E se fosse consigo?

    Imagine que é um atleta de alta competição e acabou de ficar em segundo lugar no campeonato do mundo. Após longos meses de preparação e de descurar a vida pessoal em prol dos resultados desportivos, o único capaz de o bater é um atleta que já esteve antes suspenso por ter acusado uma substância proibida e que recentemente acabou um teste anti-doping destruindo com um martelo as amostras recolhidas. Parece-lhe razoável que se manifestasse com um protesto na cerimónia protocolar?

    Imagine agora que é um atleta de alta competição, sujeito a um sistema de controlo anti-doping que o obriga a dar o seu paradeiro às autoridades a praticamente todo o momento e que lhe pode aparecer para o testar em locais como restaurantes, hotéis, casas de amigos,… Num desses testes, três pessoas aparecem para o procedimento, mas apenas uma delas está devidamente credenciada, após lhe tirarem sangue percebe que a enfermeira que o fez não tem as habilitações necessárias para o fazer e os formulários que tem de preencher contêm vários erros.

    Perante isto, depois de consultar tanto o seu advogado e treinador como representantes das autoridades anti-doping, decide não assinar os documentos e não permitir que a recolha seja concluída. Ah! E, entretanto, já passaram mais de quatro horas desde o início do teste e são três da manhã. Parece-lhe descabido que, chegado a este ponto, recorra ao seu segurança para destruir as amostras e finalmente acabar com esta questão?

    Esta é, em traços gerais, a situação com que se depara Sun Yang, um dos mais bem sucedidos nadadores deste século e cujas vitórias nos mundiais de Gwangju 2019 têm sido recebidas por protestos dos seus colegas.

    Mack Horton foi um dos que protestou contra Yang
    Fonte: FINA

    A história não está do lado de Sun Yang, já que o chinês é conhecido por ser alguém muito efusivo e até algo arrogante, que não hesita em provocar os seus adversários. Além disso, cumpriu já uma suspensão de três meses há alguns anos.

    No entanto, foram apenas três meses exatamente por existirem vários atenuantes: Yang acusou a uma substância recém adicionada à lista de proibidas da WADA utilizada num medicamento para um problema de coração à qual já recorria anteriormente e para a qual obteve depois um TUE.

    A situação é delicada, seguramente, mas a primeira decisão saiu em favor de Sun Yang. Apesar de ser reconhecido que a sua ação foi imprudente e incorreta, é também aceite que não há violação das leis anti-doping porque este tem razão no que alega, logo, aquelas amostras nunca poderiam vir a ser utilizadas para o testar. De qualquer modo, o desenrolar do caso ainda não chegou ao fim, já que a WADA recorreu para o CAS, que se deverá pronunciar nos próximos meses.

    É compreensível que os seus adversários se revoltem perante as notícias que lhes chegam e com as atitudes do chinês, mas também se percebe, pelo menos neste caso, que alguma razão Sun Yang tem.

    Na verdade, por mais protestos que alguns nadadores façam, a postura intransigente de Sun Yang perante esta situação está a defender todos os atletas. As instituições servem para defender os atletas que cumprem as leis e os expedientes requeridos pelos regulamentos funcionam para garantir uma avaliação justa a estes, pelo que é importante que não se abdique de exigir a sua aplicação. De qualquer modo, estas regras servem também para proteger as próprias instituições e garantir que as suas posições são fiáveis.

    E, no final de contas, que credibilidade tem uma agência anti-doping incapaz de cumprir os procedimentos mais básicos?

    Foto de Capa: FINA

    artigo revisto por: Ana Ferreira

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