«O Estrela da Amadora estará de volta à Primeira Liga nos próximos anos» – Entrevista BnR com Ricardo Chéu

    – Dinâmicas, controlos e pressões –

    «No futebol é preciso introduzir sempre algo novo. Se formos estáticos no processo, vamos ser facilmente anulados»

     

    Bola na Rede: Se tivesse que caracterizar estruturalmente a equipa do Estrela, como é que o faria?

    Ricardo Chéu: No futebol, não acredito em sistemas, acredito em dinâmicas. Quando falamos em sistemas táticos, falamos em peças numa estrutura parada. Acredito que o futebol é comportamental e, por isso, temos que influenciar os jogadores a interpretar essa dinâmica. O Estrela começou a jogar comigo numa estrutura de 4-3-3, mas num processo defensivo em que mantinha quatro defesas, três médios na mesma linha – não tínhamos médios assimétricos, um seis, um oito e um dez, como é normal – os três da frente com um ponta de lança mais posicional, com os alas a fazerem movimentos circulares para pressionarem de fora para dentro. Se calhar, em termos defensivos falaríamos em 4-3-3. No entanto, rapidamente, nos desdobrávamos, em termos ofensivos, num 3-4-3. Construímos a três, com um lateral metido por dentro. Aí, já estávamos a falar numa estrutura diferente, por isso, é que acredito muito nas dinâmicas.

    Bola na Rede: Porquê optar por esses três médios em linha? Por um lado, maior controlo da largura, mas, eventualmente, mais vulnerabilidade face ao jogo entre linhas do adversário?

    Ricardo Chéu: Pode ser visto de várias formas. Um dos motivos para se jogar dessa forma será garantir essa largura em termos de meio-campo. Temos que ter três jogadores extremamente concentrados e inteligentes na abordagem ao jogo nos diferentes momentos. Os jogadores que jogavam nessa dinâmica tinham, em termos defensivos, uma competência muito grande. Mesmo quando tivesse que sair um em pressão, os outros dois estavam num trabalho de cobertura constante. Não senti, naquilo que eram as nossas análises, que as equipas nos tentassem explorar o espaço entre linhas. O que nós queríamos com a dinâmica de meio-campo tinha muito a ver com aquilo que eram os movimentos circulares dos nossos alas na perspetiva de condicionar o jogo dos nossos adversários para dentro, de modo a termos superioridade interior no nosso meio-campo. Quando condicionávamos para dentro, encontrávamos a equipa adversária mais exposta para a nossa possível saída em transição. Um dos grandes princípios que tínhamos era no momento de recuperação de bola ler imediatamente a profundidade. Foram dinâmicas que foram criadas e que tiveram o seu efeito. Em termos estruturais, estamos a mudar um pouco a nossa forma de jogar, o que também tem a ver com as características dos jogadores que temos disponíveis. Já não estamos com a mesma dinâmica com que estávamos no início, porque acredito que no futebol é preciso introduzir sempre algo novo. Se formos estáticos no processo, vamos ser facilmente anulados.

    Bola na Rede: Essa adaptação é feita consoante o adversário ou devido à evolução da ideia do treinador?

    Ricardo Chéu: Da ideia. Não podemos andar em função do adversário. Existem pontos que não podemos dizer que o que conta é única e exclusivamente a nossa ideia. Temos que explorar os pontos fracos do adversário. Há alturas em que achamos que é pertinente que os nossos movimentos, que os nossos referenciais de pressão, que a forma como estamos a condicionar sejam feitos de forma diferente, mas essa é a parte do plano estratégico que temos para o jogo. E não tem a ver com a nossa dinâmica, nem com aquilo que pretendemos em termos de equipa.

    Ricardo Chéu
    Fonte: CF Estrela da Amadora

    Bola na Rede: Mencionou também a ideia de pressionar de fora para dentro. Como a baliza está no corredor central e é aí que se pode fazer golo, normalmente, procura-se orientar a pressão para fora?

    Ricardo Chéu: O problema é que, muitas vezes, só pensamos no momento. Temos que pensar sempre também no momento a seguir do jogo. O jogo não é uma verdade absoluta, em que nós queremos direcionar o adversário para um lado e vão acontecer determinadas coisas. A nós interessa-nos atacar o corredor central, que é onde está a baliza, e não os corredores laterais. Eles não jogam onde querem, nós vamos direcioná-los para onde queremos que eles joguem. Queremos direcioná-los para ali, porque achamos que temos vantagem em fazê-lo. Se estamos a convidar o adversário a jogar para dentro, é porque o momento da recuperação vai acontecer no corredor central, que é o nosso principal alvo. Já estou a pensar no momento em que vou ganhar a bola e no que vou fazer. Dá para ler a profundidade? Lemos, de uma forma objetiva, para atacar a baliza. Não dá? Vamos gerir a bola.

    Bola na Rede: Por exemplo, no primeiro jogo que fez ao comando do Estrela recorreu a dois homens móveis na frente. Entretanto, noutros jogos, já optou por utilizar um ponta de lança de referência. Que estímulos é que o fazem, de um jogo para o outro, alterar essa situação?

    Ricardo Chéu: Temos que situar as coisas no tempo. No primeiro jogo que fiz no Estrela da Amadora, tive apenas três treinos. O que quis nesse jogo foi dar um pouco de continuidade aos jogadores. O conhecimento que nós temos é muito, mas no processo de treino começamos a testar as nossas ideias. A equipa que jogou os dois primeiros jogos não tem nada a ver com esta equipa em termos de dinâmica.

    Bola na Rede: Onde é que evoluiu? 

    Ricardo Chéu: Evoluiu a partir do momento em que temos tempo para treinar. Com um microciclo normal, conseguimos testar e treinar aquilo que queremos. Quando isso não acontece, temos que ser muito cirúrgicos, olhar para o processo de recuperação e treinar em baixas intensidades. A equipa mudou muito em termos de intensidade. Somos muito mais intensos e temos muito mais posse de bola. Acredito que o Estrela da Amadora, desde a minha chegada até agora, será das equipas que tem sempre mais posse de bola que o adversário. Fomos sempre uma equipa dominadora que conseguiu controlar o processo com bola e sem bola. Não é só ter bola que nos permite ter esse controlo. Muitas vezes, sem bola, também conseguimos estar a controlar o jogo. 

    Bola na Rede: Mas em que pontos concretos é que a equipa melhorou?

    Ricardo Chéu: Em termos de golos marcados. Acabamos sempre por fazer muitos golos, através de um futebol ofensivo. Sentimo-nos confortáveis em ter bola, temos boas dinâmicas e estamos a valorizar ativos. Perceber que, jogo após jogo, os jogadores do Estrela são destaque é bastante importante para mim enquanto treinador. Ver uma equipa equilibrada, uma equipa que tem sempre os controlos do jogo, uma equipa que tem alternativas na sua dinâmica, que tem um plano A e um plano B, deixa-me extremamente feliz. Os jogadores passam o que fazemos no treino para o jogo, o que é sinal de que estão focados no processo.

     

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    Francisco Grácio Martins
    Francisco Grácio Martinshttp://www.bolanarede.pt
    Em criança, recreava-se com a bola nos pés. Hoje, escreve sobre quem realmente faz magia com ela. Detém um incessante gosto por ouvir os protagonistas e uma grande curiosidade pelas histórias que contam. É licenciado em Jornalismo e Comunicação pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e frequenta o Mestrado em Jornalismo da Escola Superior de Comunicação Social.