Obrigado e até sempre, Gino!

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    Na passada sexta-feira, foi confirmado o falecimento de Gino Mäder, ciclista suíço da Bahrein-Victorious, após sofrer uma queda na etapa 5 da Volta à Suíça. A equipa de Mäder anunciou nesta manhã que não vai alinhar nas duas últimas etapas da corrida helvética. A Tudor Pro Cycling Team, formação da Suíça tomou a mesma decisão.

    Gino Mäder sofreu uma queda na descida para La Punt, onde iria concluir a 5ª etapa da prova. O corredor suíço caiu de uma ravina e foi encontrado em paragem cardiorrespiratória junto a um riacho. A equipa médica foi capaz de reanimar Mäder que foi transportado para o hospital de Chur, local onde iria sucumbir aos ferimentos e perder a vida.

    Magnus Sheffield, ciclista norte-americano da INEOS caiu, mas encontra-se apenas com uma concussão ligeira e internado em estado pouco grave.

    A 6º etapa foi neutralizada, tendo ao invés, sido realizados apenas 20 km do percurso em homenagem a Gino Mäder, com a Bahrein-Victorious a passar todo o tempo à frente do pelotão e a cortar a linha de meta com todos os seus corredores lado a lado. As duas últimas jornadas já decorrerão dentro do âmbito competitivo.

    De acordo com a organização, a decisão foi tomada, após conversações com a família de Gino Mäder, com os corredores e com todo o staff da Volta à Suíça.

    Estamos arrasados ​​com a perda de nosso excecional ciclista, Gino Mäder. O seu talento, dedicação e entusiasmo foram uma inspiração para todos nós. Ele não era apenas um ciclista extremamente talentoso, era também uma ótima pessoa fora da bicicleta. Estendemos as nossas mais profundas condolências à sua família e entes queridos, e os nossos pensamentos estão com eles durante este momento difícil. A Bahrain Victorious correrá em sua homenagem, mantendo a sua memória em todas as estradas que corremos. Estamos determinados a mostrar o espírito e a paixão que o Gino demonstrou, e ele sempre será parte integral de nossa equipa, declarações do Diretor da Bahrain Victorious, Milan Erzen, presentes em comunicado da equipa.

    Nas horas seguintes, choveram reações de várias figuras no Mundo do ciclismo, desde colegas de equipa a outras formações e até mesmo a ciclistas que nunca correram ao lado de Mäder.

    GINO MÄDER: A CARREIRA

    Gino Mäder nasceu em Flawil, localidade situada no cantão de St. Gallen. Filho de dois ciclistas, o nome “Gino” foi inspirado na lenda velocipédica italiana, Gino Bartali, mas a primeira experiência do suíço no desporto até foi no futebol, aos 5 anos de idade. Ainda assim, acabou por não demorar a enveredar pela via do ciclismo.

    Os primeiros grandes resultados de Mäder começaram logo no escalão de juniores, mais concretamente, em 2014. Com apenas 17 anos, o corredor helvético marcou logo presença no top 10 das provas de juniores Pays de Vaud e do Gp Ruëbliland e ficou ainda no top 5 dos Europeus, tanto no contrarrelógio como na prova de fundo, alcançando também um top 20 nos Mundiais, no Qatar.

    Em 2015, conquistou as três primeiras vitórias como júnior, incluindo o Campeonato de Contrarrelógio da Suíça. A primeira foi no prólogo da Pays de Vaud. Mäder foi também alcançando bons resultados no ciclismo de pista, nomeadamente na modalidade de perseguição. Em 2016, ficaria mesmo no 4º lugar dos Campeonatos do Mundo de perseguição coletiva, em Glasgow, com destaque também para a participação no Tour de l’Ain e noutras provas francesas que permitiram a Mäder sentir já o cheiro ao profissionalismo.

    Em 2017, foi a primeira participação de Gino no Tour de l’Avenir, conseguindo um 16º lugar na classificação geral, mas o maior destaque do ano foi o 3º lugar na Piccolo Giro di Lombardia e no Campeonato do Mundo de Ciclismo de Pista, onde conseguiu uma medalha de bronze em perseguição coletiva.

    2018 seria o grande ano de formação para Gino Mäder. Aos 22 anos, venceu etapas na Volta à Alsácia (onde também venceu a classificação por pontos), na Ronde de l’Isoard de sub-23 e na Volta ao Hainan. Ainda assim, o que mais saltou à vista foram as duas vitórias de etapa no Avenir e o 5º lugar na prova de fundo dos Campeonatos do Mundo, conquistada pelo compatriota de Marc Hirschi. Mäder e Hirschi faziam, desta forma, parte de uma geração de ouro do ciclismo da Suíça.

    Somos bons amigos. Já andamos a ombrear há vários anos na seleção nacional. Até porque na Suíça o serviço militar é obrigatório e somos quatro ou cinco da seleção que fizeram as dezoito semanas juntos. Posso garantir-vos que três meses e meio quase todo o tempo juntos e não só durante os treinos, une um coletivo e desenvolve coesão – Palavras de Gino Mäder numa entrevista dada em 2018 ao site “Velo-Club.net”

    Não haviam mais dúvidas em relação ao potencial de Mäder e, por isso, o suíço foi capaz de chegar à Team Dimension Data, formação sul-africana do World Tour.

    O primeiro ano como profissional ocorreu sem grandes ondas, mas com o ciclista helvético a garantir alguma consistência nos resultados. Em 2020, essa consistência saltou mais à vista com uma campanha na Vuelta, onde foi segundo na 17ª etapa e fechou top 20 na geral. No fim da época de 2021, Gino saiu da Dimension e foi para a Bahrain-Victorious, depois de um início de carreira profissional que o próprio ciclista não considerou muito positivo, destacando até num “press release”. “A equipa acreditou nas minhas qualidades e confiou em mim antes de eu o fazer”. Estas declarações destacam a humildade tão associada pelo pelotão a Mäder.

    2021 foi o melhor ano da carreira de Gino Mäder, no qual alcançou as primeiras vitórias como profissional. Fechou top 10 no Paris-Nice, ficando em segundo lugar da penúltima etapa, passando grande parte da etapa isolado na fuga, sendo apenas alcançado dentro dos 100 metros finais por Primoz Roglic.

    Esse segundo lugar amargo seria substituído pelo doce sabor da vitória na etapa 5 do Giro d’Italia, com Mäder a vencer em Ascoli Piceno, chegando isolado à meta com apenas 12 segundos de vantagem para o grupo dos favoritos, nos quais estavam incluídos Egan Bernal e Remco Evenepoel. O homem da Bahrain envergava a camisola da montanha no mesmo dia.

    Uma das maiores vitórias da carreira de Mäder surgia na Volta à Suíça desse ano, na qual bateu Michael Woods no âmbito do sucesso de uma fuga na etapa final da prova.

    A forma como ganhei hoje foi completamente diferente da forma como ganhei a partir de uma fuga (no Giro) () Acho que hoje posso dizer: Eu cheguei!, palavras de Gino Mäder após a vitória na última etapa da sua corrida caseira, em 2021.

    O melhor resultado da carreira em grandes voltas chegou na Vuelta, onde alcançou o 5º lugar da geral e a vitória na classificação de melhor jovem, à frente de Bernal, sendo que o colombiano vencera a Volta à Itália desse ano. Em 2022, os resultados não foram tão brilhantes, com Mäder a repetir o 20º lugar de 2020 na Vuelta, depois de falhar a primeira presença no Tour de France devido a uma infeção com Covid-19. Ainda assim, conseguiu ser 2º na Volta à Romandia, batido por Aleksandr Vlasov.

    Em 2023, Gino Mäder foi 5º da geral no Paris-Nice, onde fez vários top 10 em etapas. Fazia o regresso à competição na Volta à Suíça, depois de falhar o Giro devido a uma infeção com Covid-19. Acaba a carreira com 4 vitórias como profissional, uma classificação secundária, um top 5 e uma vitória de etapa em grandes voltas, bem como uma medalha de bronze nos Mundiais de Pista. Aos 26 anos, era um corredor completo, com boas pernas para o contrarrelógio e para a montanha.

    GINO MÄDER: UM CICLISTA DE CAUSAS

    Gino Mäder era caracterizado pelos colegas de profissão como uma pessoa divertida, carinhosa e inteligente. Para o pelotão, foi um amigo, um colega de equipa e até de quarto. Mas o que mais se destacava em Mäder aos olhos do público era o trabalho do ciclista suíço com instituições de caridade.

    O maior destaque vai para uma campanha de caridade que o suíço levou a cabo na Vuelta que concluiu em 5º lugar na geral: por cada ciclista que acabasse atrás de si, em cada etapa da corrida, Mäder doava 1 euro à “Just Diggit”, uma instituição de caridade que tem como missão a reflorestação de África. A campanha angariou um total de 4529 euros, uma vez que Gino acrescentou 10 euros por cada corredor que acabou atrás de si na geral.

    Em 2022, o ciclista da Bahrain repetiu uma proeza semelhante ao doar 1 franco suíço por cada ciclista que terminasse atrás de si ao longo de todas as corridas de 2022, à luta contra as alterações climáticas. Em agosto, já tinha angariado 3341 francos suíços para a causa. 

    A dedicação do ciclista suíço às causas de caridade não se cingia aos humanos, com Mäder a adotar um cão vadio de Bilbao, que batizou com o nome Pello, em homenagem ao colega de equipa, Pello Bilbao, mais um sinal do sentido de humor tão associado ao helvético pelos colegas de profissão.

    Um exemplo deste companheirismo, desta dedicação e amizade para com o coletivo surgiu quando Gino Mäder conquistou a 7ª etapa do Giro, um dia depois de Mikel Landa ter sido obrigado a desistir da corrida devido a uma queda. No dia da primeira vitória como profissional, foram estas as palavras do ciclista suíço:

    “Ontem, foi um dia tão triste e hoje apenas dissemos: vamos correr em honra do Giro perdido do Mikel”

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    Filipe Pereira
    Filipe Pereira
    Licenciado em Ciências da Comunicação na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, o Filipe é apaixonado por política e desporto. Completamente cativado por ciclismo e wrestling, não perde a hipótese de acompanhar outras modalidades e de conhecer as histórias menos convencionais. Escreve com acordo ortográfico.