📲 Segue o Bola na Rede nos canais oficiais:

Recordar é Viver | Jorge de Brito

- Advertisement -

Decretada ficou a vontade do povo benfiquista, tão grande e tão convicta que chegou a recorde de Guinness. Será, pois, sensível reservar para as próximas semanas uma exaustiva reflexão sobre o que significará a manutenção dum status quo que para a Luz não tem conseguido construir grandes méritos, muito menos grandes prémios.

Mas a democracia disse-nos, veementemente, que só interessava segurar Rui Costa no gabinete máximo; e assim sendo, a esperança será mesmo a última a morrer e o optimismo terá que ser facultado em rações de guerra, tudo muito comedido para durar e fazer render. Diz-nos o presidente que os quatro anos anteriores dotaram o clube da capacidade para ganhar consecutivamente nos quatro anos vindouros – que tudo não passara de sofrida, mas intensiva preparação; os títulos virão, alapados à megalomania do Benfica District, Colombo melhor que o original e que suportará um estádio ainda mais monumental, com 15 mil lugares adicionais e exterior rejuvenescido. A cifra da despesa arrendondam-na aos 220 milhões e o adepto mais céptico olha, mete a mão no queixo e gasta um bocado do tal optimismo para conseguir ver alguma seriedade na coisa.  

«Respeitem, sempre, o dinheiro do Clube. É dinheiro de gente simples e humilde. É dinheiro do esforço de gente pobre que dá, porque gosta muito do Benfica. Sirvam-no. Não se sirvam dele! Depois do trabalho, jogo ou da competição, fiquem com a consciência tranquila! O Benfica é um Clube de gente laboriosa. Que merece ser respeitada por quem nele trabalha e do qual, recebe! Lembrem-se!»

O conselho de Joaquim Ferreira Bogalho fez escola e delimitou os trâmites morais do vago conceito da Mística benfiquista – obrigatoriamente mais imperativo que apenas ganhar e competir, sendo esse o objectivo de todos – e delineou a postura exigida aos órgãos sociais que regeriam o clube na segunda metade do século XX.

O imaginário colectivo concorda que, esse Benfica dominador, de alcance global, teve como zénite o ano de 1994, até Manuel Damásio pensar na revolução dos quadros técnicos como solução para o contexto competitivo do novo milénio. Antes de ter permissão de trocar Toni por Artur Jorge e escorraçar meio plantel campeão, Damásio sucedia a um nome que, poucos imaginavam na altura, seria o último dos bastiões da tradição de Bogalho.

Muito se sabe sobre a vida e obra do senhor. Seria inútil discorrermos novamente sobre a cronologia dos seus feitos. A subida vertiginosa na carreira das finanças ou o papel pioneiro no âmbito artístico, como coleccionador, são histórias já espremidas e bem melhor relatadas do que possivelmente seriam aqui.

Há anedotas, certamente muito próximas de ser verdadeiras, que ajudam a entender a ousadia do seu génio: fazia algum mal mandar obras para serem leiloadas em Londres, predispondo-se a comprá-las de volta à primeira oportunidade e por preços exorbitantes só para as valorizar? Há coisas bem mais condenáveis. E por isso será mais pertinente reflectir sobre o alcance da sua personalidade e do seu papel no crescimento do Benfica, sob a óptica do servir o clube e nunca se servir da sua grandeza para alavancar objectivos pessoais. Jorge de Brito, sócio desde os sete anos, meteu sempre à disposição do clube o seu imenso património.

Diz quem viu e quem com ele conviveu desde moço que era desportista de eleição, daqueles faz-tudos ou bons-em-tudo: que jogava futebol de cadeirinha, que chegou a cinturão preto no judo, que via grandes possibilidades na velocidade e na agilidade. Por isso, quando, nos final dos anos 60, viu o clube perder os terrenos do Campo Grande – onde treinavam e competiam as equipas de atletismo – meteu na cabeça que havia de ser ele o responsável pelo regresso em grande das modalidades de pista. Em 1973, oferece ao clube uma pista de tartan, último modelo, tecnologia de ponta. Pelos vistos, só exigia a Borges Coutinho uma condição: não dizer quem tinha sido, que a oferta era anónima. O outro senhor, outro monstro do cavalheirismo, sentiu-se obrigado a dizer ao mundo quem tinha sido – e, em Dezembro desse ano, galardoar-lhe uma Águia de Ouro. Justo.

Manteve-se como o real mecenas. Quando precisassem dele, estava lá. A influência consolidou-se, pediam-lhe que fosse mais, com papel mais activo – em 1983, concorre com Fernando Martins – e este ganha-lhe, com… 67%, nas eleições mais concorridas até então (…6747 votantes!). Não se fez rogado, continuou presente – em 1987, meteu-se na retaguarda de João Santos para devolver ao povo o Benfica Europeu, projecto que concretizou com duas finais da Taça dos Campeões Europeus. Terá sido dos seus bolsos que saíram muitas das garantias para comprar Magnusson, Thern, Aldaír, Mozer, toda aquela geração de craques estrangeiros: só para tirar Valdo do Grémio, Jorge de Brito terá emprestadado um milhão de contos.

Quando João Santos se esgota, Jorge de Brito avança. Assume em Abril de 1992, depois de arrecadar 76% dos votos. É ele que constrói o fabuloso plantel de 1992/93; que vê em João Vieira Pinto o futuro e Paulo Futre o presente, mesmo que isso implique o abismo financeiro, para o qual supostamente haveria plano se não surge o Verão Quente e a rasteira de Sousa Cintra: o Benfica contava com um passivo na ordem dos três milhões e seria obrigado à venda dum jogador. Venderia Rui Costa para Florença no ano seguinte (1,3 milhões de contos, pouco menos que os 1,7 com que Ferguson levaria Andy Cole de Newcastle, a maior transferência dessa janela) mas nesse Verão haveria que sacrificar outro alguém. O Calcio chamava por Paulo Sousa. Calma aí, respondeu o português… 

Às 11h36 do vigésimo quinta dia de Junho, chega um fax à Luz. Alegando que o salário do Maio estava em falta, os representantes de João Vieira Pinto solicitavam igualmente a rescisão de contrato. Jorge de Brito, de férias no Algarve, correu a costa à procura do menino, descobrindo-o em Torremolinos, convencendo-o com um contrato até 1997.

Mas estava o caldo entornado, a instabilidade sentia-se a cada momento. Em Dezembro, vinte anos depois do máximo prémio do associativismo, percebe numa assembleia-geral que os sócios não têm a mesma visão para o curto prazo nem confiam na sua capacidade para resolver o problema. Com toda a dignidade, demite-se antes de o demitirem. Alguns, entendendo a precipitação das massas, entendem que se devia manter como presidente honorário.

Uns anos depois, no Centenário benfiquista, o jornal A Bola organizaria um encontro entre presidentes do clube. Luís Filipe Vieira receberia os seus antecessores num ambiente de confraternização. Jorge de Brito, mesmo debilitado, estava presente.

Era conhecimento geral que teria deixado um crédito de 800 mil contos no clube, a sua última grande contribuição que, entretanto, nem Damásio, nem Vilarinho, nem Vieira, apesar de preocupados com o assunto, tinham conseguido devolver. Uma das soluções seria a oferta de dois camarotes da nova Luz. Era assunto meio incómodo. A meio do convívio, interrupção: o senhor quer falar. E elegantemente como sempre conseguiu estar e viver, relembrou:

«Façam o favor de riscar o meu nome e os 38 mil contos da parcela de dívidas do Benfica. Para mim é assunto arrumado».

Despedir-se-ia dois anos depois.

Pedro Cantoneiro
Pedro Cantoneirohttp://www.bolanarede.pt
Adepto da discussão futebolística pós-refeição e da cultura de esplanada, de opinião que o futebol é a arte suprema.

Subscreve!

Artigos Populares

Presidente da Federação do Curaçau e o apuramento histórico: «Já ganhámos o Mundial»

O Curaçau vai pela primeira vez ao Mundial. Gilberto Martina é o presidente da Federação e já reagiu ao apuramento.

Olheiro BnR | Álvaro Zamora

Os beirões já contam atualmente com cinco vitorias consecutivas, uma delas frente ao Gil Vicente e Zamora tem sido figura.

Luis Suárez analisa vitória da Colômbia e faz balanço: «Representar o país é um prémio pelo trabalho feito no Sporting»

Luis Suárez falou sobre a vitória da Colômbia sobre a Austrália. Avançado do Sporting fez ainda balanço dos últimos meses.

Portugal cai do top-5: Já há ranking FIFA atualizado

Portugal está fora do top-5 do ranking FIFA. Seleção Nacional vê Brasil a ultrapassar e está agora em 6.º lugar na lista.

PUB

Mais Artigos Populares

Carlos Vicens confirma interessados em jogador do Braga: «Também havia no Brasil»

Carlos Vicens deu uma entrevista. Treinador do Braga confirmou ter havido clubes interessados em Gabri Martínez.

Carlos Vicens e a Taça da Liga: «Seria um sonho ganhar a meia final ao Benfica e disputar uma final»

Carlos Vicens deu uma entrevista. Treinador do Braga falou sobre vários temas, tal como a presença nas várias competições.

Carlos Vicens deu entrevista: «O Braga é o quarto clube de Portugal»

Carlos Vicens deu uma entrevista. Treinador do Braga falou sobre vários temas, tais como as metas para a temporada e o mercado de verão.