SL Benfica 3-4 CD Santa Clara: É preciso dizer mais?

    Do afundar benfiquista já muito se disse e a equipa faz questão de mostrá-lo a cada jornada que passa. Olha-se pois, à distância de uma semana, para a vitória em Vila do Conde como acidente de percurso, como a excepção à regra derrotista de uma equipa em queda livre e sem sinais de retoma em qualquer aspecto. Com a hecatombe desta tarde, o recorde de pior série em casa do século foi alcançado – desde 1931 que o SL Benfica não estava cinco jogos sem vencer como visitado. É preciso recuar até 4 de Fevereiro para se assistir à conquista dos últimos três pontos, frente ao Famalicão (3-2).

    Não foi um jogo fácil. Atípico. Muito à custa de um conjunto açoriano muito bem preparado por João Henriques e que merece todo o reconhecimento pela exibição na Luz e pela monumentalidade da sua conquista: o CD Santa Clara foi atrevido, manietou o já cadavérico adversário, encarando-o olhos nos olhos. Fez-se predador oportunista, aproveitando as fragilidades que desde cedo sentiu. Cheirou-lhe a sangue e só descansou aos 94 minutos, quando finalmente deu a estocada final.

    A primeira parte foi-nos apresentada como já é habitual: encaixe das peças no tabuleiro de jogo, Benfica a querer impor-se, mas sem reais capacidades para discernir convenientemente os caminhos para o golo. Com os encarnados inofensivos, salvo duas excepções, os insulares não tiveram pejo em cavalgar rumo à outra baliza na procura da felicidade, obrigando Vlachodimos a atenção redobrada – algo que já se tornou também rotina, naturalmente.

    Se Rashid brilhava ao mesmo ritmo que Gabriel se ia afundando na mediocridade, Thiago Santana baralhava as contas à jovem dupla de centrais encarnada. E se estas diferenças entregavam confiança aos insulares, o perpétuo eclipse de Rafa e Pizzi não obrigava a muitos cuidados no balanceamento para zonas de ataque. Ainda para mais com a presença de Fábio Cardoso, a puxar do brio profissional e a assinar exibição categórica frente ao clube formador, limpando todas as investidas encarnadas rumo à baliza de Marco Rocha que se tornavam, uma e outra vez, infrutíferas. Só Seferovic ameaçou seriamente a manutenção do nulo, mas falta jeito a tanta vontade…

    O 0-1, já na antecâmara do intervalo, nasce do erro de um dos elementos mais prostrados e que continua sem convencer – Nuno Tavares foi lançado, à obrigação da lesão do titular, na pior fase da época e tem sido visível a consternação com que actua no flanco esquerdo, longe da qualidade que lhe é reconhecida. Foram erros, foram falhas constantes de concentração e a sensação de se sentir pouco confortável em campo.

    A segunda metade de loucos só ajuda ao entendimento de que o Benfica é uma equipa desfigurada, sem a liderança necessária em alturas de nervos – Pizzi, que Lage apontou durante a semana como exemplo máximo para os colegas dentro de campo, é incapaz de puxar dos galões e assumir-se como referência nas operações, preferindo… esconder-se – tornando-se, assim, num conjunto gerido por impulsos. Há correrias maníacas, há golos de rajada e, logo de seguida, a incapacidade mórbida de gerir a posse de bola, resultando em fases de futebol surreal onde o caos reina, dono e senhor.

    Se o 1-1 aos 50’ empolgava as camisolas vermelhas, o 1-2 logo de seguida foi balde de água fria e demonstrativa de uma das maiores fraquezas deste Benfica: a bola parada defensiva. Não são visíveis quaisquer melhorias neste capítulo, diga-se.

    Como já dissemos, de rajada vieram dois golos de Vinicius – entrado na segunda metade juntamente com Zivkovic – para tentar dar conforto à pilha de nervos que regia o conjunto de Bruno Lage. O sérvio, com apenas 59 minutos completados em 2019-20, bem tentou empregar as suas boas características no fio de jogo da equipa, tentando combinar várias vezes com Rafa e André Almeida pelo corredor direito. A falta de ritmo impediu contribuição válida e a equipa continuava nervosa, insegura, receosa da sua própria doença: Weigl e Taarabt, já no lugar que tinha sido de Gabriel, bem tentavam estabilizar a máquina. Mas foi em vão…

    E nesta tremeliqueira se ficou até ao penalty cometido por Rúben Dias, em bola na mão numa embrulhada na área encarnada e que obrigou João Pinheiro a consultar o VAR. Uns minutinhos de espera e voilá, braço estendido para a marca de cal. Cryzan finalizou com sucesso e 3-3.

    Ora, a uma equipa que foi incapaz de se superiorizar a nove elementos do Rio Ave, seria sempre ingénuo pedir que o fizesse a onze elementos do Santa Clara. Apesar da ânsia em alcançar o quarto golo, não existiam quaisquer associações positivas na chegada à área, num futebol desconectado e à mercê do batalhão organizado que defendia calmamente o cerco defeituoso. Já quando a esperança era sentimento longíquo e a bola andava perdida em disputas junto da linha lateral, há carambola no miolo e as lanças partem de forma confiante rumo à baliza de Vlachodimos. Vítimas de  processos simples, mas eficazes, os atarantados escudeiros do grego foram ficando pelo caminho e Zé Manuel, em boa definição, matou uma águia já depenada. O Açor voou mais alto.

    A FIGURA

    Fonte: CD Santa Clara

    Osama Rashid – Não marcou, mas não precisa de o fazer para ser a peça mais cintilante do seu conjunto. Arquitecto, faz todas as contas necessárias ao funcionamento da máquina que se envolve sobre si, elevando o nível de quem a seu lado joga. Corrige erros, ajeita posicionamentos e faz sobressair a qualidade colectiva. Craque.

    O FORA DE JOGO

    Fonte: Carlos Silva/Bola na Rede

    Gabriel – Continua irreconhecível. Longe dos índices físicos de outros tempos, não colabora no sucesso da equipa e a lentidão que lhe é característica faz atrasar a circulação de forma exaustiva. A saída ao intervalo foi um claro atestado à qualidade da sua exibição.

    ANÁLISE TÁTICA – SL BENFICA

    O 4-4-2 habitual mumificou-se à custa das dinâmicas emprestadas por Adel Taarabt a principiar em zonas tão adiantadas – o marroquino prefere encarar o jogo de frente, descendo involuntariamente no terreno e a equipa é obrigada a procurar depois soluções em 4-3-3, à falta de alguém na zona circundante ao ponta-de-lança. Quando ao intervalo Lage faz entrar Zivkovic, é Rafa quem explora esses terrenos: a equipa melhorou em certos momentos, mas a desfaçatez com que são ignoradas rotinas passadas não pode ser apenas resultado da ausência de Félix ou Jonas.

    11 INICIAL E PONTUAÇÕES

    Vlachodimos (8)

    André Almeida (3)

    Rúben Dias (3)

    Ferro (3)

    Nuno Tavares (2)

    Weigl (5)

    Gabriel (1)

    Taarabt (5)

    Pizzi (2)

    Rafa (2)

    Seferovic (2)

    SUPLENTES UTILIZADOS

    Zivkovic (3)

    Vinícius (8)

    Dyego Souza (-)

    Cervi (-)

    ANÁLISE TÁTICA –  CD SANTA CLARA

    João Henriques preparou-se convenientemente. O seu losango predilecto em 4-4-2 tanto se estende em formato clássico, em linha, como se transfigura para 4-3-3 e até para defesa a 3, fechando espaços na zona central e libertando os laterais. A equipa é flexível e adapta-se a todos os momentos e dificuldades que a confrontam, numa incrível dança sincronizada muito bem interpretada por todas as peças. Não é descabido falar-se, cedida seja a liberdade do calão, em “banho tático”.

    11 INICIAL E PONTUAÇÕES

    Marco Rocha (6)

    Rafael Ramos (7)

    Fábio Cardoso (9)

    João Afonso (8)

    Sanusi (8)

    Francisco Ramos (7)

    Rashid (9)

    Anderson (8)

    Costinha (7)

    Thiago (9)

    Carlos Carvalho (8)

    SUPLENTES UTILIZADOS

    Crysan (7)

    Néné (5)

    Mamadu Candé (5)

    Salomão (4)

    Zé Manuel (7)

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    Pedro Cantoneiro
    Pedro Cantoneirohttp://www.bolanarede.pt
    Adepto da discussão futebolística pós-refeição e da cultura de esplanada, o Benfica como pano de fundo e a opinião de que o futebol é a arte suprema.