«O Estrela da Amadora estará de volta à Primeira Liga nos próximos anos» – Entrevista BnR com Ricardo Chéu

    Professor Neca entrevista À BnR

    Os salpicos da chuva miúda transtornam quem circula pelas ruas. Perante o risco de intempérie, o Estádio José Gomes abre portas para oferecer abrigo à conversa com Ricardo Chéu. O tricolor das bancadas destoa do cinzento do céu e ao relvado aparam-se-lhe as pontas para que fique na medida certa. Com 40 anos, o treinador do CF Estrela da Amadora consegue ser dos elementos mais velhos da estrutura de um clube revitalizado, que vai ao passado buscar inspiração para o presente. Fluente em futebolês e fã incondicional de dinâmicas, abre o jogo para explicar as ideias que tem para o clube da Segunda Liga sobre o qual lança perspetivas ambiciosas.

    – Pensar o jogo –

    «O jogador está sempre à espera que aconteça algum tipo de incoerência para ter a razão do lado dele»

     

    Bola na Rede: Veio valorizado do estrangeiro enquanto treinador?

    Ricardo Chéu: Estive três anos fora do país. Se me perguntassem se estaria à espera de ter o mercado aberto de uma forma mais clara, estava. Tive uma experiência fantástica em Itália, uma experiência na Eslováquia – que é pouco visível em Portugal, mas que tem qualidade ‑, depois, estive numa equipa de Liga Europa. Às vezes, precisamos de passar por essas experiências para nos tornarmos mais ricos, vermos as coisas de uma forma diferente e darmos valor a coisas que, enquanto estamos no mercado português, não damos. Sinto-me valorizado, em termos pessoais. Fora daquilo que é o aspeto individual, não tenho tanta certeza que me tenha aberto portas. Tive uma possibilidade forte de treinar uma equipa de Primeira Liga. Não se concretizou e, entretanto, tive apenas algumas de Segunda Liga. De qualquer maneira, continuo focado naquilo que é o meu caminho. Ainda sou um treinador jovem, independentemente de já ter muitos jogos como treinador profissional, quer em Portugal, quer fora de Portugal, acredito muito que posso dar um passo ainda maior e chegar a outros patamares no futebol português.

    Bola na Rede: Em 2020/21, não esteve no ativo. Essa paragem deu-lhe tempo para estudar o jogo? 

    Ricardo Chéu: Estive de fora por opção muito própria. Primeiro, por questões pessoais. Depois, porque achei que os projetos que me apareceram não foram aliciantes para aquilo que queria em termos de continuidade para a minha carreira. Vinha de um projeto de Liga Europa, o FC Spartak Trnava, e sentia que estava preparado para um projeto mais sustentado. Deu para fazer uma reflexão sobre estes anos em que estive sempre no ativo, nunca parei. Consegui pensar sobre a forma como vejo e entendo o jogo. Também serviu para ver outras ideias. Como disse um colega meu, um treinador é um ladrão de ideias.

    Ricardo Chéu
    Fonte: CF Estrela da Amadora

    Bola na Rede: Nesse período de reflexão, onde é que foi roubar mais ideias?

    Ricardo Chéu: Sou fã de treinadores que ganham mais vezes. Existem alguns treinadores com quem me identifico muito. Começando pelos portugueses, temos o caso do Luís Castro, que é alguém que admiro muito pelo discurso e pela forma como subiu na carreira, o Paulo Fonseca, que tem um ADN muito vincado no que pretende para as suas equipas, e o Carlos Carvalhal, que consegue transpor para o campo aquilo que são as vertentes universitárias. Em termos de treinadores estrangeiros, o Bielsa, que é alguém que admiro ao nível do treino, pois faz um treino fragmentado. Gosto de seguir treinadores italianos devido à experiência que tive em Itália. Passei a ser um amante do futebol italiano pelo detalhe, pela forma como os treinadores trabalham as equipas em termos defensivos.

    Bola na Rede: Para um treinador ter sucesso, o que é mais importante? Bases académicas, experiência como jogador, ser apenas treinador…

    Ricardo Chéu: É tudo importante. Não existem bons nem maus treinadores por serem antigos jogadores, por serem professores, por serem outro tipo de profissões. Acredito muito que a competência e a forma como vivenciamos as experiências nos torna melhores treinadores. Não sou daqueles que pensa que apenas ex-jogadores podem ser treinadores. Cada vez mais percebemos que o treino tem um papel fundamental, mas cada vez mais somos uns gestores do que são as expectativas dos jogadores. Os jogadores são todos diferentes. Não acredito que devam ser todos tratados por igual. Temos que perceber que uma abordagem funciona para um jogador, mas para outro não. O mais difícil para um treinador é manter a coerência ao longo de uma época desportiva. O jogador está sempre à espera que aconteça algum tipo de incoerência da parte do treinador para ter a razão do lado dele. Esse é o aspeto mais difícil para se manter um plantel animado, unido e a defender a ideia do treinador.

    Bola na Rede: Capacidade agregadora?

    Ricardo Chéu: Exatamente. Antigamente, dizia-se que o treino tinha uma percentagem muito importante naquilo que queremos ver no jogo. Isso é verdade, mas cada vez mais temos que perceber que quem interpreta as nossas ideias são os jogadores e se eles não estiverem connosco será muito difícil passarmos a matriz que queremos para a nossa equipa. 


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    Francisco Grácio Martins
    Francisco Grácio Martinshttp://www.bolanarede.pt
    Em criança, recreava-se com a bola nos pés. Hoje, escreve sobre quem realmente faz magia com ela. Detém um incessante gosto por ouvir os protagonistas e uma grande curiosidade pelas histórias que contam. É licenciado em Jornalismo e Comunicação pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e frequenta o Mestrado em Jornalismo da Escola Superior de Comunicação Social.