A comunicação de Rúben – Drible de Letra #5

    Não há volta a dar: na era da presidência de Frederico Varandas no Sporting CP, há um antes e um depois de Rúben Amorim. No início, o antes: um barco à deriva com uma comunicação completamente desconcertante de “cabeça, membros e pernas” e desalinhada, com treinadores de saída a anunciarem, eles próprios, os seus sucessores.

    Uma política de contratações que mais se assemelhava a um verdadeiro naufrágio financeiro e técnico. Compras astronómicas e desastrosas: Doumbia, Borja, Ilori, Renan, Luiz Phellype, Sporar, Vietto, Rosier, Camacho, Eduardo, Jesé, Bolasie e Fernando – são 43 milhões de euros em jogadores que não integraram, sequer, os treinos de Rúben Amorim – num desperdício que faria qualquer economista amador corar de vergonha.

    Dirijam-se ao Padre Amorim, confessem os vossos pecados e regressem ao lugar com as respetivas preces. Oremos, irmãos sportinguistas! Tiago Ilori
    Fonte: Carlos Silva/Bola na Rede

    O futebol praticado em Alvalade que, com uma generosidade incrível, chamaríamos de “baixa qualidade”, em completa sintonia com os resultados, completava as pinceladas deste quadro de miséria, ecoando uma contestação sem precedentes, com os cânticos dos sócios e adeptos a variarem entre “Varandas out” e “o que fazes ainda na Presidência?”. Isto para aqueles que ainda faziam questão de comparecer, pois a maioria começava a abandonar o reino do leão, sem paciência para os fracos desempenhos que se sucediam no campo. O que se seguia era um coro de assobios, lenços brancos, relatório e contas rejeitado, o Pavilhão João Rocha atacado, com pedras lançadas contra carros de dirigentes do clube: qualquer semelhança com o caos não seria coincidência alguma.

    Entretanto, como num conto de fadas moderno, surge o depois: Rúben Amorim. O leão voltou a rugir, desde logo com uma comunicação elogiada por todos. A do treinador, claro, uma vez que somente ele falava em público, com discernimento, assertividade, clareza, realismo e frontalidade – como não gostar? Miguel Braga, antigo responsável pela comunicação do Sporting, ainda tentou aproveitar o canal de clube para se mostrar como um estrategista exemplar. Mas, além de ninguém lhe dar grande importância, gastava mais tempo a falar dos rivais do que propriamente da instituição que representava, qual mentalidade pequena. Enfim, no lado bom do clube, o que Rúben dizia, refletia-se em campo, com boas exibições e grandes resultados. O público gostava e aplaudia.

    Sporting CP jogadores
    Fonte: Ana Beles / Bola na Rede

    Os sócios e adeptos regressaram a casa e, desde então, apoiam a equipa incondicionalmente – ainda no passado fim de semana, frente ao CF Estrela da Amadora, mesmo com o marcador em 1-2, o incentivo e o carinho para com os jogadores foram notórios –; no mercado, o leão aprendeu a caçar com astúcia: vemos agora Gyokeres, que já chegou depois Pote, Nuno Santos ou Palhinha, assim como a aposta na prata da casa, como Gonçalo Inácio ou Nuno Mendes. E, imagine-se, conquistou o Campeonato, outrora uma miragem num deserto de quase duas décadas.

    Nesta temporada, em vésperas do derby na Luz, lidera a Liga, três pontos à frente do eterno rival. Respira-se outro ar em Alvalade, não é?

    E o ponto de viragem é mesmo esse: a chegada de Rúben Amorim. Significará isto que o Sporting contratou um excelente treinador, ainda que num ato de desespero de Varandas, que tinha o dedo em riste, apontado à porta de saída de Alvalade? Sim. Mas também contratou um excelente diretor de comunicação e de scouting. De repente, o caos deu lugar a um clube potente, vigoroso e com pujança.

    Assim continua. E enquanto Rúben Amorim estiver ao leme, assim será. O treinador sabe disso. Primeiro, porque é um profissional de excelência, tem consciência do seu valor e confia nas suas competências. E, depois, porque isso transparece na sua comunicação. Sempre com decoro e profissionalismo, respeitando tudo e todos, comunica com propriedade, escolhendo os momentos certos e as ocasiões mais oportunas para transmitir mensagens relevantes e estratégicas.

    Matheus Nunes
    Fonte: Diogo Cardoso / Bola na Rede

    Na temporada anterior, Frederico Varandas, que só tem de entregar a gestão do clube a Amorim e não estragar, conseguiu, mesmo assim, estragar. Prometeu ao treinador que, vendendo Palhinha e Tabata, não deixaria sair Matheus Nunes. Falhou na promessa. E num timing perfeito: antes de um clássico, no Dragão. Palmas, muitas palminhas. “Se há incoerência, não é da parte do treinador”, apontou, com razão, Amorim naquela altura. Posteriormente, criticou-se a política de contratações daquela época, feita em cima da hora e em circunstâncias adversas. Mas, existe alguém que, nos saldos, uma época específica de compras, consiga encontrar aquela peça que desejava no início? Só por sorte. E, neste contexto, a sorte não pode ser nunca um o fator determinante, mas sim um planeamento estratégico. Que, como se percebeu, alguém comprometeu.

     á nesta temporada, quando foi, recentemente, questionado sobre o suposto interesse do Manchester United, Rúben afirmou ter “um plano para o final da temporada”, mas assegurou que irá “cumprir tudo o que consta no contrato”. Recebeu críticas pelo momento da declaração e por especular sobre o futuro num período tão madrugador da temporada. No entanto, considerando o histórico e a comunicação assertiva, há que se dar crédito às suas razões. Nunca é demais avivar a memória de quem já falhou connosco. Também nesta época, Amorim mudou deliberadamente o discurso de “jogo a jogo” para “tudo ou nada”. Mais uma vez, acertadamente. É que gerir uma equipa baseada em jovens da formação é diferente de gerir um plantel com as contratações mais caras da história do clube.

    Rúben está ciente disso e enfrenta a situação de peito aberto. Como sempre enfrentou. Mesmo quando pegou num Sporting em pleno caos. Lembram-se: “E se corre bem?”

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