Cozinha para congelador e outros conceitos | Sporting CP

    O presidente do Sporting CP, Frederico Varandas concedeu uma entrevista… Mas antes disso, uma série de questões: ainda podemos deglutir um iogurte que viu o seu prazo expirado há uma semana?  Uma maçã merece ser desperdiçada mesmo que albergue uma parte da sua casca deteriorada e com aquela tonalidade esquisita da cor castanha? E o pão? O pão, que ganha bolor quando não consumido dois ou três dias após a cozedura estar realizada, merece ser atirado – com animosidade no semblante – para o caixote do lixo ao invés de lhe ser extraída a apendicite? Eu não confio muito na internet.

    Estes debates adquirem relevância quando trazidos a público pelo partilhar de experiências. Como a questão do leite e dos cereais, por exemplo.

    Com base nas indagações anteriores, efetuo outra (porque, ao que parece, ainda não esgotei as fichas). Qual é o intervalo a partir do qual se pode considerar algo como inválido ou sem interesse para efeitos de consumo? Se existisse apenas um prazo, ninguém tinha dúvidas. Todos conhecem o de validade porque é explícito, mas poucos descortinaram o de aceitação razoável precisamente pelo caráter implícito. Quem vende e distribui este tipo de coisas, parece não saber com quem lida diariamente: nós, portugueses, queremos tudo discriminado, porque não temos tempo para colocar hipóteses ou refletir sobre coisas.

    Como referi, na passada terça-feira 15, o presidente do Sporting esteve, em horário nobre, numa entrevista à RTP3. O jornalista – nenhuma recordação da sua nomenclatura – não o apresentou como ex-militar com presença no Afeganistão e, logo aí, notei alguma falta de tempero. Situação igualmente desagradável surge quando preparamos um ensopado de borrego para a família – com todo o cuidado e atenção – e nos esquecemos do louro. As feições do rosto transformam-se na ruga mais pavorosa.

    Espero bem que as reações à entrevista ainda estejam dentro de prazo. Foi falha da secção do Sporting CP do Bola na Rede não ter focado neste ângulo, mas a conversa coincidiu com os últimos preparativos para o Campeonato do Mundo e com a crise no casamento da Meghan e do Harry. Tentem perceber.

    Alexandre – designação entretanto recuperada – começou por inquirir o presidente dos leões sobre um possível regresso do chef Cristiano Ronaldo. O dirigente não quis colocar mais sal ou pimenta sobre o tema porque tinha receio de estragar a possibilidade de uma futura prova de caviar. Eu nunca comi caviar, por exemplo. Aposto que muitos adeptos do Sporting também não provaram. Uma nota final apenas para a primeira de muitas demonstrações de “jornalismo de excelência” que marcaram a entrevista.

    Se Portugal participasse num Masterchef dos Campeões, apresentava o típico cozido à portuguesa, arrebatando a restante concorrência. Os produtos para a sua confeção acompanhavam o aumento generalizado que se sente lá fora, mas o investimento traria retorno pela certa. O mesmo se processa com o técnico Rúben Amorim: apesar da inflação, do IVA, do salário e de outras taxas e tarifas, Frederico Varandas quer manter o cozinheiro e o seu kit primário. Provavelmente, facas, garfos, colheres e talheres iguais que sirvam para preencher o prato iriam sofrer alterações, mas isso fazia parte da reestruturação alimentar.

    Mesmo com a venda de Matheus Nunes, João Palhinha e Bruno Tabata, a qualidade dos alimentos está lá. Lá, em campo. Na Academia do Sporting. E nos estádios deste país. Vomitamos contra o FC Porto, GD Chaves, Boavista FC e FC Arouca: estávamos anafados em campo, cheios de qualidade. Notava-se pelos calções e pela saliência abdominal nas t-shirts. O ex-militar está a tornar-se arrojado. Este foi um dos mais belos empratamentos presenteados à massa adepta. Um dos meus favoritos. Tinha a quantidade certa de vinagre balsâmico e de salada de quinoa.

    Os júris do concurso anual também foram visados. Sim, esses seres desprezíveis sem uma pinga de compaixão pelo dono do restaurante e que, por vezes, são mal-educados com a estrutura culinária do Sporting CP. Ele também já fez parte do júri, no passado. Segundo o próprio, os júris ameaçaram boicotar um cozinhado tão perfeito como aquele que se deu em 2021, não “vieram de bem” e não cumpriram as ordens que a APAV (espécie de ASAE) regulamenta para o futebol. Há casas de pasto que nunca foram bem acolhidas pelas razões mais diversas junto da Crítica do Booking ou do TripAdvisor, o que não invalida que apresentem refeições exímias naquilo que concerne à qualidade e ao preço.

    Frederico Varandas deixou também uma palavra de apreço aos aprendizes de cozinha para Catar ver, Gonçalo Inácio e Pedro Gonçalves. “Não desistam dos vossos sonhos. Um dia, aquela jaqueta difícil de vestir e aquele chapéu que grita RIDÍCULO ainda vão agasalhar-vos. Continuem a trabalhar, a seguir as receitas para elevar o bom nome desta casa. O sucesso içar-se-á sobre o vosso tacho ou a vossa frigideira”. Ao Gordon Ramsay 30x mais calmo e com tiques que esgaçam a pele do pescoço, esperam-lhe um raspanete por escrito e perguntas de digestão complexa. Pelos macronutrientes e tal.

    Tenho um leve pressentimento que este cozinhado já perdeu o sabor e a validade. O tupperware tem aquela gosma branca que parece pêlo a envolver a entrevista.

    Esperem. É maionese de alho…

    Afinal, vou congelar.

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    Romão Rodrigues
    Romão Rodrigueshttp://www.bolanarede.pt
    Em primeira mão, a informação que considera útil: cruza pensamentos, cabeceia análises sobre futebol e tenta marcar opiniões sobre o universo que o rege. Depois, o que considera acessório: Romão Rodrigues, estudante universitário e apaixonado pelas Letras.                                                                                                                                                 O Romão escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.