Se pedirem com jeitinho, nós damos essa Palha

    O futebol está de férias. Pelo menos, no que toca às competições nos mais variados campeonatos da Europa desempenhado por clubes. As seleções defendem a sua honra numa espécie de Taça da Liga com três ou quatro divisões e constituem um aljube para os jogadores que, neste momento, cometiam a maior das loucuras para viajar até às praias paradisíacas das ilhas Fiji ou Seychelles. Será que viajam todos na mesma companhia aérea, pela mesma agência de viagens e fazem fila para comprar os ingressos?

    Ainda que de modo implícito, erguem-se algumas críticas quanto a certas e determinadas situações, parafraseando o homem que fala e não diz nada. Mas isso são outros quinhentos. Será que algum profissional de futebol já passou férias no meio de qualquer floresta tropical, viveu no seio de comunidades indígenas em fraternidade ou se confluiu com aquela gente do campo que tem uma palma da mão maciça e incapaz de carimbar qualquer coisa com o polegar? Translademos a conjuntura para um pêssego vivaço da silva, mas pisado num dos cantos. Resta descortinar ao que sabe a lasca desperdiçada.

    Escrevem-se textos por dá cá aquela palha e o leitor bem sabe. Este é um exemplo sintomático. O autor propôs-se a escrever sobre João Palhinha. Contudo, lembrou-se repentinamente que a designação atribuída por Rúben Amorim ao camisola seis do Sporting CP – “Palha” – desagua onde o menino Jesus está refastelado. Portanto, o texto redunda numa versão de “dou-vos aquele Palha, mas com o devido retorno financeiro”.

    Palhinha / Palha
    Fonte: Carlos Silva / Bola na Rede

    Nas ações que envolvem o processo de jogo da equipa leonina, o internacional português é um jogador diferenciado. E porquê? A resposta é muito simples. Historicamente, Braga ainda era Augusta e João Palhinha, ao invés de viver intensamente o seu ócio em resorts e hotéis com tudo do bom e do melhor, pegou numa mochila com três ou quatro mudas de roupa e meteu pés ao caminho durante duas semanas, nos verões que antecederam a chegada ao clube do coração.

    A convivência com múltiplos cenários não-citadinos auxiliou um crescimento expectável. Para os lados de Madagáscar (não menciono a Amazónia para não dar a entender que sou leigo nesta matéria), João Palhinha habituou a sua compleição física à precipitação constante e estudou a enorme variedade de seres vivos existentes, aplicando os ensinamentos apreendidos em Alvalade.

    Quando a equipa perde estabilidade e não é capaz de dominar o adversário (precipitar sobre ele, vá), o médio defensivo torna-se o pêndulo do miolo pela sua capacidade de perceção dos momentos de jogo e de equilibrar os três setores de atividade; contudo, quando a equipa se opõe a adversários de menor dimensão, João Palhinha assume a primeira fase de precipitação e estuda as fragilidades defensivas através do passe longo.

    O trinco leonino quis mudar de ares e, no verão seguinte, rumou ao cálido Alentejo. Com 40º graus à sombra, João Palhinha descansava encostado às arvores e ora pegava em documentação relativa à Campanha do Trigo ocorrida na época da Ditadura Militar, ora pegava em textos compilados que incidiam na Reforma Agrária com selo Avante!, na Feira do Livro, em Lisboa. Nenhum latifundiário ousou sequer meter o bedelho enquanto o leão calcorreava o campo, debulhando e ceifando o trigo.

    O facto descrito comprova as performances tidas durante as duas épocas de leão ao peito. Defensivamente, o camisola seis lavra terreno quanto quer e retira ervas daninhas com frequência. Em duelos individuais, raras são as bolas que não querem ficar junto do seu pé e inexistentes são os lances que dá por perdidos. A isto, o “central mais avançado da quadra” junta o walkie-talkie empunhado e elevado à altura da boca por forma a empurrar a equipa para a frente de batalha.

    A título prévio, convém clarificar os leitores de que não estamos perante um ato tirano como se pode contemplar em 12 Anos Escravo. Bayer 04 Leverkusen, Paris Saint-Germain FC, Fulham FC e Wolverhampton Wanderers FC são licitadores interessados no leilão do senhor Palhinha. A persistência e (até) a obstinação ditam as regras. A discussão pode alongar-se por vários dias. Ao que tudo indica, os cofres leoninos receberão uma boa quantia e podem investir no “desinvestimento” nas modalidades. Os adeptos contentar-se-ão.

    Para além do “dou-vos aquele Palha”, poderia ter falado das palhinhas também. E das tartarugas, por associação. Mas sobre isso ainda sabia menos. Preferi não arriscar.

     

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    Romão Rodrigues
    Romão Rodrigueshttp://www.bolanarede.pt
    Em primeira mão, a informação que considera útil: cruza pensamentos, cabeceia análises sobre futebol e tenta marcar opiniões sobre o universo que o rege. Depois, o que considera acessório: Romão Rodrigues, estudante universitário e apaixonado pelas Letras.                                                                                                                                                 O Romão escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.