Então e os miúdos?

futebol de formação cabeçalho

Em Portugal existe a necessidade de se realizar uma reflexão séria acerca do nosso futebol de formação. Para já têm sido produzidas variadíssimas críticas, opiniões e algumas acções. Umas mais construtivas do que outras – e aqui há que saber sempre inserir o devido filtro. Contudo, e após tudo isto (e mais um par de botas), chegamos à conclusão de que na realidade a mudança ainda não foi operada, e que essa reflexão tem sido sobretudo evitada por quem mais a deveria fomentar.

Actualmente – olhando as seleções nacionais como um exemplo –, paira no ar um ambiente “perigoso”, pois parece que após o Mundial 2014 as coisas já se estão a recompor por si mesmas de forma autopoética. Entre diversos factores, este ambiente justifica-se pela saída de Paulo Bento, pela chegada de Fernando Santos e pelas acções revitalizadoras deste último na Selecção A.

Por sua vez, a selecção de sub-21 apurou-se somente com vitórias para o Europeu da respectiva categoria e parece que existe por cá uma geração de atletas com menos de 23 anos que se apresenta altamente promissora. Mas atenção, sem o devido acompanhamento e as respectivas oportunidades, esta geração mais recente poderá acabar tristemente banalizada como as duas anteriores (e inclusive uma delas produziu uma equipa campeã da Europa em sub-16). Convém por isso recordar que nada está assegurado sem sustentabilidade e uma aposta real nos jovens.

Pelo caminho os títulos do futebol de formação no passado servem também de almofada para o sustento de uma certa sensação de que mais tarde ou mais cedo vamos voltar a ter atletas de altíssimo nível. Enfim, assenta-se numa lógica – brutalmente errada – de que “se já houve, há de voltar a haver”.

No seio de tantas sensações, emoções e fluxos, perdeu-se a oportunidade de repensar seriamente o futebol de formação em Portugal e os modelos que o asseguram. E isto é muito grave (!). Olhou-se para o futebol sénior de forma ruídosa, mudou-se um departamento médico federativo e criou-se mais uma ilusão de falso bem-estar. Acima de tudo, e pior do que qualquer outra coisa, “varreu-se” da memória colectiva que os êxitos do nosso futebol no passado dependeram em muito de um trabalho sustentado e organizado metodologicamente na formação. E não de um belo acaso que nos caiu dos céus. Curiosamente esse trabalho desapareceu de forma consistente há mais de dez anos e só agora se deu pela sua falta.

É evidente que nos “três grandes” do nosso futebol os projectos de formação desportiva e social se mantêm relativamente actuais, bem organizados e ao cuidado de profissionais competentes. Mas o nosso futebol não existe somente na realidade desportiva e social de Porto, Benfica e Sporting. Aliás “essa coisa” do futebol de formação em Portugal vai dos convívios entre escolinhas de futebol até à Selecção Olímpica (sub-23).

gon3
Jogo entre Benfica B e Carregado em Juniores B sub17
Fonte: ADC Somos Nós

Tudo isto existe numa complexidade tremenda em que apenas um focar em três clubes e num par de selecções não permite retirar qualquer conclusão clara. E dada essa complexidade, será mais útil neste texto olhar para alguns pontos que se apresentam eminentes pela sua urgência e gravidade. De antemão convém notar que não existem receitas infalíveis nem milagres, mas existe necessidade de pensar e repensar a realidade.

Um dos primeiros focos deverá ser a “humanização” do futebol jovem. A prática do futebol é executada por seres humanos. Logo, o trabalho deve ser orientado também por esse princípio. A natureza e as condições do jovem atleta devem ser respeitas e analisadas. Cada atleta e cada colectivo apresentam problemas específicos relativamente a si mesmos. Um jovem atleta está inserido num contexto desportivo e social e o seu papel e estatuto não se reduzem ao pontapear uma bola para o interior de uma baliza. Não se pode reduzir os atletas e as equipas a meros objectos de lazer ou de competição.

O futebol de formação não é “puro lazer” nem é meramente competição. Em Portugal é urgente reconhecer o espaço que se reserva para este fenómeno, pois a ideia de “puro lazer” ou a competição exacerbada têm gerado resultados negativos por culpa da ausência de modelos de formação adequados às idades e aos níveis de maturação dos jovens.

Um dos grandes desafios para o nosso futebol de formação é também a questão da criatividade. É fundamental que os nossos jovens se sintam confortáveis e confiantes mas sobretudo que sejam criativos. É evidente que existem princípios e subprincípios que devem ser interiorizados. Mas em Portugal já se “castrou” demais. Nos últimos quinze anos, castraram-se os atletas ao máximo tendo transformado os mesmos em máquinas tácticas que cumprem na ocupação do espaço e na leitura de jogo mas que tecnicamente já não desequilibram como antes. Restam hoje Ronaldo, Nani e Quaresma.

Em Portugal é essencial compreender que a relação com a bola e a criatividade são aspectos que não se podem anular. Os nossos jovens serão sempre mais fortes no futuro se hoje for realizado um trabalho assente em situações de jogo reduzido e no consequente estímulo das competências técnicas, tácticas e psicológicas. Por outro lado, serão mais banais se continuar a vigorar uma política de forçar os jovens a devorar princípios de jogo e estratégias aos nove anos de idade.

Muito haverá por debater e analisar, mas não se pode colocar de parte a reflexão sobre a mentalidade com que se tem abordado o futebol de formação. Raramente se olha para o futebol de formação como um momento, lá está, de formação desportiva e social. Olha-se antes como quem olha para a final de um Campeonato do Mundo: como pura (e dura) competição. Um exemplo de como há algo que está errado é o facto de serem dadas coberturas jornalísticas orientadas apenas para os resultados e para a arbitragem. Como uma cobertura de há alguns dias atrás, num dos principais jornais desportivos nacionais, onde a página dedicada ao futebol de formação era quase inteiramente dedicada ao árbitro e à sua actuação num jogo. Então e os miúdos?

Sabe Mais!

Sabe mais sobre o nosso projeto e segue-nos no Whatsapp!

O Bola na Rede é um órgão de comunicação social de Desporto, vencedor do prémio CNID de 2023 para melhor jornal online do ano. Nasceu há mais de uma década, na Escola Superior de Comunicação Social. Desde então, procura ser uma referência na área do jornalismo desportivo e de dar a melhor informação e opinião sobre desporto nacional e internacional. Queremos também fazer cobertura de jogos e eventos desportivos em Portugal continental, Açores e Madeira.

Podes saber tudo sobre a atualidade desportiva com os nossos artigos de Atualidade e não te esqueças de subscrever as notificações! Além destes conteúdos, avançámos também com introdução da área multimídia BOLA NA REDE TV, no Youtube, e de podcasts. Além destes diretos, temos também muita informação através das nossas redes sociais e outros tipos de conteúdo:

  • Entrevistas BnR - Entrevistas às mais variadas personalidades do Desporto.
  • Futebol - Artigos de opinião sobre Futebol.
  • Modalidades - Artigos de opinião sobre Modalidades.
  • Tribuna VIP - Artigos de opinião especializados escritos por treinadores de futebol e comentadores de desporto.

Se quiseres saber mais sobre o projeto, dar uma sugestão ou até enviar a tua candidatura, envia-nos um e-mail para [email protected]. Desta forma, a bola está do teu lado e nós contamos contigo!

Gonçalo Borges
Gonçalo Borgeshttp://www.bolanarede.pt
Treinador de Futebol, Sociólogo e professor assistente na University of Wisconsin-Milwaukee, Gonçalo é também adepto do SL Benfica e amante das paixões do futebol.                                                                                                                                                 O Gonçalo não escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

Subscreve!

Artigos Populares

À justa: Sporting empata playoff com Leões Porto Salvo

O Sporting venceu este sábado os Leões Porto Salvo por 5-4 e empataram assim o playoff das meias finais de Futsal.

Grécia goleia Eslováquia com show de Vangelis Pavlidis

A Grécia venceu a Eslováquia por 4-1 num jogo particular. Vangelis Pavlidis marcou golo e ainda fez assistência.

Países Baixos estreia-se com vitória na Qualificação para o Mundial 2026: Eis os resultados do dia

Os Países Baixos venceram a Finlândia por 2-0 na qualificação para o Mundial de 2026. Eis todos os resultados do dia.

Eis a equipa argentina que tentou contratar Cristiano Ronaldo para o Mundial de Clubes 2025

Cristiano Ronaldo revelou que teve "convites" da Argentina para jogar o Mundial de Clubes 2025. River Plate chegou-se à frente.

PUB

Mais Artigos Populares

Sporting revela data para a nova renumeração dos sócios do clube

O Sporting vai apresentar uma renumeração dos sócios do clube. Os novos números serão conhecidos a 25 de junho.

Bayer Leverkusen contrata avançado camaronês por 5 milhões de euros

O Bayer Leverkusen fechou a contratação de Christian Kofane. O avançado camaronês está ao serviço do Albacete.

Alverca tenta contratar guarda-redes do Pau FC

O Alverca está interessado na contratação de Bingourou Kamara. O guardião está em final de contrato com o Pau FC.