Durante anos o Benfica ganhou muito e era o grandioso clube português, em boa parte devido a Eusébio. Era considerado o clube do povo e não é à toa que hoje em dia tem tantos sócios e adeptos pelo mundo inteiro. O único clube capaz de lhe fazer frente era o Sporting. A partir de 1982, Pinto da Costa passou a presidente do Futebol Clube do Porto. O clube azul e branco começou a ganhar vários títulos, alguns até internacionais. Com essas vitórias veio uma pseudo-descoberta que iria marcar o mundo do desporto neste país: o futebol português tinha achado o precursor do mal! Durante anos Pinto da Costa foi considerado o problema – o único – do nosso futebol. As vitórias do clube foram diminuídas, principalmente pelo Benfica. Nada daquilo que o clube da província fizesse parecia interessar ou criar espanto genuíno em adeptos de outras equipas cá dentro.
As vitórias mantiveram-se, o pó das prateleiras deu lugar às taças, os cofres encheram-se com o dinheiro da venda de muitos e grandes jogadores, o modelo de gestão começou a servir de exemplo para casos de estudo em algumas das faculdades mais importantes ao nível europeu, o nome de Portugal parecia ter cada vez mais força quando o assunto era futebol. Em 2004 circulava o rumor de que algures no mundo o Sporting detinha o estatuto de melhor escola de médios e o Porto de melhor escola de defesas centrais. De certa forma pode-se dizer que, no que toca ao deporto-rei, Portugal é Eusébio, Mourinho, Figo, Cristiano Ronaldo e Futebol Clube do Porto, sendo que a grande diferença desta lista é que apenas o Porto é mutável de entre os nomeados. Daqui a 30 ou 40 anos os outros mantêm-se mas o clube azul e branco pode já não estar lá, tudo dependerá das suas conquistas e das “vendas recorde” de jogadores.
Hoje em dia temos um Benfica extremamente bem vestido mas de camisa rota. E neste fato pode-se mudar o casaco, a gravata, as calças e os sapatos, mas a camisa ficará sempre mal. Jorge Jesus é um dos treinadores mais bem pagos do mundo, tem um plantel fantástico, mas a estrutura está a ficar cada vez mais fraca. No entanto, parece que o ano de 2013 serviu para abrir muitos olhos. O Benfica está a sofrer uma ligeira mudança, talvez a mais importante, a única que precisava, aquela que é feita de fora para dentro, aquela que vem dos adeptos. Ou talvez seja apenas por verem o Sporting em primeiro lugar. Mas o que é engraçado no meio disto tudo é que aquele papel constante de antagonista e acusador parece ter saltado para a outra margem da 2ª Circular. O Sporting, clube respeitado por todos e que sofreu bastante com várias presidências incapazes e incompetentes, tomou as rédeas do cavalo da acusação, elevou o estandarte da Casa Real da Vítima Coitadinha, e decidiu apontar o dedo a todos. Agora, aquilo que começou por ser uma guerra contra o Porto, liderada pelo presidente Bruno de Carvalho, estendeu-se ao Benfica. O mal, segundo Bruno de Carvalho, tem afinal duas faces, e na origem desta guerra está João Moutinho e a rivalidade da 2ª Circular. Faz lembrar o recreio da escola… Mas não percamos a postura.
Claro que seria impreciso colocar de fora o facto de este presidente estar a “pôr a casa em ordem” e de trazer união aos sportinguistas (união, essa, que eles tanto gostam de negar que alguma vez tenha deixado de existir, embora todos saibamos que são as crises que unem as pessoas, e não os momentos de júbilo), mas o problema é que um líder deve ser sempre avaliado por aquilo que faz e diz, algo que parece não estar a acontecer no Sporting. Aquilo que Bruno de Carvalho diz é interpretado pelos seus adeptos como verdade absoluta. Os seus devaneios são como pão para a boca, e tanta é a necessidade de respeito e de imposição que a capacidade de filtragem é quase nula. Quando a fome é grande e a batata tem casca ninguém dá uso à faca! No rescaldo do empate a zero entre Sporting e Nacional, o que mais se via pelas redes sociais eram as insinuações dos adeptos leoninos sobre os planos de Pinto da Costa e de Luís Filipe Vieira para este campeonato. Esta ideia não surgiu do futebol, mas sim dos interesses que o rodeiam. E assim, cada vez mais, deixa de se discutir futebol, de se falar do jogo jogado, dos jogadores, dos grandes lances, dos erros, das más decisões tácticas, das substituições que ninguém entende, para se dar lugar à lamentação e à insinuação sem qualquer prova ou sentido de causa, sem ser aquela criada por quem diz o que lhe apetece fruto da sua posição hierárquica e mediática.
O que começou por ser “dois contra um” passou a ser “um contra dois”. O papel que pertencia, maioritariamente, ao Benfica, tem agora um outro protagonista. E, aparentemente, a liderança do Sporting parece “preocupar” muita gente. Dos outros não falo, mas a mim sei que só uma coisa me preocupa: o Porto e o seu futebol. Quem diz que os outros ficam preocupados só porque tem sido o melhor ultimamente, ou tem complexos de grandeza ou de inferioridade.