Sempre defendi que devemos ter uma admiração moderada pelos nossos jogadores. Os jogadores passam (alguns que admiramos por parecerem mostrar uma certa fidelidade até por um Zenit nos trocam) e o Benfica continua. Nove anos se passaram desde que Giovanni Trapattoni agradeceu a Deus a bênção que era ter Simão na equipa. Mas foi justo. Foi o melhor jogador que tivemos nos últimos anos, que muito nos deu mas a quem o Benfica deu muito pouco. Era mesmo uma bênção ter o Simão a levar o Benfica às costas enquanto os Eversons e Alcides desta vida nos tiravam séculos de vida. Entre Simão e Cardozo admirámos também a magia do Miccoli, a classe preguiçosa do Reyes, o Deus Aimar, a raça do Coentrão e o benfiquismo meio louco do Maxi, David Luiz e Enzo Pérez. Venerámo-los a todos, sim, mas arrisco dizer que nunca achámos que qualquer um deles fosse insubstituível por vale quase por toda a equipa.
Até Óscar Cardozo. Idolatrado por muitos, odiado por outros tantos que pouco ou nada percebem disto, o paraguaio vai escrevendo a sua história no Benfica entre golos, punhos cerrados e festejos desengonçados. Cento e setenta golos oficiais e quantos deles tremendamente decisivos. O memorável jogo de ontem (não só do Cardozo mas de todos, para acalmar a azia sportinguista) foi mais um abre olhos para os especialistas que assinavam por baixo a venda do Cardozo depois do episódio no Jamor. Ficar com um treinador perdedor e prescindir do melhor avançado das últimas décadas no clube… sem comentários. Nos últimos 14 golos do Benfica, Cardozo esteve directamente envolvido em 10, com nove golos e uma assistência. Para muita gente serão números insuficientes porque, vistas bem as coisas, já está 75 minutos sem importunar o Rui Patrício pela 14ª vez.
Só mesmo neste Benfica do (ai) Jesus, remendado e ainda a viver no pânico do Kelvin e Ivanovic é que era possível (quase) mandar a memorável prestação do Cardozo para o baú das humilhações. Acaba, felizmente, por ficar para futura memória um derby de alta qualidade, como há muito não se via. Sinal de que o Sporting está a recuperar dos anos caóticos, sim, mas mantém o mesmo estigma das arbitragens: está no sangue?
Se esta temporada ainda está viva, em grande parte o devemos ao Óscar. Graças a Deus que o temos connosco – e Deus não era sportinguista, com certeza.