«Se me perguntares se gostava de integrar a equipa técnica de um Guardiola, Klopp, Zidane… Quem é que não gostava?»- Entrevista BnR com Silvino Louro

    «O Mourinho não dava “comida” à Marca. E no Real Madrid, todo o treinador que não der “comida” à Marca… está feito!»

     

    Bola na Rede: Ao longo da tua carreira como treinador trabalhaste com alguns dos melhores guarda-redes do mundo. Se calhar, alguns dos melhores guarda-redes da história do futebol. Já falaste dos jogadores de campo que te impressionaram, mas ainda não disseste qual foi o melhor guarda-redes que treinaste…

    Silvino: Normalmente, as pessoas quando falam de guarda-redes dizem sempre se ele é bom dentro ou fora dos postes… Mas, hoje em dia, como já te disse, é preciso algo mais. É preciso jogar com os pés. Mas posso descrever-te os melhores…

    Bola na Rede: Força!

    Silvino: O Vítor Baía, por exemplo, que foi o primeiro, era muito bom a sair aos cruzamentos e era um guarda-redes muito elegante. E dentro dos postes também era bom. Era rápido a sair e bom a fazer “manchas”. Depois encontrei o Petr Cech. Em termos de treino, era espetacular. Adorava treinar. Queria sempre aprender e é um rapaz muito inteligente. Queria saber os detalhes todos.

    Bola na Rede: Numa entrevista, dada em 2009, o Petr Cech disse: “Com o Silvino aprendi coisas que não julgava serem possíveis fazer na baliza”. O que ele quis dizer com isso?

    Silvino: Ele estava a habituado a outro tipo de treinos no Rennes e em Inglaterra. Aliás, antes de chegarmos a Inglaterra, o treino específico dos guarda-redes ainda era só com pontapés à baliza. E nós mudámos isso tudo…

    Bola na Rede: E foi uma mudança com grande impacto…

    Silvino: Quando o Petr Cech chegou ao Chelsea, o [Carlo] Cudicini tinha sido eleito o melhor guarda-redes da Premier League, na época anterior, ao serviço do Chelsea. Mas o Petr Cech fazia coisas incríveis.

    Bola na Rede: E outros?

    Silvino: O Júlio César. As primeiras palavras que lhe disse quando cheguei ao Inter foram: “Ouve lá, tu és conhecido no Brasil, mas na Europa só és conhecido aqui, no Inter… Olha, vou fazer de ti um guarda-redes do caraças, só tens de me ajudar e trabalhar, depois, daqui a uns tempos, falamos”. E sabes o que aconteceu? Quando  ganhámos a Champions [na época 2009/2010], ele fez uma réplica do troféu de melhor guarda-redes dessa edição da Liga dos Campeões que recebeu e ofereceu-mo.

    Bola na Rede: Ainda falta o Iker Casillas?

    Silvino: O Casillas é um guarda-redes respeitado e credenciado, mas era um guarda-redes que não gostava muito de sair aos cruzamentos.

    Bola na Rede: Porquê?

    Silvino: Para não se colocar em risco. Como não era muito alto, só gostava de sair pela certa. E depois levava golos, quer dizer, uma vez, contra o Osasuna, penso eu, sofreu um golo quase na linha de golo.

    Bola na Rede: A passagem do Silvino pelo Real Madrid ficou marcada por o Iker Casillas – que tinha um grande “peso” no clube – perder a titularidade. Ele partiu a mão, parou, mas depois, quando regressou, é o Diego López que continua a ser o escolhido pela equipa técnica. Essa opção deu muito que falar em Espanha. Foi polémica…

    Silvino: Não houve polémica nenhuma. O Casillas partiu a mão e fomos contratar o Diego López ao Sevilha. Foi uma contratação de urgência, naquela altura, com alguém que ainda podia assinar pelo Real Madrid porque jogava no mercado interno. Mas não houve polémica nenhuma. Sabes o que aconteceu? É a imprensa espanhola: a Marca. Esta é que é a realidade. Não houve confusão nenhuma dentro do balneário. A imprensa espanhola é que fez disto um caso…

    Bola na Rede: Mas diz-se que o Silvino e o Casillas nem se falam…

    Silvino: É mentira. Isso veio há pouco tempo aí num jornal. Mas sempre falei com o rapaz. E ainda há pouco tempo o José [Mourinho] e o Casillas encontraram-se num evento da FIFA e estiveram a conversar, a tirar fotos… tudo numa boa.

    Bola na Rede: A relação entre a imprensa espanhola e o José Mourinho sempre foi muito difícil. Mesmo ganhando. Percebeste porquê?

    Silvino: Sabes o que se passa aqui? É assim: o Mourinho não dava “comida” à Marca. E no Real Madrid, todo o treinador que não der “comida” à Marca… está feito! Se fosse o Mourinho a estar agora no lugar do Zidane já lhe tinham feito o “funeral”.

    Bola na Rede: Às vezes, não sentes algum preconceito em relação aos portugueses? O próprio Cristiano Ronaldo não era lá muito bem tratado…

    Silvino: Sinceramente… Olha, ninguém fala mal do Futre. Agora, do Cristiano Ronaldo. Pergunto eu: Um jogador que chega aqui e ganha as competições que ganha e marca os golos que marca? Merecia um bocadinho de mais respeito, não é? Eles não falam dele. Se um jogador espanhol fizesse em Portugal o que o Figo ou o Cristiano Ronaldo fizeram aqui, era olhado com respeito. Aqui, o Cristiano Ronaldo não é. Deveria ser, mas, pronto, isso são coisas que uma pessoa não percebe como é possível. Ainda há pouco tempo fizeram aí o que seria os 20 ou 25 melhores jogadores da história da Liga espanhola e o Cristiano Ronaldo nem está lá. Eu sei lá se é por ser português ou não… não percebo.

    Bola na Rede: Uns caem no “goto” e outros não…

    Silvino: Já viste o que está a acontecer agora com o João Félix? Vê lá se não é bem tratado. É um menino e não fala muito. Agora, o Cristiano Ronaldo… Mas sabes qual é a verdadeira diferença? É que o Cristiano Ronaldo era do Real Madrid e o Futre e o João [Félix] são do Atlético de Madrid. Essa é que é a grande diferença.

    Bola na Rede: Bom, já estamos a ficar sem tempo e temos de fechar a conversa na zona da baliza… Eu sei que não gostas muito de destacar as pessoas, por respeito a todos com quem te cruzaste, mas tenho de insistir que me digas qual foi o melhor guarda-redes com quem te cruzaste? De forma direta.

    Silvino: Ok… Foi o Petr Cech. Cruzei-me com grandes guarda-redes, não estou a dizer que os outros eram maus, bem pelo contrário, eram também grandes guarda-redes e deu-me muito prazer trabalhar com todos. Mas aquele que me “encheu as medidas” foi o Petr Cech.

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    João Amaral Santos
    João Amaral Santoshttp://www.bolanarede.pt
    O João já nasceu apaixonado por desporto. Depois, veio a escrita – onde encontra o seu lugar feliz. Embora apaixonado por futebol, a natureza tosca dos seus pés cedo o convenceu a jogar ao teclado. Ex-jogador de andebol, é jornalista desde 2002 (de jornal e rádio) e adora (tentar) contar uma boa história envolvendo os verdadeiros protagonistas. Adora viajar, literatura e cinema. E anseia pelo regresso da Académica à 1.ª divisão..                                                                                                                                                 O João não escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.