«O CD Tondela era o único clube em que não me via como suplente» – Entrevista BnR com Tozé Marreco

    – Em tempos, goleador –

    «O Tondela era o único clube em que não me via como suplente»

     

    Bola na Rede: Como jogador, deste os teus primeiros passos como profissional no estrangeiro. Alguma vez pensaste em ser daqueles jogadores que é emigrante a vida toda ou sempre tiveste o objetivo de regressar a Portugal e te mostrares nos nossos campeonatos?

    Tozé Marreco: Sempre tive a ambição de jogar aqui. Costumo dizer que tive que ir à volta. Havia sempre a ambição de jogar aqui. Se calhar, essa ambição foi um erro, podia ter ficado. Depois, tinha as questões familiares que me obrigavam sempre a fazer muitas viagens. Chegou uma altura em que também queria estar mais perto de casa e mostrar que podia jogar em Portugal. Pensei sempre em ir jogar para fora para depois voltar.

    Bola na Rede: Qual era aquele jogar para quem tu olhavas e consideravas que tinha características parecidas com as tuas e, por isso, gostavas de repercutir os seus movimentos e ações?

    Tozé Marreco: Se me perguntares por uma referência, dizia-te o Falcão. Quando eu jogava nas Aves, ia ver muitos jogos do Porto, porque na televisão não tens noção do tipo de movimentos que o Falcão fazia. O van Nistelrooy na área também era qualquer coisa… Mas, se me perguntares uma referência assim grande, dir-te-ia o Falcão pela movimentação que ele fazia e porque, tal como o Jardel, vias o tipo de movimentos na área e não era por acaso que eles apareciam sozinhos. Só consegues perceber isso estando no estádio. Perceber como é que se escondem dos defesas, como é que se posicionam antes, que tipo de contramovimentos é que fazem… Depois, as pessoas dizem “olha, estão sozinhos na área”. Estão sozinhos, porque conquistaram esse espaço. Eles sabem onde é que o colega está, o colega sabe onde é que eles vão aparecer. As coisas não acontecem por acaso. O Falcão e o Jardel na área eram absolutamente temíveis.

    Bola na Rede: O que faltou para fazeres uma carreira mais sólida na Primeira Liga?

    Tozé Marreco: Faltou coragem e uma oportunidade. Sabes que nas duas vezes que fui para a Primeira Liga fui para contextos para fugir à descida. Um jogador com as minhas características precisava de outro tipo de jogo e não jogar ali na aflição. Aí não houve oportunidade para me conseguir mostrar. Quando houve oportunidades, após a época em Tondela, senti que havia ali uma ou outra equipa que queria fazer essa aposta em mim, mas aí já preferi sair por uma questão financeira.

    Bola na Rede: Já admitiste publicamente que podias ter continuado no Tondela no ano em que subiram de divisão só que não o fizeste por sentires que não ias ter um papel principal na equipa. Tomarias hoje outra decisão? Sentes que perdeste aí uma grande oportunidade?

    Tozé Marreco: Sou sincero, aí foi parte do orgulho. O Tondela era o único clube em que não me via como suplente. Depois das épocas que fiz em Tondela, depois de fazer 20 e tal golos… O [Vítor] Paneira foi um pai para mim, é um amigo, é uma pessoa que estimo muito, mas nem eu lhe podia pedir para ele me garantir que ia jogar, nem ele o ia fazer. As condições que o Tondela me podia proporcionar naquela altura, comparado com as propostas que tive de fora, entendi que era o melhor para mim. Não posso dizer que me arrependi, porque fui para uma liga incrível, uma liga maravilhosa [Liga Belga] e onde me pagavam quatro vezes mais do que aquilo que iria ganhar no Tondela ou no Boavista, que foi o clube que mais fez força para que fosse para lá. Primeiro, não ia aceitar ser suplente em Tondela e, depois, a questão do Boavista foi uma questão financeira. O Boavista encaixava-se no tipo de clube que para mim iria fazer sentido. Acreditava que era um clube que me poderia ter levado para outros patamares nesse ano. Com a idade com que estava, tive que pensar no meu futuro e tenho que aceitar a proposta de uma liga que era também interessante.

    Bola na Rede: Seria possível dares continuidade, num contexto de Primeira Liga, ao rendimento que trazias da Segunda Liga?

    Tozé Marreco: Há uma coisa que é inegável. Jogadores que fazem mais de 15 golos na Segunda Liga, fazem golos na Primeira Liga. Fazem, não tenho dúvidas. Paulinho, Dyego Sousa… É só pensar um pouco. Quem faz 15 golos na Segunda Liga vai fazê-los na Primeira Liga. Eu também os fazia, não tenho dúvidas. Se os jogadores têm qualidade para fazer 15, 20 golos, como eu fiz, na Segunda Liga, têm capacidade para os fazer na Primeira.

    Bola na Rede: Na época em que és Melhor Marcador da Segunda Liga, foste também considerado o Melhor Jogador. Um avançado só é bom se fizer golos?

    Tozé Marreco: Em algumas análises, sim. O adepto comum então… Podes fazer um jogo incrível, podes pressionar nos timings certos, podes organizar a equipa porque o avançado tem um papel preponderante nos momentos de pressão, podes orientar pressão, podes segurar 50 bolas, podes ganhar 50 duelos, mas se rematas duas vezes e não fazes golo, o adepto comum vai-te dizer que não fizeste um bom jogo. Até alguns treinadores, na avaliação que fazem, fazem-no muito pela questão dos golos. Posso-te dizer que o meu avançado [David Silva] não fez golo na primeira volta toda e não o tirei. Aquilo que ele nos dava no resto era tanto que só faltava o golo e eu sabia que, mais dia, menos dia, ele ia acabar por acontecer. Houve aí uma fase em que se contratavam metros. Se era um avançado que tinha 1,95m, ok. E também houve a fase do avançado que corre por correr. Acho que tem que haver aqui um equilíbrio. Tento procurar avançados com essa capacidade que nos dá em todo o jogo, mas também que finalizem bem. Também não quero um avançado que faz um golo por época.

    Bola na Rede: Já pensaste no que vais dizer ao Paulinho se ele bater o teu recorde de golos na Taça da Liga?

    Tozé Marreco: É lógico que vá acontecer. Se não for nesta época, será daqui a duas épocas. Pode ser que seja uma forma da Liga reconhecer o Melhor Marcador. Acho que isso aí vai acontecer quando passar o Paulinho ou outro nome qualquer para a frente. Não houve esse reconhecimento por parte da Liga de eu estar estes anos todos à frente dos melhores marcadores e acredito que isso vá acontecer quando o Paulinho passar e acho que é mais do que justo, porque ele é 50 mil vezes melhor avançado do que eu.

    Artigo revisto por Joana Mendes

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    Francisco Grácio Martins
    Francisco Grácio Martinshttp://www.bolanarede.pt
    Em criança, recreava-se com a bola nos pés. Hoje, escreve sobre quem realmente faz magia com ela. Detém um incessante gosto por ouvir os protagonistas e uma grande curiosidade pelas histórias que contam. É licenciado em Jornalismo e Comunicação pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e frequenta o Mestrado em Jornalismo da Escola Superior de Comunicação Social.