A lesão de Daniel Bragança vista de Arcos de Valdevez

    A malta proveniente dos Arcos de Valdevez é hilária. Claro que a generalização abraçará o argumento que sustenta a tese, porque por lá também residem pessoas que não aglutinam com supercola três os pronomes aos nomes comuns e que não terminam a última palavra de uma frase com a letra “j”.

    Se uma pessoa da região tiver ardor na região ocular, relata aquilo com irritação, naturalmente. “Tenho osjolhuj a arder”. No raio de ação, soltam gargalhadas os que lá estão, garanto. Diferenciam-se do resto do país numa situação: conhecem partes do corpo humano iniciadas pela letra “J” que não o joelho. É de louvar.

    Tenho um amigo dos Arcos. Falamos com alguma frequência por telefone sobre temas que não interessam patavina tais como: a lógica em torno da contratação de Christian Borja para o Sporting CP, a habilidade rara e sui generis de quem incendeia matas e florestas, a consagração de Nicholas Sparks como escritor, a impaciência relativa a Herman José e à sua persona de one man show e a coragem daquelas pessoas que, apesar de terem cadeiras livres e confortáveis, preferem sentar o traseiro no banco.

    O Gaspar é do Sporting CP. Nos meses de verão, o tempo livre é tanto quanto o dinheiro que afaga a minha conta bancária. Uma das decisões mais sagazes que tomei foi tê-lo promovido a contacto de emergência porque me aborrece ligar a internet e demandar por notícias sobre o meu clube. Os amigos servem para isso. E a prova de que um bom amigo vale mais do que 20 conhecidos segue dentro de momentos. Aguardem mais um bocadinho enquanto recomponho o semblante. Já está.

    Gaspar – “Romão? Está lá!? É o Gaspar. Tenho algo de muito grave para te contar. Conheço-te e sei que passas dias a fio sem ler uma notícia – dizeres que queres seguir Jornalismo já nem é um paradoxo, é um oxímoro – mas prepara-te porque vais ficar pregado ao chão. O Daniel Bragança lesionou-se com gravidade e só volta a competir daqui a meio ano…”

    Pelo telefone, adentrou um gemido.

    “Estou!? Romão!? Estás a ouvir-me? Fala comigo, companheiro. Estou a ficar preocupado”

    – Olá, camarada! Como tens passado? Ouvi a tua notícia com profundo desagrado e com alguma consternação até. Lesionou-se onde? O que aconteceu?

    Gaspar – Teve uma rotura no ligamento cruzado anterior. Nosjoelhuj. Vamos ter que ir ao mercado, em princípio. Morita, Matheus Nunes, Ugarte… temos os miúdos ainda [Dário Essugo e Mateus Fernandes]. Mais vale prevenir e comprar um seis que reúna características de um oito, um box-to-box.

    Gemi outra vez. Tinha rodado a naifa umas três vezes para ver se a morte me ceifava com a sua foice imponente para citar o Mundo Segundo. Estava a ficar zonzo, mas quis discutir aquilo. A relevância ganhou terreno.

    – Não discordo totalmente do que dizes e já achei o fundamento. Além disso, incorporar entulho envolto em cotão como Eduardo Henrique, Idrissa Doumbia ou Rodrigo Battaglia junto do resto do plantel seriam dez passos atrás. Acho que ainda desaprendiam todos de jogar à bola.

    Simultaneamente, observando o caso sob outra perspetiva, não sei até que ponto seria vantajoso adquirir mais um médio porque, se reparares, o Dário já vem da época passada e o Mateus emergiu nesta. Falta de qualidade não existe e tarimba ganha-se com a mistura de miúdos e graúdos.

    Gaspar falava por cima de mim e não ouviu metade do que lhe disse.

    – Fala quando eu acabar. Ouve-me com atenção!

    E repeti o que disse.

    Gaspar – Daniel Bragança é muito craque e, a meu ver, este ano todos iriam contemplar a confirmação de um talento nato e diferenciado. A Sofia Oliveira tem muita razão quando embrulha o miúdo em elogios. O único médio pé esquerdo, com visão de jogo e qualidade de passe acima da média. Com a saída de Palhinha, o menino de Almeirim iria ser opção mais utilizada. Osjoeluj dos adversários é que romperiam quando o enfrentassem.

    O sangue esvaía e eu estava encostado à cama apenas por precaução, não fosse o diabo tecê-las. À semelhança de Daniel Bragança, também passaria uma temporada jeitosa no hospital sem poder fazer aquilo de que mais gosto. No meu caso, sentar-me numa esplanada e beber cerveja.

    – Gaspar, a conversa está agradável, mas tenho uma faca a moer-me a barriga. Atualiza-me em relação a este assunto. Se isto acabar como The Sopranos, escusas de me contar porque não vou querer saber. Adeus!

    Gaspar – Romão, como é que espetaste uma faca nojintestinuj? Se fosse nojolhuj, ficavas cego. Tens de ter mais cuidado! Abraço!

     

     

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    Romão Rodrigues
    Romão Rodrigueshttp://www.bolanarede.pt
    Em primeira mão, a informação que considera útil: cruza pensamentos, cabeceia análises sobre futebol e tenta marcar opiniões sobre o universo que o rege. Depois, o que considera acessório: Romão Rodrigues, estudante universitário e apaixonado pelas Letras.                                                                                                                                                 O Romão escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.