O Académico de Viseu em 2023/24: por que está a correr mal, quando o projeto tinha tudo para dar certo?

    O Académico de Viseu FC terminou a temporada de 2022/23 na quarta posição da Segunda Liga. No entanto está a ter um arranque de 2023/24 para esquecer.

    O Académico de Viseu FC é um emblema “clássico” da Segunda Liga. Está presente no escalão desde 2013/14 e durante este período de tempo já esteve envolvido em todo o tipo de lutas. Porém, a temporada de 2022/23 era diferente. O clube beirão tinha um investidor: Mariano Maroto López. O espanhol tinha reforçado a equipa com elementos pouco conhecidos para a maioria do público, mas que encantaram o Fontelo com o passar da época, sendo que alguns poderiam disputar a Liga Portugal sem qualquer tipo de problemas, em equipas totalmente consolidadas. Aparentava ser um projeto estruturado, com objetivos definidos e sem grandes loucuras. O bom trabalho realizado nos vários departamentos convenceu o adepto viseense que a subida de divisão seria um objetivo plausível, nomeadamente com Jorge Costa ao leme. O dia 21 de abril de 2023 é muito importante para entender o momento atual do Académico. Jorge Costa abandonou a instituição, numa saída muito mal explicada e que divide os aficionados do emblema da Beira Alta. Uns atiram as culpas para a direção, os outros para o antigo capitão do FC Porto. A verdade é que Jorge Costa está bem da vida e longe de Viseu. Ocupa o terceiro posto da Segunda Liga com o AVS Futebol SAD e até tem tempo de comentar a vida institucional do FC Porto, apoiando os atos de André Villas Boas e condenando (e bem) os ataques que o técnico tem sofrido.

    Voltando a 2022/23, o Académico não subiu de divisão e teve um final da época para esquecer. A dupla Pedro Bessa- Gil Oliveira mostrou-se incapaz de suprimir a ausência do “bicho” e sofreu quatro derrotas nos últimos seis jogos. A luta pelo acesso ao play-off com o CD Estrela da Amadora foi perdida de goleada, com a turma de Sérgio Vieira a acabar com mais dez pontos na tabela classificativa. O quarto lugar pareceu insuficiente, mas deu a impressão que pelo menos a ideia de crescimento estava lá e que cidade e clube estavam novamente unidos, nomeadamente nas vitórias.

    Com uma apresentação cheia de “pompa e circunstância”, realizada na zona histórica da cidade, o Académico de Viseu conseguiu vender aos adeptos a ideia de que iria lutar pela subida, alcançando a manutenção de André Clóvis, a sua estrela maior de 2022/23, que faltou a grande parte da pré-temporada porque queria sair e tinha (alegadamente) uma proposta financeira muito superior. Contudo, não foi só o avançado brasileiro que ficou. A espinha dorsal acabou por se manter: Domen Gril, Arthur Chaves, André Almeida, Messeguem, Famana Quizera e Gautier Ott. Somente podem ser consideradas perdas relevantes as saídas de Tiago Mesquita e de Jonathan Toro (Rafael Bandeira é um caso totalmente à parte).

    Fonte: Bernardo Benjamim/Bola na Rede

    À data em que se escreve este artigo (antes do duelo contra o FC Porto B), o Académico de Viseu ocupa a décima quarta posição da Segunda Liga, com somente 11 pontos conquistados. Não foi isto o prometido aos adeptos viseenses. Há quatro pontos que justificam este péssimo arranque de época.

    • Escolha do treinador

    Vítor Martins foi o eleito para assumir o cargo de treinador principal, levando a que Pedro Bessa e Gil Oliveira regressassem aos seus postos “normais”. O técnico ficou conhecido pelo trabalho realizado no Leixões SC, acabando por salvar a turma de Matosinhos da despromoção à Liga 3. A sua ligação ao presidente do FC Porto também é sobejamente conhecida, mas quer-se acreditar que não foi o motivo da sua escolha. A verdade é que foi um tiro bem ao lado. Num total, Vítor Martins conseguiu duas vitórias, quatro empates e quatro derrotas, acabando por ser demitido.

    Depois de uma temporada em que se esteve relativamente próximo de uma hipotética promoção, pelos braços de um técnico experiente, a direção optou por um caminho distinto, já que Vítor Martins nunca esteve envolvido nessa luta e não possui muita experiência. O ideal teria sido a chegada de um nome mais forte, com outro traquejo, mas isso acabou por não acontecer. Vítor Martins não estava preparado para o desafio, mas talhado chegará lá. Jorge Simão, com muito mais rodagem, chegou para o substituir contudo, ainda é cedo para se realizar uma avaliação, mesmo que preliminar. Afinal, é inocente de toda esta situação.

    Vítor Martins sofreu um problema, que Jorge Simão poderá vir a sofrer. O nome de Jorge Costa ainda paira no ar. Está difícil para os adeptos do Académico esquecerem o antigo treinador, sendo que muitos garantem que com ele os viseenses estariam na Liga Portugal. Faz lembrar o conto de Jorge Jesus no CR Flamengo, mas neste caso houve realmente grandes triunfos, que fizeram os adeptos suspirar e muitos sonharem com o seu regresso, qual cavaleiro andante. Enquanto não se ultrapassar a “febre Jorge Costa” será complicado que um técnico tenha paz completa no Fontelo, seja ele Jorge Simão ou José Mourinho.

    Zé Pedro e Marquinho no Oliveirense vs Académico
    Fonte: Bernardo Benjamim/Bola na Rede
    • A “seca” de André Clóvis

    Há que ser realistas. O Académico não teria os resultados produzidos em 2022/23 se o seu ponta de lança não tivesse atingido a melhor temporada da sua carreira. André Clóvis foi o melhor marcador da Segunda Liga. Marcou 28 golos em 34 jogos.  Num total, o seu clube marcou 51 golos. O brasileiro fez 54,9% dos golos dos “viriatos” no campeonato. Essa percentagem baixou drasticamente em 2023/24. O facto é que André Clóvis só marcou um golo nesta edição, em nove partidas. Passou de homem-chave a ser criticado pelo Fontelo, chovendo gritos a dizer que merecia ir para o banco. Este ano possui mais concorrência, com a chegada de Petkov. O Académico é um dos piores ataques da Segunda Liga e isso dificulta a sua própria situação. Quando se quer lutar pela promoção, é obrigatório que exista um goleador e o do Académico está em baixo de forma e deixou de valer (tantos) pontos. A sua “birra” na pré-temporada só ajudou os críticos. Em jeito de conclusão deste tópico, Mariano Maroto López pode ter perdido uma grande oportunidade de vender este atleta por uma bela maquia, caso o mesmo não volte aos registos anteriores, que nunca tinha apresentado em outra temporada, sem ser a sua de estreia no Fontelo (descartamos a sua performance nos Sub-23 do Portimonense SC, pois não é algo profissional). O verão de 2023 pode não voltar a repetir-se.

    André Clóvis e Guilherme Soares no Académico vs Oliveirense
    Fonte: Bernardo Bejamim/Bola na Rede
    • Má forma geral e maior conhecimento dos jogadores por parte dos adversários

    O plantel do Académico de Viseu tem qualidade. Como disse anteriormente, a base do ano passado está lá. No entanto, certos jogadores estão a apresentar um rendimento muito inferior ao de 2022/23, sendo que o final dessa temporada foi longe de ser famosa. Assistimos a um decrescendo de alguns atletas que está a atingir o seu apogeu. O Académico deixou de dominar jogos para passar a ser dominado e certos pormenores foram-se perdendo. O exemplo máximo disto é Gautier Ott. O francês conseguia fazer todo o corredor esquerdo durante 90 minutos, com elevado padrão de qualidade, mas acabou por desaparecer. Em 13 jogos, soma apenas um golo e nenhuma assistência (foram 10 na temporada passada). Famana Quizera tem números, com quatro golos e três assistências, mas farta-se de tomar más decisões dentro de campo, algo que não acontecia com tanta recorrência. Yuri Araújo tem sido o mais inconformado, podendo ser considerado o único ponto positivo deste arranque de temporada, neste aspeto. Outro exemplo ilustrativo é André Clóvis, mas o mesmo já foi exibido. Jorge Simão terá a missão de recuperar os seus jogadores, nomeadamente os que eram protagonistas.

    O maior conhecimento por parte dos adversários sobre os atletas do Académico de Viseu é um diferencial. Anteriormente, muitos dos craques não era conhecidos ou não tinham sido estudados à mesma profundidade que jogadores que já estavam no nosso campeonato. Hoje em dia Soufiane Messeguem, Arthur Chaves ou Gautier Ott estão mais que identificados, conhecendo-se as suas habilidades e os seus defeitos. Isto é um fenómeno normal no mundo do futebol, com o desenvolvimento do scouting, mas que fica mais à vista com a má forma do conjunto viseense. Quanto menor a performance e motivação, mais fácil fica para os adversários parar uma equipa, seja o Académico, seja o FC Barcelona.

    Schutte, Ott e Milioransa a disputarem a bola no Académico vs Oliveirense
    Fonte: Bernardo Benjamim/Bola na Rede
    • Mercado de 2023/24: tudo correu mal?

    O mercado de 2023/24 desenvolveu-se bastante tarde em Viseu. O primeiro nome a ser anunciado, sendo num bom timing, foi de João Pinto, proveniente do CD Feirense. O problema é que as restantes mexidas já ficaram para uma fase adiantada, não tendo direito a pré-temporada com os seus colegas. Henrique Gomes e Miguel Bandarra ainda chegaram no mês de julho, mas na última semana de mercado aterraram no Fontelo cinco atletas.

    O período de transferências não me parece que tenha sido totalmente feliz para o Académico. Não só pelas entradas, mas também pelas saídas. Acabaram por abrir a porta a líderes de balneário, que até podiam não fazer total diferença dentro de campo, mas que eram fundamentais para a dinâmica do plantel. Luisinho, Tiago Mesquita e Ricardo Janota (este integrado na estrutura, como treinador de guarda-redes) estão a fazer falta, pela experiência que tinham e pelo conhecimento do clube que possuíam, passando os valores aos mais jovens.

    Um outro ponto que se pode eventualmente criticar é a qualidade dos nomes que chegaram. Nenhum deles ainda demonstrou capacidade de fazer a diferença, em comparação com quem vieram substituir. Samba Koné apresentou alguns traços, mas esteve lesionado. A culpa pode ser igualmente da falta de uma pré-temporada, mas em certos exemplos pode-se antever o fracasso. Isto coloca em “xeque” o trabalho de Pedro Bessa, atual diretor desportivo. O bom mercado de 2022/23, com clara influência da SAD e de seus conhecimentos, está a começar a ser esquecido. Pedro Bessa teve uma notória presença nas transferências de 2023/24, além de ser um membro influente no dia-a-dia do clube. Com a saída de Vítor Martins do cargo de treinador, passou a ter a mira em si (Fernando Ferreira é absolutamente intocável) e as críticas dos adeptos são mais que muitas.

    No ano passado chegaram elementos de outras escolas (alguns já estavam cedidos, anteriormente), de elevado quilate. Famana Quizera veio do Borussia Monchengladbach, Domen Gril do TSG Hoffenheim, assim como Ott (Mariano Maroto López tem uma percentagem desta equipa). Esta época foi diferente, com atletas a chegarem de mercados inferiores ao português. Certo que alguns jogadores já cá estavam, como Sori Mané, Petkov, Bandarra ou Henrique Gomes, mas nota-se o downgrade.

    Henrique Gomes
    Fonte: Luís Resende Silva / Bola na Rede

    No fundo, não parece existir uma harmonia na equipa de 2023/24. Em certos momentos, a máquina emperra, algo que não era tão recorrente. O grupo parece menos unido, com menos dinâmicas e é algo a ser trabalhado por Jorge Simão, com relativa urgência. Dentro do balneário, a Sociedade das Nações aumentou, o que pode não facilitar a tarefa (por uma questão linguística, já que os bons jogadores nascem em todo o lado). São 16 nacionalidades diferentes, o que pode suscitar à criação de vários polos complicados de unificar (futebol não é Ted Lasso, mas um balneário separado não funciona).

    Em suma, o Académico de Viseu ainda vai a tempo de lutar pela promoção. A Segunda Liga é um campeonato longo, onde muitas equipas podem tropeçar contra qualquer adversário. Porém, a turma liderada por Mariano Maroto López, que apresentara um dos projetos mais entusiasmantes de Portugal, deu uma aula em como arrancar mal uma temporada.

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