Soma e segue: Roglic triunfa pela terceira vez consecutiva na Vuelta

    HAT-TRICK ESLOVENO, WONDERKIDS TRIUNFANTES E UMA “NOVELA” COLOMBIANA

    Se é justo dizer que estas três semanas de ciclismo no país vizinho souberam a pouco, a “culpa” de tal ideia (ou facto) deve-se à tremenda superioridade de Primoz Roglic e da sua Jumbo-Visma, assim como das peripécias e impotências que se registaram nos adversários diretos na luta pela camisola vermelha.

    O maior ponto de destaque na corrida do esloveno vai para o crescente interesse pelo risco, isto no que concerne às tentativas de ganhar tempo em terrenos montanhosos (quer a subir, quer a descer). A forma como perdeu a Volta a França de 2020 tem vindo a exercer alguma influência num ciclista que se preservava, que era contido, e que, apesar de continuar a ser em tudo metódico e calculista, coloca cada vez mais riscos na sua maneira de encarar uma grande volta, mesmo quando não é necessário, se atentarmos à diferença abismal em termos de contrarrelógio em relação a grande parte dos seus oponentes.

    O plano de laboratório holandês, escolhendo os exatos momentos para assumir a corrida e controlar qualquer contrariedade, emerge quase que como uma fotossíntese perfeita com as capacidades do seu líder, cada vez mais dominador e a confirmar o porquê de estar vários degraus acima de quase todos os outros. Está criada uma química bem visível e que só deixa no ar uma única questão: será esta sociedade a única esperança de derrubar Tadej Pogacar do trono francês?

    Sobre as estradas espanholas: pareceu fácil, mas não foi. Enric Mas demonstrou-se a um nível nunca antes visto e Miguel Ángel López ainda fez comichão – isto antes de abandonar a competição na penúltima etapa… por um presumível descontentamento com a situação de corrida.

    Num momento em que, juntamente com Egan Bernal, já perdia mais de quatro minutos para outros líderes depois de ficar cortado, uma autêntica novela de rede social gerou-se com informações a dar conta de todos os contornos do paradeiro do colombiano. No fim, acabou por se confirmar a desistência do corredor da Movistar, numa situação completamente insólita.

    Aproveitou Jack Haig e a sua Bahrain-Victorious. Se, por um lado, a Movistar voltou a não ficar muito bem na fotografia, apesar de um resultado “positivo”, por outro lado, o conjunto do Médio Oriente viu o seu grande trabalho recompensado, com um lugar no pódio final. Para o futuro: será bastante interessante ver o desenvolvimento de uma equipa que não está nada longe de ter um dos três melhores blocos para atacar as grandes voltas.

    Resultado positivo para uns; desfecho amargo para outros. A Ineos Grenadiers colocou dois homens no top 10. Porém, esteve longe de estar ao nível que lhe é reconhecido, falhando a vitória, o pódio e até uma vitória em etapa. Egan Bernal não esteve na sua melhor forma e Adam Yates não teve o impacto esperado numa edição que contou ainda com a estreia de Tom Pidcock, a jóia da coroa ciclística britânica.

    Dos restantes nomes entre os demais, é de mencionar a regularidade de Sepp Kuss e de Gino Mader. Os dois jovens escudeiros demonstraram uma consistência interessante na classificação geral, sendo que o segundo vestiu-se de branco em Santiago de Compostela, sucedendo a Enric Mas e conquistando a classificação da juventude.

    Já a classificação da montanha foi ganha por Michael Storer, uma das principais figuras da competição, depois de vencer também duas etapas. O australiano de 24 anos bateu o colega de equipa Romain Bardet e o camisola vermelha Primoz Roglic, juntando duas etapas de média montanha, um pouco à imagem de Magnus Cort, outra das caras vitoriosas da Vuelta.

    O ciclista dinamarquês fez um hat-trick de etapas e levou o prémio de combatividade para casa, demonstrando-se a um nível tremendo na competição em que tem conseguido os seus maiores sucessos. Explosivo, rápido e polivalente, o todo o terreno da EF Education-Nippo apenas foi superado pelo poker de Roglic, tendo lutado por diversas etapas, inclusive pelo contrarrelógio final, em Santiago de Compostela.

    Relativamente à camisola verde, símbolo de líder da classificação por pontos, o regressado aos grandes palcos Fabio Jakobsen não deu hipótese aos outros sprinters presentes em prova. Jovem, fresco e com a rapidez que lhe é reconhecida, o atleta da Deceuninck Quick-Step venceu três etapas e ficou em segundo lugar em duas, num total de cinco pódios. Na realidade, apenas Primoz Roglic e Magnus Cort tiveram a capacidade de colocar esta classificação em perigo. Matteo Trentin, Alberto Dainese e Michael Matthews foram os grandes opositores na luta pelos sprints, ainda que, claramente, não tenham apresentado uma ponta final ao nível do holandês.

    Arnaud Demáre é, pela incapacidade em constar nesta luta, uma das principais desilusões da prova. O velocista francês passou ao lado da Vuelta, continuando sem dar continuidade às grandes exibições na Volta a Itália e Milano-Torino de 2020. Pela qualidade que todos reconhecem nestes nomes, é justo juntar o francês a ciclistas como Egan Bernal, Miguel Ángel López (situação diferente devido ao abandono insólito, depois de triunfar no Gamoniteiru) ou Mikel Landa, numa perspetiva de classificação geral, assim como a Michael Matthews, Jan Tratnik, Harm Vanhoucke, Jon Aberasturi ou a outros nomes de quem se esperava pelo menos algum destaque.

    Já em termos de revelações, a situação é bem mais dinâmica. Para além de Michael Storer, Fabio Jakobsen e Gino Mader, é de referir as excelentes aparições de Clément Champoussin, Mark Padun, Sepp Kuss, Odd Christian Eiking ou Jay Vine. Entre os mais velhos, também Rafal Majka, Romain Bardet e Rein Taaramae fizeram o gosto à bicicleta, numa competição marcada pela despedida de Fábio Aru das estradas.

    Detentor de um palmarés respeitável, o mítico miúdo que detinha uma irreverência característica e um poder de ataque incrível não confirmou todas as esperanças depositadas nele. Venceu a Volta a Espanha de 2015, o seu maior triunfo enquanto ciclista. Passou pela Astana, pela UAE Team Emirates e retira-se agora ao serviço da Team Qhubeka-NextHash. Apesar de prematuro, é o abandono de um grande valor italiano. Quem se seguirá na dinastia transalpina? Melhor: quem sucederá a Roglic? Essa é que é a grande questão. Ou teremos um tetracampeonato a caminho? Seria histórico, inédito e mágico; isso é certo.

    Artigo revisto por Andreia Custódio
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    Ricardo Rebelo
    Ricardo Rebelohttp://www.bolanarede.pt
    O Ricardo é licenciado em Comunicação Social. Natural de Amarante, percorreu praticamente todos os pelados do distrito do Porto enquanto futebolista de formação, mas o sonho de seguir esse caminho deu lugar ao objetivo de se tornar jornalista. Encara a escrita e o desporto como dois dos maiores prazeres da vida, sendo um adepto incondicional de ciclismo desde 2011.