“O Elvas” | O cometa dos 40

    Um padrão vai-se descortinando na importância d’O Elvas no futebol nacional: de 40 em 40 anos, “O Elvas” surge no meio das nossas tendências mediáticas quase a exigir para que não se esqueçam dele, do futebol alentejano e do constantemente esquecido interior.

    Em meados dos anos 40, existiam por Elvas três filiais dos, à época, maiores clubes: o Sport Lisboa e Elvas ostentava a águia, o Sporting Clube Elvense tentava rugir e o Clube de Futebol “Os Elvenses” pensavam na Cruz de Cristo a cada pontapé na bola.   

    O mais proeminente dos seguidores alentejanos era o benfiquista, participando na 1.ª Divisão desde 1945-46, conseguindo a custo a manutenção. Ao fim da segunda época no firmamento competitivo, chegou-se a um consenso: ou era reforçada a ajuda do clube-mãe ou o filho não tinha meios para continuar a evoluir. Situação insustentável gritaram também os filhos do Leão.

    Em 1947 tornava-se oficial a vontade das filiais em ser independentes, com outra questão a impor-se na discussão – então e se nos juntarmos, para bem do nosso Alentejo e da Elvas?

    Assim nascia o Clube Alentejano dos Desportos “O Elvas”, fusão utópica entre rivais eternos. Era agora preciso oportunidade para cimentar a junção, uma oportunidade de sobressair e afirmar-se enquanto instituição forte e independente, que conseguia muito bem viver sozinha. Não foi preciso esperar muito: nos derradeiros momentos de 1947-48, Benfica e Sporting seguiam coladinhos no topo da tabela, mesmos pontos.

    O Sporting tinha ganhado vantagem no confronto directo fruto dum dilacerante 4-1 na casa dos encarnados. Para tal, muito contribuiu a obra-prima de Fernando Peyroteo (o poker é dele mesmo) e de Cândido de Oliveira, lenda máxima do nosso futebol e artesão dos Cinco Violinos. Reza a lenda que, nessa tarde, quase se ia despedindo – nos corredores e gabinetes do Lumiar, diziam alguns que Cândido, como bom e assumido benfiquista, ainda que competentíssimo (provando a ciclicidade da História), ia entregar o jogo para permitir ao seu coração a alegria do título.

    Os antigos mencionam ainda que, na palestra, e mais triste que o habitual, Cândido soltou apenas um «sejam vocês próprios» e nada mais. Acabando o jogo, apresentou prontamente a demissão por “não admitir que atentassem contra a sua idoneidade”. Um dos dirigentes má-língua, ou pelo menos o mais digno, fez mea culpa e tratou de resolver o assunto, tendo também ele mesmo apresentado a demissão. Tentativa de sacrifício criador. Morreria ele pelos seus pecados  e que isso permitisse a continuidade do treinador. O coração de Cândido falou mais alto, decidiu ver naquilo um drama pateta e, finda a parvoíce, ordenou: ficariam os dois e ponto final.

    Mas bem, iam os rivais taco-a-taco. Ombro com ombro e eis que na antepenúltima jornada o Sporting tem que ir a Setúbal. Jogar nos Arcos não era fácil e lá vai disto, disse o Vitória – 1-0. Ficavam os leões à mercê da vontade do Benfica, que recebia O Elvas no Campo Grande.

    O Benfica não resistiu à fúria alentejana pela glória. E quando essa fúria é personificada na figura de Patalino, o lendário aríete que só não foi maior pelas comoventes saudades de casa mesmo antes de ir embora, alguém se mete a jeito: dois golos antes do intervalo impuseram o 1-2 final, decepção imensa para benfiquistas – onde se incluía o próprio Patalino que, rejeitando rios de dinheiro do Atlético de Madrid ou os chamamentos de Sporting – onde chegou a alinhar à experiência, com intuito de fazer esquecer Peyroteo – ou Porto, era peremptório: do seu Alentejo só sairia para o Benfica. Nunca se proporcionou, incompreensivelmente…

    O Elvas cairia em 1950, passando o testemunho ao Lusitano de Évora como representante máximo do Alentejo e do seu futebol para a década seguinte. Entre a 3.ª e a Segunda saltou o Elvas durante anos e anos e anos, quarenta aproximadamente até voltar de novo à ribalta: 1986-87 voltariam os elvenses à Primeira Divisão, já num futebol muito diferente. Aguentar-se-iam dois anos.

    40 anos depois (aproximadamente, deixemo-nos de rigores fúteis e preciosismos) voltam os elvenses ao foco do nosso futebol com façanhas do mesmo nível. Empurraram para fora da Taça o gigante Vitória vimaranense e perscrutando a possibilidade de vingar finalmente o desleixo dos da capital há 80 anos: com o Benfica em vista nas Meias-finais. Uma provável chegada do Sporting à final delinearia o caminho dos elvenses para a tranquilidade consigo mesmos, confrontando os traumas de infância e resolvendo as incoerências da sua origem, missão que recoloca o tão necessário Alentejo no mapa futebolístico, tão cronicamente polarizado entre os dois maiores pólos urbanos.

    E provando a credibilidade e ambição do projecto – que não é coisa da boca para fora ou impulso fútil dum qualquer milionário – basta atentarmos nas palavras de Ricardo Sereno Fonseca, ex-administrador do futebol da SAD elvense, ditas ao Zerozero em Março do ano passado: « Queremos chegar à 2.ª Liga nos próximos quatro/cinco anos; chegando aí, o objetivo é, depois de quatro/cinco anos na 2.ª Liga, chegarmos ao patamar máximo do nosso futebol. Os investidores têm essa ambição e estamos a criar uma equipa sólida para conseguirmos atingir os nossos objetivos. Já conseguimos a manutenção nesta época, para a próxima queremos ter uma equipa estável que nos permita lutar pelos três pontos em todos os jogos.»

    Tudo a correr como previsto – além do brilharete da Taça, a implacável caminhada no Campeonato de Portugal, com oito pontos a mais que o segundo lugar. Esperemos por 2027.

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    Pedro Cantoneiro
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    Adepto da discussão futebolística pós-refeição e da cultura de esplanada, o Benfica como pano de fundo e a opinião de que o futebol é a arte suprema.

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