Schmidt às segundas | SL Benfica

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    O mistério adensa-se à medida que olhamos para trás e vemos o mau exemplo dos últimos treinadores campeões pelo Benfica, inexplicavelmente sempre piores que no retumbante ano de estreia. Jesus passou as passas do Algarve naquele desgastante 2010-11, com derrota a toda a linha contra Villas Boas; Rui Vitória, apesar de até ter feito a dobradinha, não a atingiu com o mesmo brilhantismo com que ganhou o campeonato no ano anterior; e a hecatombe de Bruno Lage em 2019-20, depressão profunda para a qual ainda não se encontraram motivos totalmente válidos.

    Que tem o destino guardado para Roger Schmidt? Principalmente, e a pergunta a fazer é esta sobretudo, o que podem esperar os adeptos benfiquistas? Merecerão nova vaga de tristeza após ano de delírio? Fizemos trouxa e partimos á procura duma resposta, vasculhando no passado do treinador alemão a ver se saltavam pistas. E aí estão elas!

    RED BULL SALZBURGO

    O ano de estreia, 2012-13, não correu de todo mal a Roger Schmidt, que foi segundo posto numa Liga onde o peso histórico do Austria de Viena ainda amedrontava uns homens da Red Bull em início de projecto. Cinco pontos atrás do líder, fruto dos incómodos 11 empates em 36 jogos – mas 22 vitórias e 91 golos marcados eram já números de concorrente sério ao título e prometiam melhorias substanciais.

    No segundo ano, tudo Schmidt levou, numa rajada de futebol de ataque assente no dom futebolístico de Gúlacsi, Hinteregger, Kevin Kampl, Sadio Mané ou Jonathan Soriano (que, nossa senhora, faz 48 golos! no total da temporada) – campeonato no bolso com 25 vitórias, 110 golos marcados (3,05 por jogo, no Benfica 2022-23 fez …2,41) e 35 sofridos, menos quatro que no primeiro ano; Taça também para o Museu com 34 golos marcados em… seis jogos e Liga Europa assinalável, com uma fase de grupos exemplar – seis jogos e seis vitórias – e a eliminação do Ajax nos 32 avos, para depois cair ingloriamente perante o Basileia na ronda seguinte.

    BAYER LEVERKUSEN

    Passar a Bundesliga austríaca a ferro normalmente dá direito a tentar o nível acima de dificuldade. Como tal, surgiram prontamente os farmacêuticos da Bayer a dar-lhe oportunidade de melhorar o trabalho de Sami Hyypiä, o lendário central finlandês que os tinha levado ao terceiro lugar interno e aos Oitavos da liga milionária.

    Schmidt percebeu o intuito e começou a implementar o seu plano, ainda que não se tenha logo notado grande coisa: 2014-15 deu quarto lugar (17 vitórias em 34 jornadas, 62 golos marcados e 37 sofridos) e outros Oitavos uefeiros, até cair aos pés de Simeone. Son e Bellarabi renderam 11 golos na liga, Kiessling foi o melhor marcador no total da temporada, com 18. Faltasse talvez mais poder de fogo…

    E em 2015-16 conseguiu-se a contratação de Chicharito, o mexicano coqueluche de Alex Ferguson e que viu na Alemanha lugar mais apropriado para continuar a carreira depois da queda do United. Agradeceu Schmidt, que salivou a pensá-lo como último homem do seu 4-4-2: resultou bem, foram 26 golos que ajudaram ao terceiro lugar (com 18 vitórias em 34 jogos) mas que não trouxeram melhorias a nível internacional – compreensivelmente, quando se calha num grupo com aquele Barcelona e aquela Roma.

    Mas bem, ainda deu para ir à Liga Europa eliminar o Sporting de Jorge Jesus (com 4-1 no agregado) antes de levar um calduço do Villareal de Marcelino Toral (os espanhóis que só cairiam nas Meias contra o… Liverpool de Klopp).

    BEIJING GUOAN

    Antes de começarmos a dissecar a estadia em Pequim, convém fazer a achega: aqui contou-se a temporada 2018 como a primeira, apesar de Schmidt ter chegado em 2017; porque se consideraram esses meses de 2017 como uma pré-época prolongada, onde não teve dedo no plantel nem condições para impor ideias de fresco.

    2018, depois desse banho-maria para se ambientar, serviu para elevar patamares competitivos e colocar o Guoan mais próximo das principais potências internas. Na Liga houve 4.º lugar (com 15 vitórias em 30 jogos, 64 golos marcados) e na Taça houve uma surpreendente conquista, que justificou toda a paixão da massa adepta, que já andava toda enamorada do seu futebol de zaragata ofensiva. Foi amor à primeira vista e que durou até à última.

    Foi em crescendo: não se esperava é que o Guoan de Schmidt explodisse tão cedo ou que o projecto resultasse tão prematuramente. Chega 2019 e os resultados são inimagináveis, com liderança da prova até à 18ª jornada e dez vitórias nas primeiras dez jornadas (com 22 golos marcados e… três sofridos!) – e, como que uma daquelas curiosas sugestões do destino, a espectacular sequência seria estragada por vilões já populares de outros contos, de histórias benfiquistas. À jornada 11, Schmidt visita a casa do SIPG… de Vítor Pereira e Hulk. E assim acaba o registo perfeito.

    Saíria do clube a 31 de Julho, já no terceiro lugar depois de duas derrotas consecutivas, que foram a gota de água para um impaciente director que não gostou da eliminação na Champions asiática – que não foi nada escandalosa, dado que o sorteio tinha colocado Urawa Red Diamonds e Jeonbuk Hyunday Motors no seu grupo, japoneses e coreanos com muita mais tradição.

    Outra curiosidade que serve para demonstrar o fabuloso olho de Schmidt para o talento: a esses mesmos coreanos tinha sido contratado, no início desse ano, um rapazinho defesa-central que enchera as medidas ao alemão. Dava pelo nome Kin Min Jae, o actual portentoso defensor do Nápoles – que na equipa chinesa fazia agora dupla com Yu Dabao, aquele que foi formado no Benfica como ponta de lança.

    Schmidt, precisando de alguém para marcar Graziano Pélle na final da Taça de 2018, vira nesse avançado desengoçado o mais competente do plantel na marcação individual. Resultou!

    PSV EINDHOVEN

    Contra o Ajax de Ten Haag seria sempre uma missão hercúlea. No contexto Eredivisie é difícil lembrar quem tenha sido tão dominador e por isso Roger chegava a Eindhoven com muito trabalho por fazer e coragem para ganhar. Claro que o primeiro ano não foi de sonho, mas correu bem, com bom futebol e os mínimos exigíveis. 2.º lugar no campeonato com 21 vitórias em 34 jogos, 74-35 em golos, Quartos na Taça e 32 avos de final na Liga Europa, depois dum primeiro lugar nos grupos. Malen, como Gonçalo Ramos na primeira época de Schmidt em Lisboa, faz 19 golos na Liga e 27 em todas as competições.

    No segundo ano, como na China, evolução descarada: se o segundo lugar se manteve, acrescentaram-se vitórias (26 em vez de 21) e golos (que foram 86, mais doze); venceu-se a Supertaça com um espectacular 4-0 ao Ajax (se bem que a goleada foi devolvida em meados de Outubro) e a Taça é ganha aos mesmos rapazes, ainda que com um resultado mais aborrecido (2-1). Mas cedo se percebeu que o plantel responsável pelas melhorias substanciais estava espremido até não poder mais, sobretudo pela caminhada europeia.

    O primeiro grande embate foi com o Benfica no play-off milionário: a desvantagem de um golo trazida de Lisboa pedia resposta mais desenrascada em casa (onde se ficou a zeros); caídos na Liga Europa, nunca se deu prioridade à competição, o que resultou em terceiro lugar num grupo com Mónaco e Real Sociedad; dando outro trambolhão até à Conferência, cambaleou-se desinteressadamente até aos Quartos, encruzilhada onde apareceu Brendan Rodgers com o seu Leicester – e Schmidt, percebendo que não era desafio bastante para meter em causa os trabalhos internos e que a manta não esticava, deixou-se ir derrota abaixo.

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    Pedro Cantoneiro
    Pedro Cantoneirohttp://www.bolanarede.pt
    Adepto da discussão futebolística pós-refeição e da cultura de esplanada, o Benfica como pano de fundo e a opinião de que o futebol é a arte suprema.