Desnorte

    Quando aqui escrevi sobre as periclitantes situações contratuais de Brahimi e Herrera pedi (quase implorei) para que a estas fosse conferido estatuto de prioridade máxima e requeri um tratamento minucioso das mesmas (julgo que a expressão utilizada na altura foi “com pinças”) tal era a sua sensibilidade e importância para o futuro próximo do clube.

    Se as minhas preces foram ouvidas (ou lidas no caso) foram integralmente ignoradas. Prova-se, mais uma vez, que reina o desnorte na SAD azul e branca.
    Muitos estarão, por esta altura, a preparar punhais e pedras revoltando-se para com esta afirmação. Antes que o façam, permitam-me uma explicação.

    Um clube jamais pode ficar refém de um qualquer jogador. A instituição será sempre maior do que qualquer um daqueles que a representam, sejam dirigentes, treinadores ou jogadores. Está claro que se Herrera exigiu 6M€ para renovar o contrato (tomemos as declarações do presidente como verosímeis) a única postura que o FC Porto poderá ter perante tal exigência será recusar e renegociar. Em caso de intransigência por parte do jogador está, para mim, claro que a decisão da SAD terá sempre que ser perentória.

    Agradecer ao jogador o contributo que deu ao clube e deixa-lo seguir o seu caminho num qualquer outro lugar e clube. Uma vez mais, o clube está acima de qualquer colaborador. Mais, estou totalmente de acordo com aqueles que recordam que o rendimento de Herrera ao longo da sua passagem não foi regular e, na grande maioria do tempo, foi, até, insuficiente. Esta época tem sido exemplo disso mesmo. Não é menos verdade, ainda assim, que Herrera terá sido um dos melhores, senão o melhor, e mais importantes jogadores do plantel que na temporada passada se sagrou campeão nacional.

    Portanto, o desnorte a que me refiro não se prende com a postura intransigente da SAD face à hipotética exigência do jogador, mas sim pela forma como o fez e como decidiu tratar o assunto na praça pública.

    Primeiro, tanto a situação de Brahimi como de Herrera deveriam ter sido precavidas com antecedência e jamais os jogadores poderiam entrar numa última época de contrato. É sabido que, principalmente no caso dos jogadores mais importantes, é quase obrigatório recorrer a negociações e renovações de contrato dois ou três anos antes do seu terminus para evitar que empresários externos plantem na cabeça dos jogadores a ideia de prémios de assinatura chorudos. Chegados a esse tal último ano torna-se, então, fundamental o máximo rigor. Exigem-se esforços financeiros suplementares e já aqui escrevi que considero que o FC Porto poderia e deveria fazer de ambos os jogadores os mais bem pagos do nosso campeonato.

    Há, no entanto, limites que os tais 6M€ por temporada ultrapassam em larga escala e que apenas se justificam no improvável caso de já existir um comprador para o jogador no próximo verão. Improvável porque qualquer clube interessado começará, agora, a negociar diretamente com o empresário do jogador. Parece, portanto, inevitável que os jogadores deixem o clube sem gerar mais valias em mais uma amostra de incompetência e gestão danosa de uma SAD que se arrisca, cada vez mais, a sair do clube pela porta pequena depois dos grandiosos feitos que atingiu no passado.

    Herrera depois de marcar o decisivo golo no Estádio da Luz que empurrou o FC Porto para o título
    Fonte: FC Porto

    Mas, o que maior perplexidade me causou foram as declarações de Jorge Nuno Pinto da Costa, revelando à comunicação social a tal exigência (a ser verdade é mais do que legítima, diga-se) de Herrera. Um exercício assassino que não serviu para mais do que alterar o foco da ira dos adeptos. Para proteger uma SAD que, pelo enésimo exercício consecutivo, apresenta prejuízo, que fez escalar o passivo do clube para perto dos 500M€, que após promessas de redução da massa salarial do clube apresenta um máximo histórico, que pelo segundo ano consecutivo vai deixar sair jogadores importantes sem qualquer contrapartida para o clube e que, perante tão perigosa situação financeira, vê os membros que a compõem aumentarem largamente os seus principescos vencimentos anuais, o Presidente preferiu vulnerabilizar o plantel e apontar armas ao capitão de equipa. E assim, em mais uma jogada reprovável consegue que uma cega nação portista prefira atacar um jogador que nada mais fez do que marcar o golo que deu o título de campeão nacional e pedir um legítimo e, até, merecido aumento de vencimento (seguramente menos do que, somando salário e prémio de assinatura, vai receber no seu futuro clube) em vez de reprovar a gestão de uma SAD que (está visto) não pede autorização a ninguém para aumentar o seu e que conduziu o clube a uma situação de pré-falência e à alçada do fair-play financeiro da UEFA.

    Herrera não nasceu no Porto, provavelmente não conhecia o FC Porto até ter sido abordado para uma eventual transferência. Aprendeu a gostar do clube, todos os treinadores que o orientaram atestam o seu compromisso e, mesmo com um rendimento discutível a verdade é que foi sendo utilizado por todos eles. A carreira de futebolista é curta e ninguém pode julgar um jogador nestas condições por querer ir à procura de um melhor contrato. Deixa o clube sem contrapartida e, por isso, é natural que exista uma mais do que justificada mágoa nos adeptos mas está longe de ser o suficiente para que se enforque o jogador e se perdoe os verdadeiros prevaricadores.

    E assim, para finalizar, passa-se a batata quente para as mãos do treinador. Sérgio Conceição fica, agora, com a espinhosa missão de estabilizar a cabeça do jogador e um plantel desestabilizado, imagine-se, pela estrutura diretiva do clube. Era uma vez o clube no qual o seu treinador era pago exclusivamente para treinar. Era uma vez o clube com uma estrutura forte que não olhava a meios para blindar o balneário. Era uma vez…

    Foto de Capa: FC Porto

    Artigo revisto por: Jorge Neves

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    Bernardo Lobo Xavier
    Bernardo Lobo Xavierhttp://www.bolanarede.pt
    Fervoroso adepto do futebol que é, desde o berço, a sua grande paixão. Seja no ecrã de um computador a jogar Football Manager, num sintético a jogar com amigos ou, outrora, como praticante federado ou nos fins-de-semana passados no sofá a ver a Sporttv, anda sempre de braço dado com o desporto rei. Adepto e sócio do FC Porto e presença assídua no Estádio do Dragão. Lá fora sofre, desde tenra idade, pelo FC Barcelona. Guarda, ainda, um carinho muito especial pela Académica de Coimbra, clube do seu pai e da sua terra natal. De entre outros gostos destacam-se o fantástico campeonato norte-americano de basquetebol (NBA) e o circuito mundial de ténis, desporto do qual chegou, também, a ser praticante.