Marrocos 0-0 Espanha (3-0 após g.p): Elasticidade de Bono e cavadinha de Hakimi levam Marrocos aos quartos de final

    A CRÓNICA: SURPRESA MARROCOS ELIMINA A CAIXINHA DE SURPRESAS ESPANHOLA APÓS PENÁLTIS

    O Education City Stadium acolheu o duelo entre a seleção de Marrocos, destaque na fase de grupos e vencedora do Grupo F, e a seleção espanhola que ficou em segundo lugar no Grupo E.

    Esperava-se um jogo em que Espanha assumisse a iniciativa e guardasse a bola, com Marrocos a defender em meio-campo, com as linhas juntas, um bloco sólido, procurando apresentar consistência no momento defensivo e sair em transição através dos médios-ala, e o jogo não desiludiu e manteve durante os 120 minutos esta toada.

    A Espanha teve sempre mais bola, mas nunca se mostrou capaz de desmontara a teia defensiva marroquina que nunca vacilou, tremeu ou sequer se mostrou verdadeiramente ameaçada pela circulação de bola da La Roja.

    A primeira oportunidade de jogo surgiu apenas aos 26 minutos quando Asensio quebrou a monotonia e substitui o movimento em apoio pela rutura nas costas da linha defensiva, rematando à malha lateral. Se este lance poderia ter um efeito positivo na seleção espanhola que vinha a fazer uma boa partida – controlando com bola e pressionando alto, roubando frequentemente o esférico – o inverso aconteceu. Marrocos cresceu e apareceu o nome do primeiro tempo: Sofiane Boufal. O irreverente extremo cresceu e na magia dos dribles, foi carregando o sonho dos milhares de adeptos marroquinos no estádio que vibravam com cada brincadeira de Boufal com a bola e que, nesses instantes, transformavam em sonoros gritos de êxtase os segundos em que a redondinha se colava aos pés do desequilibrador marroquino. Reza a lenda que Llorente hoje passa a noite desperto ainda com pesadelos.

    O jogo partiu-se e ambas as equipas foram procurando o erro adversário, especialmente dos guarda-redes. Bono e Unai Simón – é curioso como uma seleção com tanta qualidade com bola nos pés continua a ter como referência na baliza um jogador desconfortável neste quesito – por várias vezes assumiram o risco, iniciando jogadas de perigo para a respetiva seleção, ou pisando a marca da displicência e ficando a milésimos de segundo de perder a bola mesmo à frente da baliza.

    Neste contexto foram brilhando Boufal e Ziyech que encontraram espaço para acelerarem e para procurarem a ousadia, encostando a seleção espanhola às cordas e começando a levantar os fantasmas na equipa treinada por Luis Enrique.

    A segunda parte manteve a toada de toda a primeira: Espanha com bola a controlar o jogo, mas, igualada coletivamente, sem capacidade para partir para cima e abrir buracos no muro marroquino. Neste contexto, apenas a entrada de Nico Williams – um jogador com capacidade de partir para cima e de deixar os adversários para trás com uma mudança de velocidade – quebrou alguma da monotonia do jogo espanhol. Fica também a faltar um esclarecimento de Luis Enrique sobre a saída de Gavi que, partindo da esquerda, estava a ser capaz de mexer com o jogo, acelerando com bola no pé e conquistando faltas.

    Os últimos minutos do tempo regulamentar evidenciaram o cansaço físico marroquino e trouxeram um jogo mais partido. Cheddira começou a onda de oportunidades desperdiçadas, Abde esteve perto de roubar a bola a Unai Simón e, no último suspiro, o livre de Dani Olmo obrigou Bono a aplicar-se.

    Com tamanho cansaço, o prolongamento adivinhava-se complicado para Marrocos, mas os Leões dos Atlas arranjaram força na vontade de um povo, nos cânticos dos adeptos – o Mundial tem sido vivido nas bancadas de uma forma especial pelos adeptos dos países árabes – e na serenidade de Walid Regragui que, do banco, via a estratégia voltar a resultar na perfeição.

    Cheddira voltou a falhar uma e outra vez. Não soube lidar com o nervosismo e, quando tinha tudo para rematar, demorou tanto tempo a pensar que perdeu a oportunidade. Falhou aos 104 – Unai Simón, apesar das limitações com bola no pé, tem grandes valências a defender com os pés – e aos 115. Brilhavam nesta altura Amrabat e Ounahi, um dos jogadores marroquinos que mais se tem destacado e que, por alguma razão, teima a fugir dos holofotes. No lance a terminar a primeira parte do prolongamento, baila, deixa adversários no chão com o passe de rutura no timing e força exatos e ainda recupera metros no terreno para recuperar a bola.

    Sarabia, que havia acabado de entrar, ainda acertou no poste no último lance do jogo que só viria a ser desempatado na marca dos 11 metros. E o desempate começou exatamente com a fotocópia do último lance do jogo: Sarabia – entrado para bater a grande penalidade – a acertar no poste. Ainda há de ser oficializada no Manual de Regras da FIFA que quem entra para bater o penálti falha. Benoun sofreu do mesmo mal. A diferença esteve na elasticidade e capacidade de se agigantar de Bono e nas tentativas pífias de Soler e Busquets. O melhor momento da noite estava reservado para o fim, quando Hakimi deixou todas as regras do bom senso de lado e com uma cavadinha sentenciou o resultado. O jogo será sempre mais bonito quando a irreverência não for posta de lado.

    A Espanha acaba por confirmar muitos dos receios que trazia à partida. Mas, e ao contrário do que será amplamente propagandeado, a Espanha não foi eliminada porque fez 1019 passes. Foi eliminada porque não soube traduzir a posse em oportunidades, porque não teve capacidade de desequilibrar no último terço e, especialmente, porque o plano de Regragui foi cumprido na perfeição. Marrocos continua a surpreender – só tem um golo sofrido desde que o treinador assumiu o comando técnico em setembro – e já igualou o melhor resultado de sempre de uma seleção africana no Mundial. Continua a sonhar enquanto aguarda pelo desfecho do encontro que opõe Portugal e Suíça.

    A FIGURA

    Sofyan Amrabat – Não há muitas palavras para descrever o Mundial de Amrabat. Se a seleção africana é conhecida por Leões do Atlas, Amrabat assume o papel de outro animal: o polvo. Está em todo o lado, recupera bolas em todo o campo e sai a jogar sempre com critério. Não sendo exuberante no passe, são poucas as situações em que não toma a melhor decisão. Joga, faz a equipa jogar e impede o adversário de o fazer. É ainda o garante da defesa do espaço entrelinhas, com um importante papel tático entre a linha defensiva e a linha média. Fica a expectativa para ver se no pós-Mundial dará o salto.

     

    O FORA DE JOGO

    Ferran Torres – O corredor direito espanhol esteve completamente desligado do jogo. Llorente nunca foi capaz de dar sequência aos lances e não acrescenta muito jogando como lateral baixo em campo e o companheiro de corredor fez uma partida ao mesmo nível, senão mais abaixo. Pouco arriscou, perdeu muitas bolas, não tomou as melhores decisões ao nível do passe e, defensivamente, deixou muitas vezes Mazraoui jogar após perseguições loucas à bola. É certo que parece beneficiar quando tem maior liberdade para ocupar terrenos mais centrais, mas tudo o que fez, fez mal. Foi substituído por Nico Williams que, no primeiro lance acrescentou mais ao jogo que Ferran em 63 minutos.

     

    ANÁLISE TÁTICA – MARROCOS

    Sem surpresas, Marrocos apresentou-se em 4-1-4-1, com Amrabat entre a linha defensiva e a linha média. Com um bloco compacto e reduzindo o espaço entrelinhas, Marrocos esteve sempre confortável sem bola. Sem oferecer a iniciativa à seleção espanhola, o cenário de Marrocos em organização defensiva foi – como tem sido ao longo do Mundial – pilar para uma boa exibição. Um destaque do posicionamento marroquino em campo no momento defensivo estava no ponta de lança. En-Nesyri procurava cortar a linha de passe para Busquets, obrigando ao médio interior do lado da bola a saltar para pressionar o central.

    Com bola Marrocos criou perigo quando foi capaz de acionar os extremos – principalmente Boufal – no 1X1. Geralmente saindo curto (algo instável neste momento), como Bono participativo para atrair a pressão espanhola e, através de uma bola mais longa, encontrar En-Nesyri como referência ou Boufal com espaço para procurar empreender uma iniciativa individual.

    No momento da contra-transição Marrocos também teve sucesso, impedindo as saídas da Espanha em transição ofensiva e, recuperando rapidamente a bola, conseguindo lançar uma segunda vaga ofensiva.

    11 INICIAL E PONTUAÇÕES

    Bono (8)

    Mazraoui (7)

    Saiss (7)

    Aguerd (6)

    Hakimi (7)

    Amrabat (8)

    Amallah (6)

    Ounahi (7)

    Boufal (8)

    En-Nesyri (7)

    Ziyech (7)

    SUBS UTILIZADOS

    Abde Ezzalzouli (6)

    Cheddira (5)

    Sabiri (6)

    Attiyat Allah (6)

    El Yamiq (6)

    Benoun (-)

     

    ANÁLISE TÁTICA – ESPANHA

    O jogo de posição implementado por Luis Enrique é uma das principais atrações coletivas no futebol de seleções. Organizada em 4-3-3 a Espanha manteve-se fiel a si mesma, tanto nas qualidades como nas limitações. Partindo de uma ocupação racional dos espaços, à esquerda Alba projetava-se no corredor com Olmo por dentro e à direita Llorente mais recuado no terreno entregava a faixa a Ferran Torres.

    Ainda assim, Marrocos criou muitos problemas à criação espanhola. Com a influência de Busquets a ser reduzida e com as linhas próximos, os interiores – Pedri e Gavi – foram menos acionados por dentro e obrigados a lateralizar a posição, atuando praticamente na linha dos centrais (principalmente Pedri). No último terço e embora com capacidade de lá chegar, continua a ser evidente a menor capacidade de desequilíbrio individual de certos jogadores espanhol. Além da pouca ousadia para os atacantes espanhóis partirem para cima através do drible – são poucos os jogadores convocados com esta característica –, foi também notória a ausência de movimentos de ataque ao espaço capazes de quebrar a monotonia e de acrescentar imprevisibilidade ao jogo espanhol.

    Neste contexto a Espanha ficou refém de um eventual erro individual marroquino para criar perigo, uma vez que coletivamente não foi capaz de superar a teia da seleção africana. Continuam a persistir os fantasmas na criação e concretização de oportunidades.

    11 INICIAL E PONTUAÇÕES

    Unai Simón (5)

    Jordi Alba (6)

    Laporte (7)

    Rodri (7)

    Marcos Llorente (4)

    Busquets (5)

    Pedri (6)

    Gavi (7)

    Dani Olmo (7)

    Asensio (6)

    Ferran Torres (4)

    SUBS UTILIZADOS

    Morata (6)

    Soler (6)

    Nico Williams (7)

    Ansu Fati (6)

    Alejandro Balde (6)

    Sarabia (-)

     

    Rescaldo da autoria de Diogo Ribeiro

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