«Quando o Pepe começou a treinar connosco no Marítimo eu falei para o míster Nelo Vingada: “Temos central”»
Bola na Rede: Voltando à tua relação com Jorge Jesus, já disseste um pouco como é que foi a tua experiência, mas, no geral, gostaste de trabalhar com ele?
Gaúcho: Sim, sim, sim. Um dos melhores treinadores que eu tive na minha carreira, taticamente ele é fora de série e pelo trajeto dele está aí, e ele merece tudo aquilo que ele conquistou, ele mereceu.
Bola na Rede: E já agora, se puderes, podes contar uma história engraçada ou caricata que tenhas vivido com Jorge Jesus?
Gaúcho: Foram tantas, tantas [risos]. Teve uma altura que estava numa palestra e ele colocou lá o quadrozinho dele da palestra e as pecinhas no quadro. E ele estava a falar da equipa adversária e tal, e uma peça cai no chão e quando ele vai a apanhar a peça, no chão, ele escorrega e cai no chão, na palestra [risos]. E nós não queríamos rir, todo o mundo não mostrava e ele colocou lá a peça e começou a falar e tal, passados dois minutos, ele pega a mesma peça e a peça cai no chão. E ele falou para a peça “quer me f****?” Ninguém aguentou, foi uma risota [risos].
Bola na Rede: Na época seguinte, em 2000/01 o Estrela fica em último no campeonato e desce à II Liga, foi muito difícil encarar esse momento de descida de divisão?
Gaúcho: Sim foi muito difícil porque acho que mudamos de 80 para 8, estivemos tão bem, no ano seguinte foi uma desilusão completamente… olha eu nem sei explicar o que foi que aconteceu, não sei. Mal organizado, planejamento muito diferente da época passada, depois o Jorge Jesus saiu ali e tal e as coisas complicaram bastante.
É SÓ CONTAR ATÉ 3… | A época 2000/2001 correu pelo pior: o ESTRELA DA AMADORA desceu à 2.ª Liga. Mas quem visse os tricolores no Restelo (23. FEV.2001), nunca acreditaria que a equipa estava no último lugar.
Resultado? Uma vitória fora por 3-0, com direito a Gaúcho Show! pic.twitter.com/7N2HKb3Shl— Estrela da Amadora (@cfeamadora) April 1, 2020
Bola na Rede: Na época seguinte segues para o CS Marítimo onde tens a tua segunda melhor época em termos de golos marcados – 19 em 41 jogos – e jogas inclusive na Taça UEFA. Esta foi a única vez que jogaste numa competição europeia, quão importante foi esse momento para ti?
Gaúcho: Jogar nas competições europeias é um marco, é espetacular, gostaria de jogar mais. Foi uma sensação espetacular, estar ali no Marítimo com uma equipa espetacular. Foi por isso que eu fui para o Marítimo, porque desci de divisão. Descemos de divisão e eu acho que eu fiz 11 ou 12 golos, não sei muito bem…
Bola na Rede: Fez 11 golos nessa época.
Gaúcho: Fiz 11 golos, numa equipa que desce de divisão eu ainda fiz 11 golos, eu acho que não é fácil. Eu fiz o meu trabalho, sabe? Eu tenho consciência tranquila que eu fiz o meu trabalho. É por isso que eu fui para o Marítimo. Em dezembro, já tinha contrato feito com o Marítimo, então joguei até junho já negociado com o Marítimo. Então nessa reunião, no final da época, quando eu chego para me apresentar lá no Marítimo, o Nelo Vingada falou assim: “caramba, tu desceste de divisão e fizeste 11, o Pena, foi campeão, fez 21”, ele falou “não tem diferença nenhuma isso” e realmente não tem diferença nenhuma. E o Nelo Vingada, nesse aspeto ele é um senhor, eu tiro o chapéu, treinador espetacular.
Bola na Rede: Como foi então a experiência de trabalhares com o Nelo Vingada?
Gaúcho: Caramba, é um senhor, nem tem forma como dizer, é um senhor que nunca falou palavrão, bom treinador taticamente e ele à frente do Marítimo fizemos grandes jogos, grandes épocas, tivemos dois anos a trabalhar juntos, foi espetacular.
Bola na Rede: Estiveste três épocas no Marítimo, ajudaste a equipa a alcançar boas classificações no campeonato, a equipa ficou em 6º duas vezes e outra em 7º, também treinaste com o Manuel Cajuda. Com isto tudo, como é que olhas para a tua experiência no clube da ilha da Madeira?
Gaúcho: É engraçado, quando eu cheguei no Marítimo e os jornalistas, todos perguntaram quantos golos eu ia fazer, e eu falei assim “eu vou fazer 15 golos”. E no último jogo do campeonato eu tinha 13 e o último jogo era Marítimo e Benfica. Fazer dois golos ao Benfica não é fácil. Então o Benfica tinha uma grande equipa, então ganhámos esse jogo de 3-2, eu fiz dois, fiz 15 golos no total. Esse jogo dependia para a gente ir para a Liga Europa e ganhámos e fomos para a Liga Europa. E fiz 15 golos. E no próximo ano, quando acabou o jogo eu fui para a sala de imprensa e os jornalistas estavam a perguntar “e no próximo ano, quantos vai fazer?” e eu “vou fazer 15”. Engraçado, não é? “Eu vou fazer mais 15, não 16 nem 17, vou fazer 15” [risos]. Ninguém acreditava e no ano seguinte, estava com 15 golos já, faltavam cinco jogos para o fim do campeonato e eu sofri uma lesão e não joguei os cinco jogos. E foi nesse ano que o Fary foi o melhor marcador com 18. Eu era o melhor marcador, com 15 eu era o primeiro e eu sofri uma lesão e perdi quatro jogos, mas fiz 15 [risos].
Bola na Rede: Ainda no Marítimo, foste colega de um jovem Pepe, o central que depois viria a fazer marca no FC Porto, no Real Madrid e na Seleção Portuguesa. Sendo um jogador tão marcante do futebol português, tenho de te perguntar que memórias tens de partilhares o balneário com Pepe?
Gaúcho: O Pepe foi um rapaz, quando ele chegou no Marítimo, quem veio assim tipo com moral, mais, foi Ezequias, o lateral-esquerdo, mas o Pepe veio no bolo, mas o Pepe veio lesionado, veio com o tornozelo inchado e passou um mês sem treinar, mas quem veio com a moral toda foi o Ezequias. Quando o Pepe começou a treinar connosco no Marítimo eu falei para o míster Nelo Vingada: “Temos central” e ele “tu achas?” e eu assim “temos central”, ele olhou assim para mim “fogo, espetáculo”. E o Pepe foi crescendo, foi crescendo, começou a jogar e teve um aqui no FC Porto, que o Jorge Mendes queria falar com o Pepe, e o Pepe “Gaúcho, o Jorge Mendes quer falar comigo, tu pode estar presente?”, falei assim “claro, porque não?”. Eu estive presente lá na reunião, o Pepe se calhar não se lembra disso, e hoje está aí.