João Almeida | Duro nas Caldas, Maglia Rosa em Itália, Sheik nos Emirados

    Não há duas etapas em destaque sem três etapas em destaque. Novamente no Top10 da jornada, João Almeida passou com nota positiva no teste de Jebel Hafeet. Perdeu o segundo lugar e viu a hipótese de lutar por algo mais do que o terceiro posto a complicar-se, mas Tadej Pogačar e Adam Yates cavaram um fosso que basicamente ditou o alinhamento dos dois lugares cimeiros da classificação final. Foram os mais fortes, todavia, no que toca aos restantes, João Almeida foi o mais esclarecido e continuou a demonstrá-lo em altitude, terminando na sexta posição e sem perder um único segundo para mais ninguém.

    Não foi um dia onde esteve em evidência, pelo menos como o fez em Jebel Jais (quinta etapa). Talvez as pendentes mais íngremes justifiquem esse facto. Resguardou-se enquanto pôde e colocou-se ao trabalho quando teve de perseguir o duo da frente, na tentativa de manter a segunda posição. Não teve muito cooperação dos colegas de grupo, puxando o comboio quase até à linha de meta.

    Após dois dias destinados ao sprint, era a vez de Jebel Jais aparecer no horizonte. O perfil desta dificuldade contrastava com a da anterior etapa de montanha no sentido em que, apesar de ser mais longa, detinha pendentes mais acessíveis. Como era de prever, essa particularidade acarretava a possibilidade de se fazerem diferenças menos significativas, o que acabou por se suceder.

    João Almeida foi quinto na etapa, segurando o seu terceiro lugar e ficando em grande plano depois de ter disferido um ataque na tentativa de vencer a etapa e aproximar-se de Adam Yates. Este momento talvez tenha sido chave para qualificar a boa exibição do português em toda a prova, assim como definir o próprio, como um desportista ambicioso.

    Apesar de não ter surtido diferenças, sobretudo pela pouca inclinação dos metros finais e também do perigo que João Almeida representava na geral, a revelia do caldense deu-se nas condições ideais para o seu perfil de escalador. É certo que nunca teria a liberdade para fugir como Jonas Vingegaard, o vencedor da etapa, teve, mas fez o seu papel e sempre com a mentalidade vencedora, de querer mais e de lutar por isso nos seus eixos. Ciclismo é justamente sobre isso: esforço, capacidade, coletivo e talento. O terceiro lugar não mais fugiu apesar do susto na última etapa, onde chegou a cair duas posições no decorrer da tirada, mas conseguiu recuperar.

    Filho de uma geração de diamantes em bruto a fervilhar dentro do pelotão internacional, a travessia pelo caloroso deserto dos Emirados Árabes Unidos trouxe mais do mesmo. Tem chama, tem astúcia e tem capacidade de sofrimento. Pendentes íngremes não se adequam perfeitamente, preferindo inclinações mais acessíveis para pôr em prática as clássicas mudanças de ritmo que é capaz de revelar.

    O ponto a trabalhar passa mesmo por aí, o quebra-cabeças das percentagens de inclinação brutais e as altimetrias consideráveis, como o exemplo da escalada ao Stelvio. No contrarrelógio é capaz, em grupos restritos é capaz de sprintar e de ir às bonificações. É consistente, resiliente e encontra-se numa equipa que lhe dá todas as condições para liderar na maioria dos cenários.

    A imagem de marca continua a ser este carácter lutador, com aquelas expressões faciais a que já estamos habituados. É no meio do sofrimento e da perseverança que nasce, nasceu ou ainda está para nascer um grande campeão. Isto é apenas o início de carreira de mais um atleta português que caiu nas graças do povo em 2020, e começou 2021 a somar mais um “título”, o de Sheik dos Emirados Árabes Unidos, dada a riqueza das suas exibições e do seu primeiro pódio no World Tour.

    Foto de Capa: Deceuninck Quick-Step

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    Ricardo Rebelo
    Ricardo Rebelohttp://www.bolanarede.pt
    O Ricardo é licenciado em Comunicação Social. Natural de Amarante, percorreu praticamente todos os pelados do distrito do Porto enquanto futebolista de formação, mas o sonho de seguir esse caminho deu lugar ao objetivo de se tornar jornalista. Encara a escrita e o desporto como dois dos maiores prazeres da vida, sendo um adepto incondicional de ciclismo desde 2011.