A ilha de Gran Canaria serve de quartel-general de um clube histórico do futebol espanhol que esta época está de regresso àquela que muitos consideram ser a melhor liga do mundo, a Liga BBVA.
O UD Las Palmas sobreviveu às agruras do playoff de subida da Liga Adelante, batendo numa final a dois jogos o Real Zaragoza graças a um golo marcado em La Romareda num jogo que perdeu por 3-1. Uma vitória por 2-0 no Estadio de Gran Canaria, quatro dias mais tarde, viria a confirmar o regresso dos insulares ao convívio dos grandes treze anos após a sua última passagem pela liga principal do futebol espanhol.
Os Amarillos são um clube singular, com uma história fantástica e que, apesar de poucos o saberem, esteve prestes a sagrar-se campeão espanhol na longínqua temporada de 1968-69, quando, pela mão de Luis Molowny, terminou no segundo posto da tabela atrás do poderoso Real Madrid, mas à frente de equipas como o FC Barcelona e o Valencia CF.
A realidade actual da equipa insular é bem diferente desses tempo de glória. Contudo, a crença, a vontade e aquele inexplicável sentimento mágico que torna este clube tão especial continua lá e esteve presente naquela final intensa do passado dia 21 de Junho, quando o endiabrado Sergio Araujo marcou o 2-0 a cinco minutos do final do jogo.
Neste seu regresso à primeira divisão do futebol espanhol, o UD Las Palmas apresenta no seu plantel jogadores de enorme qualidade, como o prodígio argentino Sergio Araujo ou como os canteranos Javi Castellano e Hérnan, mas o nome que mais salta à vista na equipa insular é provavelmente um homem que celebrou 40 primaveras no passado mês de Junho: o inconfundível Juan Carlos Valerón.
Há jogadores que marcam uma década ou até mesmo uma geração e aquele jovem franzino que, de acordo com o treinador que o lançou para o futebol, não pesava mais de 50kg com a roupa vestida e bem molhada, foi seguramente um dos melhores futebolistas espanhóis do último quarto de século e um dos mais respeitados em todos os estádios do país vizinho. Natural da Gran Canaria, foi no UD Las Palmas que Valerón cresceu para o futebol mas foi provavelmente nos 13 anos que cumpriu ao serviço do Deportivo La Coruña que mais se notabilizou. A sua forma tranquila e bem disposta de estar na vida têm-no ajudado a ultrapassar todos os desafios da sua carreira, nomeadamente as lesões no joelho que o mantiveram afastado do terreno de jogo durante algum tempo e que muitos consideraram que seria o canto do cisne da sua carreira.
Hoje, com 40 anos, a disponibilidade física não será certamente a mesma, mas a inteligência, a magia e o saber estar em campo ainda lá continuam e permitiram-lhe realizar 27 jogos oficiais na temporada passada. O homem que os colegas de equipa afirmam nunca terem visto aborrecido com coisa nenhuma (“Nunca lo he visto enfadado. Lo he llegado a ver… distinto, pero nunca enfadado. Con su cara siempre expresa calma”, nas palavras dos próprios colegas) é o braço direito do experiente treinador Paco Herrera e tem sido uma mais-valia no excelente trabalho que ele tem vindo a realizar desde que assumiu a liderança do clube insular em 2014.
Neste regresso à Liga BBVA, há um jogador que compõe o plantel do UD Las Palmas que tem despertado muitas atenções, tendo sido inclusivamente alvo de diversas alegadas propostas neste defeso. Sergio Araujo, o jovem argentino de 23 anos, optou por manter-se na equipa insular, assinando um contrato válido para as próximas cinco temporadas e quebrando definitivamente o seu vinculo com o Boca Juniors, clube do qual fazia parte desde 2009, mas que o fez sair em vários empréstimos consecutivos nos últimos anos. Para além de ter sido o herói da subida de divisão do UD Las Palmas, Sergio Araujo apontou 25 golos em 43 jogos na temporada passada, tendo-se tornado no segundo melhor marcador da Liga Adelante.
Os Amarillos podem gabar-se de ter contado, ao longo dos anos e no seu plantel, com avançados argentinos dotados de uma veia goleadora invejável, tal e qual como a de Sergio Araujo. Regressando atrás no tempo cerca de 20 anos, o UD Las Palmas aparece na minha memória muito graças a um possante avançado argentino chamado José “Turu” Flores, que marcava golos como ninguém naquelas tardes de Verão que passava com o meu primo em frente a um velho Pentium 120 a jogar um simulador de futebol espanhol que dava pelo nome de PC Fútbol. El Turu Flores era, no entanto, mais do que o boneco de 8bits com um pontapé violentíssimo e que espalhava terror nas balizas adversárias.
O avançado argentino, que foi na altura a contratação mais cara do segundo escalão do futebol espanhol (custou aos insulares 550 milhões de pesetas, cerca de 3 milhões de Euros) marcou 35 golos em 68 jogos cumpridos pelo UD Las Palmas e foi por muito pouco que não fez com que a equipa insular regressasse à primeira divisão na época 1997-98, onde foi a equipa eliminada pelo Real Oviedo no playoff de subida. Será interessante realçar que, durante a sua passagem na formação insular, El Turu Flores também jogou ao lado daquele que hoje é considerado o abuelo da Liga BBVA: nada mais, nada menos, que Juan Carlos Valerón.
Das glórias do passado à realidade do presente, o UD Las Palmas teve no Atlético de Madrid o seu primeiro adversário neste regresso à Liga BBVA, mas, apesar de terem dado boa conta de si, os insulares não conseguiram levar qualquer ponto do Vicente Calderón, acabando derrotados por 1-0 graças a um golo do inconfundível Antoine Griezmann.
A história do futebol espanhol não se resume aos feitos do Real Madrid e do FC Barcelona e, por muito que nos queiram vender essa ideia, não devemos deixar que o contributo que equipas como o UD Las Palmas deram à modalidade sejam apagados da nossa memória colectiva.
Fonte da imagem de capa – www.gradacurva.com