«Acho que a lesão me fez crescer muito» – Entrevista a Teresa Vaz Carvalho

    BnR/PdA: A Evelise ficou muito próxima do teu recorde sub-23 no ano passado (a Evelise fez 6.47, o recorde da Teresa é de 6.52). Achas que esse recorde sub-23 está em risco este ano? Como te sentes em relação a isso? [Evelise Veiga viria mesmo a bater o recorde sub-23 no passado dia 27 em Birmingham]

    TVC: Acho. Tenho a certeza absoluta. É assim…eu acho que os recordes são feitos para serem batidos. Eu tenho o de juniores, bati o de sub-23, gostava de ter podido melhorar essa marca antes dos 23 anos, tenha pena de não o ter elevado um bocadinho mais, mas acho que esse risco existe sem dúvida. Ela tem muito potencial e tem ainda um ano de sub-23 pela frente. Não fico triste porque nada ganho em ter o recorde, só o nome no recorde. No entanto (risos) se a Evelise bater a minha marca passa a ser segunda melhor de sempre e eu isso não quero. Quero melhorar a minha marca e continuar a ser a segunda melhor de sempre e, quem sabe, um dia chegar aos 7 metros.

    A saltadora não se esconde das perguntas difíceis
    Fonte: Adidas

    BnR/PdA: Agora vou-te fazer uma pergunta um pouco complexa. Algumas colegas tuas do Comprimento, nomeadamente a Brittney Reese – campeã olímpica e mundial – e a Lorraine Ugen, têm referido que as atletas no Atletismo são muitas vezes mais seguidas pela beleza ou aspecto físico. Achas que é verdade que os homens são mais seguidos pelas suas performances desportivas e as mulheres, muitas vezes, mais por essas questões de beleza?

    TVC: (Longa pausa) Sim, concordo em certa parte. A imprensa faz isso em relação às mulheres, não só no Atletismo, mas em todos os desportos, vemos isso no ténis, na natação…existem sempre aquelas eleições das mais bonitas dos Jogos Olímpicos, por exemplo. Os jornais desportivos exploram muito essa vertente e no Atletismo nota-se que há uma ou duas figuras, como a Ivana Spanovic ou a Daria Klyshina que são conhecidas como as divas do Comprimento ou a própria Patrícia Mamona no Triplo Salto. E sim, isso nota-se e sente-se, até entre atletas. No entanto, não vejo uma realidade assim tão díspar entre homens e mulheres. Apreciar a beleza, aspeto físico ou personalidade de alguém é algo quase inato e entendo perfeitamente o porquê de isso acontecer e não condeno nem acho de todo descabido. Penso que o atleta não é só as marcas que faz, mas também a pessoa que é, ou seja, a forma como se apresenta e relaciona com as pessoas. O Usain Bolt e o Cristiano Ronaldo são prova disso, é lógico que são os melhores, mas têm bastante mais mediatismo do que atletas igualmente bons como o Michael Phelps ou o próprio Messi. O seu “personal branding”, ou seja, a forma como exploram a sua marca pessoal e se “vendem” faz com que os públicos os adorem e “comprem” como se eles mesmos fossem uma marca. Acho que é uma situação inevitável, talvez seja mais notória em algumas mulheres porque a industria do desporto é maioritariamente consumida por homens, no entanto, acho mesmo que se verifica isso em ambos os sexos… Uma vez que o marketing foi a área que estudei na faculdade entendo perfeitamente o porquê de assim ser, basicamente só damos ao consumidor aquilo que ele quer.

    BnR/PdA: O problema do doping voltou a estar nas bocas do mundo. Qual é a tua opinião em relação a situações como a de Naide Gomes – que viu a medalha de Bronze passar a Prata passados 12 anos dos Mundiais Indoor de Moscovo em 2006. O que sentes em relação a esses atletas que não viram o seu esforço reconhecido no local e tempo certo e o que sentes em relação aos atletas que infringem as leis?

    TVC: Há uma coisa que sempre tive dificuldade em entender: o tempo que se demora a saber determinados resultados dos controlos anti-doping. Não consigo entender porque é que esses atletas só são apanhados tantos anos mais tarde. É completamente impensável estar a dar uma medalha a uma pessoa de uma coisa que aconteceu há 8 anos atrás, por exemplo. O dia e a hora já passou, o mediatismo já passou. Tudo o que a pessoa podia ter usufruído com isso já passou porque seres vice-campeão olímpico e passares para campeão olímpico não tem rigorosamente nada a ver. Também não percebo como é que há atletas que são apanhados uma e duas vezes e ainda continuam a competir. Há casos de contaminação que são provados, é verdade, e confesso que tenho receio disso. Mas quando se sabe que é premeditado acho que esses atletas deveriam ser erradicados ou se quisessem criar uma Liga apenas para as pessoas que queiram usar esse tipo de substâncias, como há certas competições no culturismo. E é uma situação que deixa todo o mundo em desvantagem, não apenas aqueles que perdem medalhas. Porque se pensarmos bem, por exemplo, os mínimos são cada vez mais altos, influenciados por essas performances, o que não permite a atletas limpos qualificarem-se para esses eventos. Se calhar eu fico em casa por causa desses mínimos adulterados por atletas dopados que baralharam a estatística.

    Teresa Carvalho foi 5ª em Rieti, nos Europeus Júniores em 2013

    BnR/PdA: Estão a chegar os Europeus. Portugal normalmente tem boas performances em Campeonatos da Europa, mas ainda assim é comum assistirmos a uma exigência desfasada por parte da imprensa face à nossa realidade. Achas que Portugal dá as condições ideais aos seus atletas ou sentes que se estivesses a viver no Reino Unido ou nos EUA, já poderias estar num outro patamar?

    TVC: É uma pergunta difícil. Ontem por acaso em conversa com alguns atletas norte-americanos, um deles referiu que gostava de saber como poderia ter nacionalidade portuguesa. Porque o atleta em causa é medalhado olímpico e mundial e não consegue entender porque ninguém lhe dá valor e dizia que no meu país de certeza que alguém quereria saber dele. Chegámos também à conclusão que os ingleses têm bastantes mais apoios que os norte-americanos, mas isso acontece porque a estrutura do desporto em Inglaterra está montada de uma forma muito eficiente. Eu acho que a nível de condições não me posso queixar.

    Tenho uma pista coberta, uma pista ao ar livre, tenho os fisios, os terapeutas, tenho tudo, mas às vezes sinto que é um bocado a nossa mentalidade portuguesa. Valorizamos sempre mais o que está no exterior do que no nosso próprio país. Um grupo de treino eu penso que poderia, sim, fazer a diferença, porque quando muitas pessoas boas treinam juntas, isso vai ajudar a subir o teu rendimento e isso vê-se no grupo de treinos do Iván Pedroso agora, que tem o Nelson Évora, a Ana Peleteiro, a Yulimar Rojas, o Teddy Tamgho, tudo atletas de topo. Eu acho que muitas vezes nós vivemos muito fechados. Eu vejo que nos outros países, os atletas estão sempre em estágios no estrangeiro, aprendendo e bebendo um pouco de cada país.

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    Pedro Pires
    Pedro Pireshttp://www.bolanarede.pt
    O Pedro é um amante de desporto em geral, passando muito do seu tempo observando desportos tão variados, como futebol, ténis, basquetebol ou desportos de combate. É no entanto no Atletismo que tem a sua paixão maior, muito devido ao facto de ser um desporto bastante simples na aparência, mas bastante complexo na busca pela perfeição, sendo que um milésimo de segundo ou um centimetro faz toda a diferença no final. É administador da página Planeta do Atletismo, que tem como principal objectivo dar a conhecer mais do Atletismo Mundial a todos os seus fãs de língua portuguesa e, principalmente, cativar mais adeptos para a modalidade.                                                                                                                                                 O Pedro escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.