a primeira seleção a sagrar-se tricampeã mundial de andebol.

    PAÍSES BAIXOS VS NORUEGA: NEERLANDESES CONFIRMAM A GRANDE FORMA

    O jogo entre Noruega e Países Baixos a contar para a 3ª jornada do grupo F da Ronda Preliminar chegou com as duas seleções já apuradas para a “Main Round”. Em cima da mesa estava o primeiro lugar do grupo, pelo que a seleção vencedora do encontro ficava em melhores condições para avançar da “Main Round” para os quartos de final.

    O jogo começou de forma muito equilibrada, mas foram mesmo os Países Baixos a conseguir a primeira vantagem de dois golos no encontro. Apostaram numa defesa em 6-0 moderno e por vezes em 5-1, com os laterais e pontas sempre prontos para fazer a transição em contra-ataque. Destaque para o desempenho do pequeno central Luc Steins e do pivô Samir Benghamen que foram protagonistas nesta fase inicial do encontro. No ataque, a aposta dos Países Baixos foi num ataque com muita pressão na zona dos 9 metros, com 2 a 3 homens alocados nessa zona.

    A passividade defensiva da Noruega revelava-se como o catalisador da desvantagem nórdica no encontro.  Aquando de uma suspensão por dois minutos para o lado da “Laranja Mecânica”, foi mesmo a equipa neerlandesa que aproveitou para aumentar a vantagem, sem sofrer um único golo em desvantagem numérica. A Noruega começou a aumentar a pressão na zona dos 9 metros, mas foi para o intervalo a perder por 17-13.

    Na segunda parte, a Noruega começou a apostar num ataque mais voltado para as pontas e numa defesa mais móvel, ainda que sem grandes alterações na formação. De resto, a Noruega alcançou uma remontada ao tirar partido de um período prolongado de desinspiração neerlandesa no ataque e de vários erros defensivos cometidos pela “Laranja Mecânica”. Aos erros, foi possível acrescentar uma aposta contínua no modelo 6-0, bastante conservador que deixava espaço para remates à entrada dos 9 metros.

    A Noruega acabou por vencer um jogo que para além de mostrar a importância da experiência ao nível de um Campeonato do Mundo (um aspeto que iria voltar a trair os Países Baixos na “Main Round”), serviu para confirmar o grande momento de forma e potencial dentro da seleção neerlandesa.

    DINAMARCA VS CROÁCIA: O JOGO DAS FRAQUEZAS DINAMARQUESAS

    Croácia arranca com um jogo muito físico, cometendo várias faltas num sistema defensivo que chega a ser em 3-3 e em 3-2-1. Os croatas, portanto, sem medo de jogar de igual para igual num encontro em que apenas a vitória interessava para chegar aos quartos de final. A nível ofensivo, a seleção dos Balcãs pautou-se pelo mesmo estilo ofensivo, colocando sempre um mínimo de dois jogadores a cumprir funções de pivô tendencialmente auxiliados pelo lateral direito que se colocava o mais próximo possível da marca dos 9 metros antes de fazer o passe ou “rasgava mesmo pelo meio da defesa dinamarquesa”.

    Os bicampeões do Mundo entraram com uma postura muito passiva na partida, jogando com frequência pelas pontas mas ainda assim com investidas maioritárias pela zona central da defesa croata. O “tampão” não abria e a Dinamarca ia ficando para trás no marcador. Aos 19 minutos e meio, a Croácia ganhava por 8-12 e tinha mais dois jogadores em campo do que a Dinamarca.

    Período entre os 22 e os 26 minutos da partida é essencial, já que é nesse momento da partida que a Croácia deixa desvanecer-se uma vantagem de 9-13, com momentos de sucessiva desinspiração e de boas intervenções de Landin que foram suficientes para devolver a confiança uma seleção dinamarquesa que até jogou em 7 para 6, com vista a garantir superioridade frente ao centro da defesa dos croatas.

    A Croácia acaba por fazer uma primeira parte perfeita. Sai em vantagem para o intervalo e com uma capacidade ofensiva marcada por grande criatividade, em particular nas trocas de bola, garantindo a imprevisibilidade do remate. Na segunda parte, um momento chave foi o goloês com Matthias Gidsel a aproveitar o excesso de passos por parte do número 51 croata para beneficiar de um contra-ataque na cara do guarda-redes, muito por causa da reposição da bola pelo guardião dinamarquês.

    Um segundo tempo marcado por um grande equilíbrio na partida. A Dinamarca deixou de ser tão conservadora na defesa e apostou mais frequentemente no 5-1 e no 3-3, sem abdicar totalmente do 6-0 moderno com que jogou na primeira parte. Os croatas começaram a ver muitas exclusões na sua equipa, um cenário que foi (com menor ênfase) repercutido na equipa do norte da Europa.

    O ataque da Dinamarca esteve em grande nos segundos 30 minutos da partida, passando de jogadas repetitivas e pouco eficazes perante a barreira defensiva croata, para investidas pela lateral, jogadas fluídas com passes rápidos, fazendo a bola circular no sentido comum ou inverso ao dos ponteiros do relógio, com vista a fazer o esférico chegar às pontas. Para este efeito, também se meteu a aposta nos dois pivôs junto à zona dos sete metros.

    No último minuto, a Croácia estava a perder por 31-32, mas Krabaric ainda foi capaz de empatar a partida, uma boa posse de bola da Dinamarca que controlou o tempo sem incorrer em jogo passivo foi o suficiente para garantir o empate que acabou por deixar no “limbo” uma seleção croata que tinha a eliminação iminente mas que apenas foi confirmada no fim da terceira partida da “Main Round”.

    A nível individual, destaque para Simon Pytlik que para além de apontar 9 golos, “adiou” de forma dramática um golo certo para a Croácia, quando os eslavos remataram com a baliza aberta, apenas para o lateral dinamarquês ter a mão a fazer o bloqueio. Resultou num golo da Croácia a partir de um livre de 7 metros, mas é sem dúvida um momento memorável.  No lado croata, o destaque vai para o pivô Marin Sipic, também ele com 9 golos apontados

    ESPANHA VS NORUEGA: QUEM MARCA, GANHA

    Jogo grande nos quartos de final do Campeonato do Mundo, partida que no papel parecia ser a mais renhida desta fase. A Espanha chegava como favorita depois de ganhar a medalha de bronze em 2021. Mas a Noruega chegava apenas com vitórias, nomeadamente em jogos de alto calibre contra a Alemanha e contra os Países Baixos. Já os espanhóis vinham de uma derrota num jogo muito mal disputado frente aos franceses.

    Foi a Noruega a começar melhor, chegando mesmo a ter uma vantagem de 4 golos na primeira parte. O aspeto ofensivo não foi o forte da seleção espanhola em nenhum jogo deste Mundial e a partida frente aos noruegueses foi um grande exemplo dessa ocorrência. Ambas as seleções entraram com formações semelhantes, tanto no ataque como na defesa, pelo que a eficiência do remate e velocidade na jogada foram decisivas.

    Uma exibição de luxo por parte de Torbjorn Beregerud mostrou-se decisiva para a vantagem dos noruegueses, enquanto do lado espanhol, Álex Dujshebaev não passava um bom momento. No entanto, dois minutos de suspensão para um jogador norueguês permitiram à nação ibérica manter-se na partida.

    O jogo mais dramático, da competição, marcado por dois prolongamentos. O primeiro foi causado por um golo apontado por Daniel Dujshebaev a 1 segundo do fim da partida, quando os noruegueses perderam a posse por jogo passivo já a praticamente cinco segundos do fim do encontro. No primeiro prolongamento, foi a vez da Noruega estender a partida, com um contra-ataque a 18 segundos do fim que terminou num golo apontado por Goran Johannessen a 10 segundos do fim.

    O drama seguiu as equipas até ao fim do segundo prolongamento quando Daniel Dujshebaev voltou a ser herói e a meter Espanha na frente do marcador com menos de 50 segundos para jogar. Em seguida, foi a vez do guardião Gonzalo Pérez de Vargas brilhar ao defender um remate de Johannessen que não conseguiu repetir o seu heroísmo, deixando a vitória cair para Espanha, que avançou para as meias-finais. Um autêntico hino ao espetáculo que o andebol pode oferecer, uma demonstração de como as vitórias se decidem nos detalhes e é por isso o melhor jogo desta edição do Campeonato do Mundo.

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    Filipe Pereira
    Filipe Pereira
    Licenciado em Ciências da Comunicação na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, o Filipe é apaixonado por política e desporto. Completamente cativado por ciclismo e wrestling, não perde a hipótese de acompanhar outras modalidades e de conhecer as histórias menos convencionais. Escreve com acordo ortográfico.