E para quando as “filhas do dragão”?

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    Olhar para o panorama desportivo em Portugal é olhar para um mundo maioritariamente de homens. Num país de grandes costumes na área, com o futebol à cabeça, as modalidades femininas são quase sempre vistas como inferiores, salvo algumas (raras!) excepções, relativas a desportos considerados “de mulheres”. Com o FC Porto, um dos grandes do nosso país e que acaba por ser exemplo para muitos outros, passa-se exactamente o mesmo. Entre nove modalidades, apenas três têm equipas femininas. Ainda assim, os resultados que acumulam demonstram que são uma aposta ganha!

    A imposição e crescimento do FC Porto em Portugal aconteceram num passado recente. Sobretudo com a chegada de Pinto da Costa à liderança azul e branca, o cenário de centralismo começou a modificar-se, com a equipa do Norte a chegar-se à frente, fazer-se ouvir, ganhar títulos. É certo que o percurso rumo ao topo tinha de começar por algum lado, e é certo que a escolha teria de ser o futebol. Quer se queira ou não, goste-se ou não, é o futebol o desporto rei, não só no nosso país, mas em praticamente todo o mundo. E agora, ao olharmos para esse percurso, percebemos que foi uma aposta ganha. As conquistas nacionais e internacionais fazem do clube um dos grandes portugueses, algo que enche todos os atletas, dirigentes e adeptos de orgulho, mas algo que também acarreta responsabilidade. O FC Porto é, para todos os efeitos, um exemplo para muitos outros. E, no que diz respeito ao desporto feminino, um exemplo que não deve ser seguido.

    Com equipas a actuar em oito modalidades diferentes, mais o desporto adaptado que inclui algumas variantes, são poucas as atletas que carregam o símbolo do dragão ao peito. Apenas no bilhar, boxe e natação existem equipas femininas, distribuídas em plantéis de seniores e juniores, mas que ainda assim são compostos por bastante menos elementos do que os sectores masculinos. Também o desporto adaptado acrescenta mais seis mulheres às estatísticas, duas delas no boccia e quatro na natação. No total, contam-se 32 atletas. No entanto, o palmarés que ano após ano vão conquistando, deixa transparecer o sucesso que alcançam e o maior reconhecimento que deveriam ter. Embora poucos o devam saber, a equipa azul e branca de Pool Feminino soma já dez campeonatos nacionais, 13 taças de Portugal e 12 supertaças, a de natação já se sagrou campeã nacional por 15 vezes e no boxe, há também dois títulos de campeão nacional a registar. E se o desconhecimento destes títulos existe, muito se deve também à pouca divulgação que é feita.

    Conquista da Supertaça de Pool Feminino Fonte: FC Porto
    Conquista da Supertaça de Pool Feminino
    Fonte: FC Porto

    Noticiar conquistas nem sempre é opção na comunicação social portuguesa, pelo menos quando essas conquistas não dizem respeito ao futebol masculino. É mais fácil especular na capa acerca de um qualquer caso com um jogador de um qualquer clube, do que dar destaque a um título ganho numa outra modalidade, sobretudo se for feminina. E se isso acontece, muito se deve também à sociedade e ao que ela consome. Os jornais noticiam por norma o que vende e o que vende é o que as pessoas optam por comprar. Com isto, gera-se um efeito de bola de neve, em que os clubes ditos grandes no panorama nacional têm o dever de intervir para tentar fazer com que alguma coisa mude. No final das contas, são eles que têm capacidade de mudar mentalidades.

    E isso é visível com o caso do futebol feminino. Com um 1ª Dezembro histórico, tendo conquistado 11 vezes consecutivas o título nacional, o que se viam eram notas de rodapé a mencionar a conquista no final de cada época. Da modalidade e dos clubes envolvidos, pouco ou nada se ouvia. Até que a Federação Portuguesa de Futebol decidiu intervir e convidar os clubes participantes na primeira liga a criarem uma secção feminina. Sporting e Sporting de Braga aceitaram o repto e levaram, pela primeira vez, uma final feminina à televisão! Pela primeira vez, as assistências nos jogos deixaram de ser compostas só por familiares e amigos das jogadoras, com o jogo que decidiu o título, disputado em Alvalade entre as duas formações recém-chegadas à competição, a chegar perto dos 10.000 espectadores.

    Da parte dos azuis e brancos, apenas a aposta na Dragon Force, que apesar de incluir meninas, só contempla idades entre os 8 e os 14 anos, havendo depois, caso haja interesse das atletas em continuar, a necessidade de procurar outras opções. E, ainda assim, a principal promoção feita pelo clube às escolinhas, apenas utiliza imagens de rapaz.

    Promoção da Dragon Force, feita pelo FC Porto Fonte: FC Porto
    Promoção da Dragon Force, feita pelo FC Porto
    Fonte: FC Porto

    Está também nas mãos do FC Porto contribuir para que o panorama actual mude e para que o desporto feminino cresça em Portugal. Sendo o clube com mais impacto a norte, e um dos maiores do país, a capacidade de chegar às pessoas é maior do que para qualquer outro. E prova disso foi o ciclismo. Esquecido por muitos durante anos, voltou a ser motivo de interesse com a criação da W52-FC Porto. Os adeptos do clube ganharam interesse na principal prova portuguesa, a Volta a Portugal, e o sentimento de competição, por exemplo com o Sporting, que se juntou com o Tavira, levou pessoas às ruas do país para torcerem pelos atletas. E é disso que precisamos! Precisamos de um FC Porto capaz de impulsionar o desporto nas raparigas, capaz de as formar ao longo de um percurso que culminará em equipas seniores, em equipas capazes de se baterem por títulos mas, sobretudo, capazes de fazerem crescer em Portugal o “feminino”!

    Foto de Capa: FC Porto

    artigo revisto por: Ana Ferreira

     

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    Joana Quintas
    Joana Quintashttp://www.bolanarede.pt
    O gosto pela escrita e a paixão pelo desporto, particularmente pelo futebol, tornaram claro que o jornalismo desportivo seria o caminho a seguir. A Joana é licenciada em Ciências da Comunicação, gosta de estar atenta ao que a rodeia e tem, por norma, sempre uma palavra a dizer sobre tudo.                                                                                                                                                 A Joana não escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.