O Benfica recebeu o Estrela da Amadora no passado sábado. As águias venceram, não convenceram e a descrença não se ausentou ainda do âmago dos adeptos. O encontro pobre em futebol foi, todavia, rico em polémica. Roger Schmidt foi mais uma vez recebido por uma vaia altíssona e uníssona. Nada de novo. O futebol (perdoem-me o termo) das águias foi mais uma vez apupado. Nada de novo. O ingrediente mais distinto desta receita de polémica a la Luz foi outro e havia sido anunciado no dia anterior ao jogo.
João Mário, segundo principal alvo dos adeptos contestantes, pediu para sair do clube e não foi convocado, para gáudio dos adeptos. Foi o primeiro ato de boa gestão de Roger Schmidt desde que chegou ao Benfica. Ou talvez não. É, até certo ponto, compreensível que o treinador abdique de um jogador que está de saída. Se não vai fazer parte do grupo, faz sentido que o grupo passe a trabalhar sem ele.
Não um capitão. Seja ele um bom capitão, seja ele um João Mário. O capitão não pode nunca ser o primeiro a abandonar o barco e a refugiar-se. E não pode nunca contar com a conivência do seu timoneiro. Enquanto é jogador do Benfica, tem de estar comprometido e compenetrado. Não estava? É uma das hipóteses. Se não estava, a questão principal é esta: como pôde ser capitão de equipa?
Mas talvez estivesse. Talvez tenha sido deixado de fora para proteger o grupo da sua presença quando está na porta de saída. Aí surge outra questão, não menos problemática: o grupo precisa de ser protegido de um dos seus líderes? Talvez não precise. Quem sabe, João Mário não jogou porque a “estrutura” do clube determinou que era melhor proteger a sua integridade física para não comprometer a sua venda.
É uma hipótese. Mas a questão que levanta não é mais agradável: é assim tão premente vender um capitão de equipa? Falta dinheiro? Ou a continuidade de João Mário, caso não se concretize a venda, é um problema de balneário? Nesse caso, retorna a questão: como pôde ser capitão de equipa? Mas, calma, pode não ser nada disto.
Pode a sua ausência da convocatória ter sido considerada de somenos importância. Pode Roger Schmidt ter pesado tudo na balança e chegado à conclusão de que, tudo somado, não valia a pena convocar o jogador. Ergue-se – adivinhem – uma outra questão problemática: então por que motivo foi João Mário titular e capitão nas duas primeiras jornadas? Um jogador tão fundamental para Roger Schmidt não consta sequer dos convocados num momento em que ainda é jogador do Benfica?
A panóplia de questões possíveis é vasta. Qual delas a pior? Não sei bem. Sei que nenhuma é boa. Não quer isto dizer que João Mário tenha sido um problema. A propósito, lembro-me de o grande Raúl Solnado contar, em jeito de anedota, a sua ida ao médico. A dada altura, conta que o médico, auscultando-o com o estetoscópio, lhe pediu para tossir várias vezes (procedimento normal). Determinou o médico, de seguida, que o problema do paciente era tosse.
Naturalmente, não era. A tosse era um sintoma – neste caso promovido até pelo médico. Tal como João Mário não foi um problema, foi um sintoma – também promovido, não pelo médico, mas pelo engenheiro alemão. Vai, como tem sido norma neste Benfica (mais uma vez, perdoem-me o termo), mais uma vez ser resolvido o “problema”. Na verdade, vai tratar-se um sintoma apenas – que até poderia ter sido evitado – e o problema vai continuar lá. Pelo menos até outubro de 2025.
Parafraseando Sophia de Mello Breyner Andresen, “perdoai-lhes, Sven, porque eles sabem o que fazem”. Ai se sabem.