Lições de uma reviravolta improvável

    Há que puxar pela memória e lembrar que, apesar de bicampeões, nem tudo no Benfica eram rosas. Durante vários anos as queixas foram sempre as mesmas: dizia-se que não existia a intenção de fazer da Champions League uma prioridade para o Benfica, que se descartava facilmente a possibilidade de enquadrar jogadores da formação na equipa principal, que volta e meia existiam uns rasgos de pseudo-criatividade a nível tático em jogos de maior importância que quase sempre davam mau resultado, e, por último, que quem liderava a equipa tinha consecutivamente uma postura inapropriada e inaceitável quando representava o Sport Lisboa e Benfica (apesar de muita gente achar isto perdoável face aos resultados, não considero que seja um fator menor e merece ponderação).

    Enfim, apesar de ser verdade que os resultados positivos existiam e no fundo é isso que sossega a massa associativa, existiam inúmeras falhas em opções de fundo que denunciavam um certo descuido face àquilo que deve ser o projeto Benfica a longo prazo: um clube com maior relevância internacional, com jogadores com consciência benfiquista capazes de personificar a nossa mística. Em dez meses, Rui Vitória iniciou a trajetória de inversão.

    Mostrou que é possível fazer exibições de qualidade face às melhores equipas da Europa, enquanto se lidera um campeonato nacional. Alguém que não compreende que isto tem que ser o básico do Benfica ano após ano não compreende o que é o Benfica. Havia uma intenção de convencer de que o clube não tinha a dimensão necessária para sequer ambicionar vingar nas duas frentes, mas Rui Vitória desmistificou esse complexo de inferioridade que se quis impor.

    E isto é que deve ser o Benfica daqui para a frente. Esta época terá que servir de precedente para consolidar as presenças e vitórias na Champions. Se já se conseguiu manusear o domínio interno, foi nesta época que se deu o primeiro passo para criar um novo paradigma de equilíbrio obrigatório entre frentes nacionais e internacionais.

    Num ano em que a Caixa Futebol Campus é premiada com o título de “Best Academy of the Year”, Rui Vitória limitou-se a dar lugar a quem o lugar já era devido. Ultimamente tem havido críticas que tentam relativizar esta aposta na formação, constatando que afinal só há três ou quatro jogadores nessa circunstância. Que me recorde, nunca se disse que o Benfica deveria passar a ter, de um ano para o outro, uma equipa de jogadores totalmente formada no clube. A diferença que se pedia e a diferença que ocorreu é na oportunidade concedida para jogar. Também aqui há novo precedente para que se continue a abrir a porta a jovens formados no Seixal se a qualidade o justificar. É uma das peças chave para construir o Benfica de amanhã, que se quer com jogadores que crescem a perceber a magnitude da causa que servem. Gradualmente, lá se há de chegar.

    O SL Benfica recebeu o prémio de 'Best Academy of the Year' Fonte: SL Benfica
    O SL Benfica recebeu o prémio de ‘Best Academy of the Year’
    Fonte: SL Benfica

    Apostar simultaneamente na formação e nas prestações em competições europeias tem que ser a fórmula de ouro. A Champions não serve só para ganhar o título de campeão europeu; serve também de uma via direta de financiamento que permitirá segurar os talentos que são gerados para que cheguem efetivamente à equipa A e possam ser facilmente mantidos. Uma vez que o próprio Rui Vitória já integrou uma equipa técnica de Juniores e sabe o valor do trabalho que por lá se desenvolve, com toda a certeza compreende como estas duas pontas têm que se ligar.

    Mais: a segurança que é ter o plantel nas mãos de alguém que tem a consciência de que não está em posição de fazer experiências e malabarismos! Ao longo do ano, conhecemos um treinador que valoriza a consistência tática e que sabe ler o jogo e fazer substituições necessárias na grande maioria das vezes. No máximo, as críticas que têm sido feitas devem-se ao facto de jogar com onzes semelhantes frente ao Bayern e frente ao Vitória de Setúbal, pelo que eventualmente o fim trágico do cansaço físico chegará com maus resultados. Estamos cá para ver.

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    Leonor Caldeira
    Leonor Caldeirahttp://www.bolanarede.pt
    A Leonor é apaixonada pelo Benfica desde 1993, ou seja, desde que nasceu. Mora em Londres, mas o coração mantém-se no mesmo sítio: Av. General Norton de Matos, 1500-313 Lisboa, Estádio da Luz, a "casa" do Sport Lisboa e Benfica.                                                                                                                                                 A Leonor não escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.