Benfica e o “problema” Vlachodimos | Ponto final na Odisseia?

    Benfica

    No dia 18 de maio de 2018, o SL Benfica anunciou o seu primeiro reforço para a época 18/19. Depois de uma temporada pautada pela instabilidade ao redor da baliza encarnada – Bruno Varela nunca reuniu consenso entre os benfiquistas e Mile Svilar mostrou ainda não estar pronto para os grandes palcos -, as águias foram à Grécia recrutar Odysseas Vlachodimos.

    Apesar de ter sido titular indiscutível no Panathinaikos AO durante as duas temporadas anteriores, o guardião greco-germânico chegou a Lisboa como um desconhecido. Ainda assim, Vlachodimos mereceu a confiança de Rui Vitória e não teve dificuldades em assumir a titularidade da baliza encarnada.

    Após os “loucos seis meses” de Bruno Lage, a época terminou com o título de campeão. No entanto, alguns adeptos benfiquistas nunca pareceram totalmente convencidos com o ‘dono’ da baliza. Capaz do melhor (exibição na vitória por 1-2 no Dragão) e do pior (erro inusitado no primeiro golo da B-SAD na Luz), Odysseas continuava a estar muito longe do nível de alguns ex-guarda-redes encarnados, como Jan Oblak e Ederson Moraes.

    Ainda assim, a participação na ‘Reconquista’ deu ao grego algum crédito. Isto porque os erros de Bruno Varela e Mile Svilar na época anterior continuavam frescos na mente dos benfiquistas.

    A partir daí, a vida de Vlachodimos no Benfica tem sido uma autêntica odisseia. E ainda que uma das definições desta palavra – que deriva precisamente do nome “Odysseus”, o herói grego e rei de Ítaca que nós, latinos, chamamos de Ulisses – seja “narrativa de aventuras extraordinárias”, neste caso talvez se apliquem outras definições como “viagem cheia de aventuras e dificuldades” e “série de acontecimentos trágicos e variados”.

    Odysseas Vlachodimos num jogo da UEFA Champions League
    Fonte: Carlos Silva/Bola na Rede

    Volvidos mais de cinco anos desde a sua apresentação oficial, Vlachodimos terá mesmo perdido a titularidade na baliza encarnada, com a mais recente derrota no Bessa a ser a “gota de água”. Para Roger Schmidt, o guardião internacional pela seleção grega “não teve o melhor dia dele”. Apanhando toda a gente de surpresa, a opção do técnico alemão para o duelo contra o CF Estrela da Amadora recaiu sobre o jovem Samuel Soares.

    É preciso recuarmos até à época 2020/2021 para nos recordarmos da última vez que Vlachodimos foi excluído do onze inicial por mera opção técnica. Na altura, Jorge Jesus deu a titularidade a Helton Leite, que viria a ser “dispensado” por Roger Schmidt mais tarde.

    Ainda que a opção do técnico português tenha sido questionada, começa-se, hoje, a perceber que talvez o Benfica tenha demorado muito para resolver um notório problema.

    Odysseas Vlachodimos sempre foi descrito como um guarda-redes muito forte entre os postes, mas com alguns problemas fora deles. E ainda que seja justo reconhecer qualidades ao grego nesse parâmetro, os seus números estão muito longe de serem animadores para qualquer benfiquista. Olhando para os dados de 2010 para cá, só Roberto Jiménez tem uma média de golos sofridos por jogo superior ao grego. Contudo, isso só por si diz-nos pouco acerca de um guarda-redes, sendo mesmo necessário ter cuidado nesse tipo de avaliações, uma vez que nem todos os golos sofridos são da responsabilidade direta do último homem.

    Para além disso, as dificuldades de Vlachodimos no controlo da profundidade e no jogo de pés são demasiado limitadoras para o modelo de Roger Schmidt. O Benfica pressiona alto em quase todos os seus jogos e não possui defesas-centrais propriamente rápidos, daí a necessidade de ter um guarda-redes bastante astuto no controlo do espaço entre si e a defesa. Odysseas peca muita nesse aspeto.

    No que diz respeito ao jogo de pés, é cada vez mais importante que o guarda-redes seja uma solução (e não um problema) no momento em que a equipa tem a posse de bola. Parece-me justo dizer que os encarnados denotam claras dificuldades na primeira fase de construção, e em jogos contra equipas que pressionam alto e bem, é essencial ter um guarda-redes capaz de encontrar linhas de passe atrás da pressão adversária. Aliás, na temporada passada, Diogo Costa (SL Benfica 1-2 FC Porto) e André Onana (SL Benfica 0-2 FC Inter de Milão) foram ao Estádio da Luz dar, cada um, uma “aula” de como saltar/evitar com qualidade a pressão do adversário.

    A caminho de completar a sua sexta temporada de águia ao peito, Vlachodimos nunca foi capaz de oferecer algo parecido ao jogo do Benfica. Em contrapartida, Samuel Soares – que, a meu ver, ainda não está preparado para assumir a baliza das águias – mostrou a importância de ter um guarda-redes com essas características numa equipa que se espera que domine por completo 80% dos seus adversários.

    Posto isto, a passagem de Vlachodimos para o banco só surpreende quem não anda com atenção às fragilidades do Benfica, mas poderá vir a ser um problema para a estrutura liderada por Rui Costa. Já neste ano, o atleta de 29 anos renovou contrato com as águias até 2027 e, segundo a imprensa, passou a receber o maior salário de sempre – quase dois milhões de euros limpos – de um guarda-redes no clube.

    Tendo em conta o desgaste na relação com os adeptos, o suposto “problema” com Roger Schmidt e a chegada de Anatoliy Trubin, um dos mais promissores guarda-redes do mundo, por 10 milhões de euros, a saída do clube encarnado parece o caminho mais certo a seguir por parte de Vlachodimos.

    Em boa verdade, o Benfica já perdeu o melhor timing de venda para Odysseas. No final da temporada 2021/2022, terão mesmo surgido alguns interessados na aquisição do grego (Ajax à cabeça), mas o clube encarnado acabou mesmo por reter o guardião.

    Não se conhecem as justificações, nem tampouco a quantia pedida pelas águias, mas é normal que paire um certo arrependimento nas hostes encarnadas.

    Nessa temporada, Vlachodimos destacou-se principalmente na Liga dos Campeões. A prestação do grego na competição foi fantástica e bastante elogiada além-fronteiras. É justo afirmar que Odysseas, por mérito próprio, constituiu-se como um dos principais responsáveis pela caminhada vermelha e branca até aos quartos-de-final.

    O grego chegou mesmo a ser o segundo guarda-redes com mais defesas na competição, apenas superado por Thibaut Courtois.

    Tal como o Benfica aproveitou o hype criado à volta de Darwin Nuñéz, resultado também da sua excelente prestação europeia, para vendê-lo por uma quantia altamente inflacionada, podia (e devia) ter feito o mesmo com Odysseas Vlachodimos, mesmo que esses valores não chegassem sequer perto dos 75 milhões de euros pelos quais venderam o uruguaio.

    Mesmo no meio de uma equipa recheada de problemas, tanto um como o outro saíram (sobre)valorizados da temporada 2021/2022, mas o Benfica aproveitou apenas a situação do atual avançado do Liverpool FC.

    Perdida a oportunidade de ouro, e como diz o ditado, “não adianta chorar sobre o leite derramado”. É natural que Vlachodimos continue a ter algum mercado, até porque 21/22 não foi há muito tempo. Na época passada, o grego voltou a ser peça “indiscutível” no onze encarnado, e em cinco épocas completas de águia ao peito, só por uma vez não realizou mais de 45 jogos.

    Contudo, é difícil acreditar que Vlachodimos venha a ser aposta frequente num clube de maior ou igual dimensão ao Benfica, mas a saída para um campeonato mais competitivo poderá funcionar como elemento atrativo para o guarda-redes. Além disso, há sempre a possibilidade de surgirem interessados nos mercados árabes, dando a Odysseas a oportunidade de realizar o “contrato da sua vida”.

    Falta sensivelmente uma semana para o fecho do mercado em Portugal e nos principais campeonatos da europa, mas as portas de entrada para outros países como Rússia (14 de setembro), Turquia (15 de setembro) e Arábia Saudita (20 de setembro) continuarão abertas por mais uns dias.

    Uma coisa é certa: o Benfica precisa urgentemente de resolver o “problema” Vlachodimos. Não me parece que voltar a dar a titularidade ao grego seja, desportivamente falando, benéfico (Trubin é superior), mas deixá-lo a desvalorizar no banco também não é o caminho ideal. A solução terá de passar por uma venda, permitindo ao clube aliviar a folha salarial e obter um encaixe financeiro, mesmo que não seja significativo.

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