«As negociações já estavam todas feitas para eu ir para o FC Porto» – Entrevista BnR com Gaúcho

    «Fui o melhor marcador do Santa Cruz com 38 anos»

    Bola na Rede: Em 2004 fazes as malas e viajas para a Coreia do Sul, onde jogas no Busan IPark. Porque é decidiste viajar para a Coreia e como foi a experiência de jogares nesse país?

    Gaúcho: Pronto, foi assim, foi uma proposta muito boa, financeiramente, eu também já estava com 32 anos, fiz ali três anos de contrato na Coreia do Sul e eu achava que era uma oportunidade boa de seguir outros trajetos, outros caminhos. E fui e passei nem seis meses, eu acho, e eu estava a ser um dos melhores marcadores do campeonato, mas, com a alimentação já tinha perdido quatro quilos, não estava bem. Então eu falei assim para a minha esposa “é melhor voltar para Portugal porque aqui não vai dar para mim”. Então eu voltei para Portugal, voltei até sem clube.

    Bola na Rede: Como disseste, depois ainda voltas a Portugal e jogas em clubes como o Rio Ave, o Feirense, Beira-Mar e Moreirense, e terminas a tua carreira no Brasil. Como é que descreverias esta fase final da tua carreira, e a tua retirada do futebol foi algo difícil de encarar?

    Gaúcho: É assim, quando eu fui para o Brasil em 2009, eu tinha contrato até com o Moreirense FC, depois rescindi o contrato e fui para o Brasil. Fui para o Brasil, é uma notícia triste porque o meu irmão sofreu um acidente de mota e acabou por falecer.

    Bola na Rede: Lamento.

    Gaúcho: Obrigado. Era um irmão muito próximo a mim e eu acabei por ir para o Brasil, resolvi voltar de vez com a família para o Brasil e eu não queria mais jogar. Então, eu fazia parte de um grupo de amigos, de empresários e tive um empresário chamado Nivaldo, muito conhecido aqui em Portugal, jogou no Benfica. E o Nivaldo falou “Gaúcho, tu não queres jogar no Santa Cruz?” e eu falei para o Nivaldo “não, eu estou com 37 anos, já não quero” e ele “está bem, pronto”. Numa segunda-feira, ele me liga, o Nivaldo, eram umas 11 horas da manhã: “a tua apresentação é hoje no Santa Cruz, às três horas da tarde”. “Está maluco?”, “Já falei aqui com o treinador, com o presidente” e eu “Estás maluco, Nivaldo? Eu com 37 anos?”, “tens que vir, tens que aparecer”. Então fui, me apresentei e fui para o Santa. E o jornalista lá tipo “como é que é possível? Ó Gaúcho, com 37 anos, o que você tem a dar ao Santa Cruz?” eu falei “o que é que eu vou dar? Vou dar o meu melhor, vou tentar fazer golos”, sabe que a imprensa no Brasil não é fácil. Então comecei a treinar. No meu primeiro jogo, na minha estreia, eu fiz quatro golos, e os jornalistas “ah porque o jogo foi em casa, sei lá e tal”. No jogo fora, num campo difícil, eu fiz dois, aí começou a bola de neve, fui o melhor marcador ainda do Santa Cruz, com 38 anos.

    Bola na Rede: Já alguma vez tinhas feito quatro golos num jogo na tua carreira?

    Gaúcho: Já, aqui em Portugal.

    Bola na Rede: Em que jogo, lembras-te?

    Gaúcho: Foi para a Taça, Estrela e Vila Real. Demos 4-0.

    Bola na Rede: Marcaste 103 golos na I Liga, és inclusive o sexto jogador estrangeiro com mais golos na história do campeonato português, de todos esses golos, tens algum que seja o teu favorito, ou algum que te tenha ficado na memória?

    Gaúcho: Eu acho que esses 103 golos está errado, eu acho que esse número está errado, sabe porquê? Quando eu faço 100 golos, eu estou no Rio Ave, no primeiro ano, no segundo ano no Rio Ave eu faço 10 golos. O meu golo 100 faço contra o Boavista, de cabeça. O meu primeiro golo é contra o Leça, de cabeça, e o golo 100 é contra o Boavista, de cabeça também. O meu treinador era o Carlos Brito, no primeiro ano, no Rio Ave, e no segundo ano acho que era o Eusébio, e eu faço 10 golos pelo Rio Ave nesse ano.

    Bola na Rede: E desses todos, tens algum favorito que te tenha ficado na memória?

    Gaúcho: Eu acho que me lembro de todos, mas o que ficou mais na memória foram dois golos em Alvalade, contra o Sporting, no Porto também. Eu tenho um golo assim, que gosto mais de falar, é aquele golo com que nós ganhamos ao Porto, Marítimo 2-1 Porto, que o Porto vinha com 29 jogos sem perder, com o Mourinho. Então eu fiz um grande golo, ganhámos de 2-1, fiz um grande golo nesse dia.

    Bola na Rede: Nos muitos anos que passaste no futebol português, estiveste várias épocas no nosso campeonato, qual foi ou quais foram os defesas centrais mais complicados que tiveste de enfrentar?

    Gaúcho: Eu não gosto de citar, mas foram todos, porque aqueles centrais naquela época eram centrais ex-internacionais, eram grandes centrais, o Jorge Costa, o Aloísio, não é? Eram grandes centrais, então tu tinhas que ser bom para fazer golo. Eram grandes centrais. Depois eu peguei com o Jorge Andrade, o Jorge Andrade era um chato do caraças, meu amigo, meu irmão, mas ele metia porrada em mim [risos]. Foram tempos espetaculares.

    Bola na Rede: Em 2018, num programa da Sport TV, o Bar Sport TV, disseste, e passo a citar “quando jogava, eu me divertia, eu brincava”, esta foi sempre a mentalidade que tiveste em relação ao futebol e à tua carreira?

    Gaúcho: Sim, sim. Quando eu ia jogar eu me divertia, para mim aquilo era uma diversão, agora assim, com responsabilidade sabe? Eu conversava com os centrais, perguntava como estava a família, os filhos, eu estava sempre a rir, depois eu levava porrada. Eu fui sempre assim, até na vida eu sou assim, sou uma pessoa que gosta de brincar, que gosta de estar, sabe? Fui sempre assim.

    Bola na Rede: Para os adeptos de futebol mais jovens, que não te viram jogar, como é que descreverias o teu estilo de jogo? Eras um avançado que às vezes descia no terreno para ajudar a jogar ou ficavas mais a grande área?

    Gaúcho: Eu costumo dizer, até falo isso para o Jorge Andrade, eu digo sempre “Jorge, nesse tempo eu acho que eu não jogava”, “mas porquê?”, “Ó Jorge, hoje defendem ali os 11 jogadores na entrada da área, eu quando jogava não passava da linha do meio-campo”. Não passava, fui sempre assim, se eu ficasse ali, os centrais não me iam deixar ali sozinho do jeito que eu era, eu era matador mesmo, era muito eficaz, eu tinha uma oportunidade e eu fazia. Então o que é que eu fazia? Eu ficava ali, eu segurava dois centrais comigo, dava certo. Eu quando vejo um ponta-de-lança ali a defender na entrada da área eu fico doido, eu fico louco, fico “como é que é possível cara?”. Mas pronto, o futebol de hoje está mudado.

    Bola na Rede: Numa entrevista que concedeste ao Maisfutebol, em 2018, deste a conhecer que tinhas dois salões de cabeleireiro, um em Recife, no Brasil, e outro aqui em Portugal, em Santa Maria da Feira. Esses dois negócios ainda continuam ativos, mesmo com a pandemia, conseguiste mantê-los ativos?

    Gaúcho: Não, hoje só tenho aqui mesmo em Santa Maria da Feira, a minha barbearia “Brotherhood”. Tem que vir aqui cortar o cabelo [risos].

    Bola na Rede: Sou de Lisboa, mas um dia passo por aí. Nessa mesma entrevista, disseste que o teu mundo era o futebol, que querias ser treinador e que até já tinhas tirado o segundo nível do curso de treinador. Mas, para além da equipa B do União de Lamas, não treinaste mais nenhuma equipa, continuas a ter esse objetivo?

    Gaúcho: Sim, sim, sim, eu sou adjunto do Jorge, quando o Jorge Andrade arranjar um clube eu sou adjunto dele, eu vou com ele. Mas eu gosto de treinar, gosto de ajudar, gosto de estar por dentro. O cheiro da relva, não posso perder esse cheiro da relva, desde miúdo então, isso foi minha vida e é muito importante para mim, fazer parte de uma comissão técnica, eu gosto.

    - Advertisement -

    Subscreve!

    Artigos Populares

    Há dois históricos espanhóis interessados em De Arruabarrena

    Ignacio de Arruabarrena está a fazer mais uma boa...

    Lille e Lyon protagonizam grande jogo com sete golos

    O Lille de Paulo Fonseca foi derrotado pelo Lyon...

    Crystal Palace ‘humilha’ Manchester United para a Premier League

    O Crystal Palace recebeu e goleou o Manchester United...

    Nápoles empata com Udinese e soma quatro jogos sem vencer

    O Nápoles deslocou-se ao norte de Itália, para empatar...
    Afonso Viana Santos
    Afonso Viana Santoshttp://www.bolanarede.pt
    Desde pequeno que o desporto faz parte da sua vida. Adora as táticas envolvidas no futebol europeu e americano e também é apaixonado por wrestling.