«Eu era mais forte e mais conhecido do que o Eto’o nos Camarões» – Entrevista BnR com Meyong

– Faro pelo golo e pela glória –

«Quando comecei a minha carreira era central»

 

Bola na Rede: Se fizeste a carreira que fizeste foi muito pela tua capacidade de marcar muitos golos. O “instinto goleador” existe mesmo?

Meyong: Sim, isso existe. Quando comecei a minha carreira, aos 12,13,14 anos, era central. Só que eu subia muito e, quando subia, nos cantos e nos livres, fazia golos. O meu treinador disse-me: “Sempre que sobes fazes golo, porque é que não jogas à frente?”. Eu disse: “O mister é que sabe”. Comecei a jogar à frente e continuei a fazer golos. Às vezes, parece que as bolas vêm ter contigo, mas se um avançado não tem isso não vai ser um goleador. Lembro-me do Jardel, por exemplo. Ele cabeceava bem, mas parecia que os cruzamentos iam ter com ele. Como é que se explica isso? Ele tinha qualquer coisa. Primeiro, tens que ter qualidade, depois é que vem o resto. Depois, tens que saber finalizar e tens que ter as oportunidades. Há muitos avançados que são bons, mas que não têm golos.

Bola na Rede: Fala-se muito do avançado ter que se saber mexer sem bola para ir à procura das oportunidades. Tinhas esse cuidado quando jogavas?

Meyong: Sim, é fundamental. Se não te sabes movimentar e posicionar na área é difícil. A maioria dos grandes avançados sabe-se movimentar na área. Já para não falar da movimentação no campo. O futebol é um jogo de equipa e tens que te movimentar em função da equipa. Depois, cada jogador tem a sua função e tu tens a tua, que é fazer golo. Movimentar-se na área é das coisas mais importantes para um avançado.

Bola na Rede: Quais eram as movimentações que mais gostavas de fazer?

Meyong: Aquelas coisas que todos os adversários devem perceber. Por exemplo, quando estava à espera de uma bola ficava nas costas do defesa-central para poder antecipar a frente dele em caso de cruzamento. Eu fazia sempre o movimento contrário. Se eu estava à frente do defesa e o cruzamento vai sair, eu fingia que ia para a frente e depois voltava para trás para pedir a bola nas costas dele. Também depende de onde é que está a bola e de onde sentes que ela pode cair. Tens que sentir, porque são decisões que tomas num segundo. Tens que ser rápido. Isso define que ponta de lança és.

Bola na Rede: Depois, como é que vieste para Portugal?

Meyong: Primeiro, quando estava em Itália, fui transferido para Espanha, para o Mérida. No entanto, a equipa tinha problemas financeiros e acabou. Até encontrei lá o Nuno Espírito Santo. Fiquei lá uma semana. Depois, o meu empresário trouxe-me para Portugal, mas não era para o Vitória FC, trouxe-me para o Benfica. Eu jogava na seleção olímpica dos Camarões e até era capitão.

Bola na Rede: Deste nas vistas e foram-te buscar para o Benfica?

Meyong: Estava a treinar com a equipa B, não com a equipa principal. A equipa B do Benfica, naquela época, estava na Segunda Divisão B. O José Morais, que treinava o Benfica B na altura, disse-me que eu assinava contrato com o Benfica, mas que era para ficar na equipa B primeiro. Eu disse-lhe que não tinha problema, mas a equipa B jogava numa divisão muito baixa e o meu empresário disse que não. O José Morais disse ao meu empresário que o Vitória FC estava a precisar de um avançado. O Vitória FC estava na Primeira Divisão, mas estava em último. O Rui Águas, treinador do Vitória FC falou com o meu empresário, para eu ir fazer um jogo amigável para ele me ver a jogar. Eu fui lá, fiz o jogo e ele disse que ficava comigo.

Bola na Rede: Qual foi o primeiro impacto da chegada ao clube?

Meyong: Eu não conhecia muito o clube. O que sabia era que o [Rashidi] Yekini, um avançado nigeriano que toda a África conhece, tinha jogado lá. Se o Yekini tinha jogado naquela equipa era porque era uma grande equipa. O Vitória estava no último lugar, mas eu vi que era um grande clube. O impacto foi muito grande, porque os adeptos e a cidade… Fui muito bem acolhido. Até hoje não me farto de gostar do clube.

Bola na Rede: Em 2004/05 fazes parte da equipa que venceu a Taça de Portugal. Como viveste esse dia?

Meyong: Foi um grande ano. O Vitória, naquele tempo, já tinha muita dificuldade. Andávamos com alguns meses de salários em atraso, mas tínhamos um grupo fantástico, com bons jogadores e muito forte mentalmente. O mais importante é que tínhamos a cidade toda atrás de nós. No jogo da final, nem a direção acreditava em nós. Fomos para o campo sem champanhe e sem camisolas de campeão. Não tínhamos nada disso. Eles não prepararam nada. Quem acreditava mais eram os adeptos, a cidade de Setúbal. Eu lembro-me que o Benfica tinha uma parte do Jamor cheia e a outra estava cheia de adeptos do Vitória. Nunca vi tantos adeptos do Vitória FC. Há muitos jogadores que jogam no Vitória FC e que não sabem a grandeza do clube. Eu fiz jogos com o Bonfim cheio, até em jogos da Segunda Liga. Muitos jogadores que passaram por aqui não sabem disso. Nesse ano, fomos ao Jamor, ganhámos e tivemos que ir ao balneário do Benfica pedir champanhe. Eles mandaram-nos embora todos chateados. Festejámos com água. Éramos pobres, mas conseguimos trazer a taça para Setúbal. Chegámos a Setúbal e… inacreditável! Nunca vi tanta gente à espera de nós. Não foi só ganharmos o jogo, mas o facto de vermos tanta gente feliz e tu fazeres parte disso, é a maior felicidade que se pode sentir.

Bola na Rede: Sentes que ficaste marcado na história do clube por causa do golo que deu a vitória?

Meyong: Nós todos fomos heróis. Eu marquei o golo, mas a equipa toda é que conseguiu ganhar. Não se têm de lembrar apenas de mim, mas de todos os jogadores que fizeram parte dessa conquista.

Bola na Rede: Tu e o Vitória FC são uma só coisa?

Meyong: Eu considero que é a minha casa. Sinto-me muito bem aqui. Tenho muito carinho pelos adeptos. Passei por vários clubes, por exemplo, no Braga, onde também tive quatro anos fantásticos, e onde quase senti o mesmo que senti aqui no Vitória FC. Só que aqui tenho mais coisas. Gosto do clube e tenho a minha mulher que é de cá. É quase a minha segunda família.

Francisco Grácio Martins
Francisco Grácio Martinshttp://www.bolanarede.pt
Em criança, recreava-se com a bola nos pés. Hoje, escreve sobre quem realmente faz magia com ela. Detém um incessante gosto por ouvir os protagonistas e uma grande curiosidade pelas histórias que contam. É licenciado em Jornalismo e Comunicação pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e frequenta o Mestrado em Jornalismo da Escola Superior de Comunicação Social.

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