Os pecados de Jesus

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    «O empate é um resultado que pode deixar os adeptos algo desiludidos. Mas eu, como treinador, já perdi muitos jogos porque jogando ao ataque e a outra equipa em contra-ataque marca e ganha. (…) Podíamos não ganhar, mas era muito importante não perder. Esta é uma ideia que, no futuro, devemos de ter presente.» Giovanni Trapattoni, treinador italiano campeão pelo Benfica em 2004/05.

    Não é por acaso que começo o texto com uma citação de um dos mais titulados treinadores da história do futebol. Trapattoni, pese embora todo o pragmatismo que lhe é reconhecido, é um vencedor. Conhece o futebol como poucos e está habituado à pressão de vencer. Ganhou diversos títulos e calou críticos pelo mundo fora. Está-se nas tintas para o futebol espetáculo e sempre foi muito criterioso na busca pelo resultado que queria (ou que lhe fosse possível alcançar).

    Apontem-lhe todos os defeitos que quiserem, mas nunca lhe retirem o mérito de saber ler um jogo. Uma característica ao alcance de poucos e que tem escapado a Jorge Jesus, desde que pegou na equipa do Benfica. Apesar de apresentar um futebol espectacular e vistoso, a formação encarnada continua a pecar em pormenores. Ligeiros detalhes que, numa primeira instância, parecem não fazer a diferença, mas que, no fim das contas, acabam por ser decisivos para as grandes decisões.

    Falta de pragmatismo

    Ao contrário de ‘Trap’, Jesus é incapaz de não arriscar. Uma característica que é altamente prejudicial para um treinador de uma equipa que procura títulos de forma consistente. Jesus é um extraordinário treinador que consegue tirar o melhor partido de cada jogador, mas releva ainda uma enormíssima lacuna na leitura pragmática dos jogos. Bastará, para isso, olhar para as derrotas do Benfica nesta temporada. Para além do merecido desaire em Braga, Jesus perdeu mais dois jogos no campeonato, frente a Paços de Ferreira e Rio Ave. Em ambos os jogos, esteve mais próximo de empatar do que perder. E em ambos os jogos, foi derrotado nos instantes finais.

    Em Paços de Ferreira, Jesus podia ter conseguido o empate. Mas preferiu arriscar a vitória num panorama que não lhe era favorável. Via-se que os jogadores estavam desmotivados, que os processos de jogo teimavam em não aparecer e que parecia difícil chegar ao golo. O treinador do Benfica leu mal o jogo e acabou por sair derrotado. Podia ter 1 ponto, mas acabou por sair sem nenhum.

    Em Vila do Conde, a história repetiu-se. Jesus teve o jogo na mão, quis controlar e dilatar a vantagem e acabou por sair pela terceira vez na temporada sem qualquer ponto no bolso. Depois da expulsão de Luisão (85’), não quis apenas agarrar o empate. Voltou a tentar vencer um jogo que já estava condenado ao fracasso. Resultado: o mesmo do que em Paços de Ferreira. Podia ter 1 ponto, mas acabou por sair sem nenhum.

    Pode parecer pouca coisa, mas não é. Revela muita da ambição desmedida de Jesus. Ninguém me saberá dar razão, mas eu mantenho aqui a aposta de que se Jesus tivesse um pouco da mentalidade de Trapattoni para estes momentos, nunca perderia nenhum dos dois jogos.

    "Jesus não sabe reagir à adversidade. Qualquer adepto do Benfica já percebeu que não há um ‘plano B’ no esquema do técnico encarnado" Fonte: Facebook do Sport Lisboa e Benfica
    “Jesus não sabe reagir à adversidade. Qualquer adepto do Benfica já percebeu que não há um ‘plano B’ no esquema do técnico encarnado”
    Fonte: Facebook do Sport Lisboa e Benfica

    Dificuldades para ler um jogo

    Jesus não sabe reagir à adversidade. Qualquer adepto do Benfica já percebeu que não há um ‘plano B’ no esquema do técnico encarnado. Aliás, até há, mas é ineficaz. Sempre que está em desvantagem ou que procura um golo (tome-se como exemplo o jogo em Paços de Ferreira – saída de Samaris e entrada de Derley e de Braga – saída também do grego para a entrada de Jonas) Jesus tira um elemento do meio-campo – por norma, o trinco – e coloca mais um avançado em jogo. Fica, portanto, com três jogadores na frente de ataque (apoiados por dois extremos) e UM jogador no meio-campo. Sim, UM JOGADOR para recuperar bolas, fazer transições entre a defesa e o ataque e ser o principal (e único) responsável pelo equilíbrio da equipa. Certamente que não sou ninguém para ensinar o que quer que seja a Jesus acerca de tática, mas parece-me lógico que a colocação de mais elementos na frente de ataque não implica maior perigo na defesa adversária. Com esta habitual mudança, apenas consegue desequilibrar a equipa e permitir que o adversário tenha maior facilidade para dominar o meio-campo e fazer mais transições rápidas em contra-ataque. Perdeu assim em Paços. Já perdeu assim no passado. E vai continuar a perder no futuro, se continuar a fazê-lo.

    Incapaz de lidar com a pressão

    Não é de hoje. Jesus não consegue lidar com a pressão. É incapaz de controlar a ansiedade de vencer e isso não se vê apenas nos jogos. Percebe-se também através da comunicação. Jesus começa a acusar a pressão quando não se sente confortável com alguma situação mais problemática. O facto de não conseguir admitir fracassos e/ou erros revela insegurança. Veja-se, por exemplo, o caso recorrente de fingir despreocupação com a aproximação do FC Porto na tabela classificativa, usando o já habitual argumento de que “quem está em primeiro é o Benfica”. Não precisarei de ajudar muito os adeptos do Benfica a fazerem uma viagem no tempo nos dois campeonatos consecutivos perdidos com vantagens de 4 e 5 pontos a poucos jogos do fim. Jesus foi desvalorizando a aproximação do FC Porto e depois acabou por ser ultrapassado. Esta é a maneira que encontra para disfarçar receios e medos que estão à vista de todos. Todos sabemos que Jesus está com medo. Que estes 3 pontos de vantagem lhe estão a tirar o sono. Mas claro que isto ele nunca vai admitir.

    Por tudo isto, Jesus, peço-te, que me deixes dirigir a ti, neste último parágrafo: O que te resta agora? Experimenta deixar a arrogância de lado e ser um pouco mais racional. Percebe que até o mais ínfimo detalhe faz a diferença numa prova de regularidade. Estás, constantemente, a perder o controlo nos jogos fora de casa. Se não dá para ganhares o jogo, pelo menos, tenta não o perder. Se tivesses aceitado o empate em Paços e em Vila do Conde, terias agora 5 pontos de vantagem para o FC Porto. Não te condeno a ambição, mas peço-te mais racionalidade. Afinal, não é por acaso que já deixaste escapar dois campeonatos devido a pequenos pormenores… Mas eu sei que um dia vais deixar de ser teimoso. Ainda vais a tempo…

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    Mário Cagica Oliveira
    Mário Cagica Oliveirahttp://www.bolanarede.pt
    O Mário é o fundador do Bola na Rede e comentador de Desporto. Já pensou em ser treinador de futebol por causa de José Mourinho, mas, infelizmente, a coisa não avançou e preferiu dedicar-se a outras área dentro do mundo desportivo.