Convém, numa primeira instância, dirigir uma palavra aos críticos e ao parecer mais antagónico que se possa erguer perante este assunto, que tem tanto de delicado como de parvo, para não dizer ultrapassado e completamente dispensável: não confundam uma opinião com ódio destilado nem com um simples ataque à dignidade de quem quer que seja, a aliteração não conduz ao desconcerto da coisa. Trivializar é o segredo porque, no fundo, os comentários iniciam a corrida ao mesmo tempo e cruzam a meta da subjetividade simultaneamente. Portanto, diminuído o cardápio de desculpas, urge à criatividade (ou palermice) de cada um completar o labor da argumentação.
Voltamos à saga de Bruno de Carvalho, ex-presidente do Sporting Clube de Portugal. Não sei se é apenas fruto do meu pensamento ou se existem algumas almas que o considerem uma espécie de assombração, uma tormenta que se aproxima da nossa razão como que o acionar de um interruptor: na presença de luz, ei-lo ali, hirto, a rir e a tecer demonstrações de amor pelo clube. Desde o primeiro momento que questionei, não o sentimento, mas a forma como o mesmo foi expressado. O paralelismo é imediato: numa relação amorosa, Bruno de Carvalho era o parceiro obsessivo, o que enclausura, o domador. Múltiplas peripécias realizaram placagens, dignas de verdadeiros profissionais de rugby, e derrubaram (novamente) a instituição, atirando-a para a lama. Ele, conjuntamente, também se sujou, dos pés à cabeça.
“Predisponho-me a ir para a frente da SAD do Sporting imediatamente e de borla. Não quero salário, não quero carro, nem cartões. Não quero nada do Sporting. Só quero receber no dia em que o Sporting for campeão nacional de futebol de seniores masculino”, afirmou na Rádio Estádio. Mesmo que a vontade de receber algo prevalecesse, a crise financeira que o clube atravessa deixava por terra essa hipótese. Durante a sua estadia, nas épocas gloriosas, onde se ia alternando o segundo com o terceiro posto, muitos foram os investimentos supérfluos que resultaram em prejuízo (quase predestinado).
Tiros nos pés, na barriga e na cabeça. A ânsia de ser campeão, de se vangloriar e de poder tirar proveito desse facto subjugou toda e qualquer tática que germinasse. A Doyen, o Cashball, a atitude perante Marco Silva, os ataques pessoais, os posts e as bicadas nas redes sociais, as assembleias gerais caóticas e ditatoriais, as imposições estúpidas e mesquinhas, os plantéis construídos sem estabelecer qualquer tipo de equilíbrio entre os suplentes e a equipa titular, a cisão interna desde o primeiro momento, estendida da equipa técnica à empregada de limpeza, com passagem pelos profissionais ativos. Ou seja, tudo o que agora é colocado em causa (também por mim), foi realizado anteriormente.
“Quero que as pessoas tenham a noção clara de que a única coisa que me move é querer ver o Sporting estável e a desenvolver-se como estava. Quero um Sporting ganhador!”. Tiro-lhe o chapéu, sem qualquer dificuldade. Em apenas cinco anos, a nível desportivo, observamos o Sporting mais impetuoso dos últimos 20 anos, a eclosão das modalidades, o vibrar e o rugido do João Rocha, a Sporting TV, a reaproximação às duas maiores potências desportivas da atualidade (SL Benfica e FC Porto), a fortaleza edificada em Alvalade, o regresso das noites europeias e a reestruturação da dívida. Marcos importantes e irrefutáveis ao nível do sucesso desportivo-financeiro!
“Não me digam que é populismo. É amor e a convicção de que os nossos fundadores estavam certos. (…) Já não consigo mais ver esta destruição, esta autêntica guerra civil. (…) Predisponho-me a ir para a frente da SAD do Sporting imediatamente, mesmo com o Varandas no clube. O atual responsável financeiro [Salgado Zenha] pode até ser o meu braço direito”. Até aqui, as provocações, os insultos e as afrontas. Agora, a redenção, a disponibilidade gratuita e a superiorização do Sporting aos seus interesses pessoais.
Foto de Capa: Carlos Silva/Bola na Rede
Artigo revisto por Inês Vieira Brandão